José Paulo
No Fédon, a ESTRUTURA de dominação da gramática são duas. A
dialética e a mitologia. (Kierkegaard: 47, 49). A mitologia é a realidade
virtual ao lado da dialética, da ética, do trágico e do cômico; ela é a
realidade virtual da ironia.
O Fédon começa com a mitologia do Minotauro. (Platão. 1972:
63; 1950: 765-764). Na mitologia política, Teseu é o herói que vai ao labirinto
matar o Minotauro. Que entrava no Labirinto não encontrava o caminho de volta.
Teseu faz com que a princesa de Creta Ariadne se apaixone por ele. ela lhe dá
um novelo de lã vermelho para que Teseu possa voltar. Ele amarra o novelo em
uma pedra na posta do Labirinto, mata o Minotauro e retorna. O Dinossauro é um
monstro mitológico que devorava jovens atenienses, uma dívida de promessas para
Creta após esta derrotar Atenas.
O labirinto é a alegoria de todo e qualquer campo político.
Há uma realidade heteróclita virtual [produção de monstros] no campo político,
em sua superfície profunda. A realidade heteróclita é o contrário da realidade
da ética do renascimento grego; esta é o viver bem e para o bem, enfim, uma
realidade do agradável.
A realidade heteróclita faz pendant com o grotesco do
brutalismo:
“Algumas coisas são agradáveis por natureza, e dessas umas
são irrestritamente agradáveis, enquanto outras o são em relação a determinadas
classes de animais ou de pessoas; por outro lado, outras não são naturalmente
agradáveis, mas algumas dessas se tornam agradáveis por causa de aberrações,
outras por causa de hábitos e outras ainda por causa de taras. (Aristóteles:
137).
A vida heteróclita pode ser agradável para que vive na
superfície profunda do campo político por causa da relação do heteróclito com o
grotesco do brutalismo:
“Sendo assim, é possível descobrir em relação a cada uma das
espécies da segunda classificação disposições de caráter semelhantes às
identificadas a respeito do primeiro caso; refiro-me às disposições bestiais,
como no caso da mulher que, segundo relato, abria o ventre das mulheres
grávidas e devorava os fetos; ou das coisas com que3, de acordo com certos
relatos, algumas tribos selvagens do litoral do mar Negro tinham por hábito
deleitar-se – com alimentos crus ou carne humana, ou com a troca de crianças entre
as tribos para serem seviciadas em suas festas – ou como na narrativa sobre
Fálaris”. (Aristóteles: 137).
Aristóteles trata de mitologia como realidade realmente
existente. A estrutura de dominação da gramática aristotélica põe e repõe a
fronteira entre civilização e barbárie [realidade heteróclita]. Civilização
versus barbárie é uma distinção introduzida no campo político/estético grego em
analogia época do renascimento versus época mitológica do realismo brutalista?
2
A gramática só existe como estrutura de dominação se ela
funcionar em uma tela gramatical de fenômenos político/estéticos. Assim,
dialética, mitologia, ética são gramáticas de3 estrutura de dominação
funcionando no campo político/estético Ocidental e Oriental. A dialética existe
como gramática de estrutura de dominação na tela gramatical do campo
político/estético da China, por exemplo.
A tela gramatical cria e recria indivíduo, multidão, personagem,
ator, poeta e agente. Em analogia com Kierkegaard:
“Podemos dizer que ou é a palavra que cria o indivíduo, ou é
o silencio que o nutre e produz”. (Kierkegaard: 38).
Como estrutura de dominação, a mitologia faz do poeta um
agente público na tela gramatical de fenômenos político/estéticos:
“Depois de haver prestado a minha homenagem ao Deus, julguei
que um poeta para ser verdadeiramente um poeta deve empregar mitos e não
raciocínios”. (Platão. 1972:67; 1950:770).
Mulher de Sócrates, Xantipa aparece como efeito da cultura
política do homem ateniense:
“Entramos, pois, e encontramos junto a Sócrates, que acabava
de ser desagrilhoado, Xantipa, [tua a conheces!], que segurava o filho mais
novo, sentada ao lado do marido. Assim que ela nos viu, choveram maldições e
palavrórios como só as mulheres sabem proferir: ‘Vê Sócrates, essa é a última
vez que conversam contigo os teus amigos, e tu com eles!’. Sócrates lançou um
olhar na direção de Críton: ‘Críton, disse, faze com que a conduzam para
casa!’. E, enquanto era levada pela gente de Críton, ela se debatia e gritava”.
(Platão. 1972:66; 1950: 768).
Lacan diz:
“Isso nos mostra a que ponto a linguagem traça em sua própria
gramática os chamados efeitos de sujeito”. (Lacan. S. 19: 150).
A fêmea é um efeito do sujeito homem na gramática de Platão
como estrutura de dominação na tela platônica gramatical do campo
político/estético ateniense; Xantipa não é da tela gramatical ética de
fenômenos agradáveis do renascimento grego.
A morte de Sócrates habita a tela gramatical mitológica:
“- Eu, também [diz Sócrates] o que digo é por ouvir
dizer, e seguramente nada impede que se transmita o que dessa forma me foi dado
aprender. E, com efeito, talvez convenha particularmente aos que devem
transladar para o além a tarefa de empreender uma investigação sobre essa
viagem e de narrar, num mito, o que julgamos ser tal lugar. E por que não? Que
poderíamos fazer senão isso durante o tempo que nos separa do pôr do sol?”.
(Platão. 1972: 68; 1950:771).
O sujeito posto na
gramática da mitologia é:
“do sujeito que um discurso sujeita como tal à produção,
desse sujeito que há matemáticos que qualificam de criativo. Resta deixar claro
que é realmente de sujeito que se trata, o que é corroborado pelo fato de que,
na minha lógica, o sujeito se exaure ao se produzir como efeito de significante
[...]!” )(Lacan. S. 19: 166).
O significante é aquele sujeito Sócrates da gramática de
Platão, isto é, na tela gramatical platônica do campo político/estico
ateniense. A morte de Sócrates exaure o sujeito como herói intelectual na tela
gramatical mitológica da epopeia.
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Alain Badiou fala do sujeito:
“A desintegração é essa figura de enraizamento do sujeito
onde a perda ne fait pas seulement, du manque, cause, mais consistance d’un
excès”. (Badiou: 158).
Sócrates é o sujeito de desejo diante da finitude na tela
gramatical mitológica, Sócrates fala:
“Pois bem, vamos a isso! E, procuremos sobretudo apresentar
diante de vós uma defesa mais convincente do que a que fiz perante os juízes! Sim, confesso-o, Simias e Cebes: eu
cometeria um grande erro não me irritando contra a morte, se não possuísse a
convicção de que depois dela vou encontrar-me, primeiro, ao lado de outros
Deuses,, sábios, e bons; e, segundo, junto a homens que já morreram e que valem
mais do que os daqui. Mas, com efeito, ficai sabendo que, se não me esforço por
justificar a esperança de dirigir-me para junto de homens que são bons, em
troca hei de envidar todo o esforço possível para defender a esperança de ir
encontrar, depois da morte, um lugar perto de Deus, que são amos em tudo
excelentes, e, se há coisa a que eu me dedique com todas as minhas energias,
será essa!”. (Platão. 1972:70; 1950:773).
O efeito do desejo sobre o sujeito, em finitude, é um fenômeno extraordinário de energia:
“A energea é a ideia-afecção no campo político do indivíduo e
no campo político da ´polis? Heidegger fala do ser sem força e do ser-força,
ser força é o Eros barroco como energea? Ele tem relação com as pulsões do real
do campo político do indivíduo? Com os desejos como motor das afecções do campo
político da polis? O desejo não é o real apenas o real, pois, ele é pulsão com
gramática, fato com teoria”:
“’Todo fato é já teoria, como diz Goethe. (Hegel: 23)’”.
(Bandeira da Silveira. 2024: cap. 22).
“- Deixa-o falar! – prossegui Sócrates. – a vós, todavia, que
sois meus juízes, devo agora prestar-vos contas, expor as razões pelas quais
considero que o homem que realmente consagrou sua vida à filosofia é senhor de
legítima convicção no momento da morte, possui esperança de ir enco90ntrar para
si, no além, excelentes bens quando estiver morto! Mas como pode ser assim?
Isso será Simias e Cebes, o que me esforçarei por vos explicar. Receio, porém,
que, quando uma pessoa dedica à filosofia no sentido correto do termo, os
demais ignoram que sua única ocupação consiste em preparar-se para morrer4, e
em estar morto! Se isso é verdadeiro, bem estranho seria que, assim pensando,
durante toda sua vida, que não tendo presente ao espírito senão aquela
preocupação, quando a morte vem, venha a irritar-se com a presença daquilo que
até então tivera presente no pensamento e de que fizera sua ocupação!”.
(Platão. 1972: 71; 1950:774).
A ser agente de criação da tela gramatical filosófica
ateniense faz de Sócrates um herói intelectual e, mais, ainda, um imortal na
gramática da cultura política da antiguidade.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Brasíli8a: EDUNB, 1992
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Além da época posmode4rna.
EUA: amazon, 2024
BADIOU, Alain. Théorie du sujet. Paris: Seuil, 1982
KIERKEGAARD, S. A. O
conceito de ironia constantemente referido a Sócrates. Petrópolis: Vozes, 1991
LACAN, Jacques. O Seminário...ou pior. Livro 19. RJ: Zahar,
2012
PLATÃO. Os Pensadores. Diálogos. Fédon. Abril Cultural, 1972
PLATON. Oeuvres
Complètes. Paris: Gallimard, 1950
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