quinta-feira, 14 de março de 2024

CULTURA POLÍTICA ECONOMICA DO CAPITAL

 

José Paulo 

 

 

Por ONDE começar?

No “A República”, há a comunidade de mulheres e crianças”, o comunismo como realidade virtual. Aristóteles parte dessa realidade para construir a realidade virtual da cultura política econômica.

Para existir, a cultura política econômica necessita de uma gramática. Assim, na cultura política econômica do Oikos,  há o <isto é meu> e o <isto não é meu>. (Aristoteles: 714-715):

“Porém, na realidade, os cidadãos, ao ter comunidade de mulheres e crianças, não os chamaria <seus>, neste sentido, senão que entenderão o <seus> coletivamente e não particularmente, e de modo semelhante chamarão <suas> as propriedades, entendendo com isto as propriedades de todos eles, não de cada um individualmente”. (Aristoteles: 715).

A gramática da cultura política econômica se inicia com o indivíduo e a propriedade particular da família senhorial escravista. Há essa cultura política econômica natural produtiva e mais ainda. Há a economia capitalista mercantil e a economia do dinheiro que faz dinheiro: capital de dinheiro. (Aristoteles: 696).

A cultura política econômica grega da riqueza deve evitar o heteróclito, Ela é o renascimento grego: “A riqueza é um coleção de instrumentos a disposição do administrador da família e do político”. (Aristoteles: 694). Os agentes do discurso do maître [senhor e governante] solto no ar da vida de aquisição de riqueza se inclinam para o heteróclito. Assim, a ética é o limite da acumulação de riqueza. O heteróclito:

“A causa dessa atitude consiste em que seus interesses estão postos na vida , porém não em uma vida boa; e assim, posto que o apetite da vida é ilimitado, desejam também sem limite os meios de satisfaze-los. E ainda aqueles que põe sua meta em uma vida boa, buscam a vida boa enquanto vem medida por gozos corporais, de maneira que, posto que esta parece também achar-se na possessão da propriedade, todas as suas energias se concentram na consecução da riqueza, e por causa disto tem nascido a segunda espécie da arte de enriquecer. Pois, pressuposto que todo gozo corporal se encontra em um excesso, se dedicam a buscar a arte de produzir esse excesso no gozo [...]. (Aristóteles: 698).

Aristóteles estabelece a relação entre o desejo ou gozo corporal de enriquecer sem limite e o homem tirânico, o César, por analogia da cultura política econômica romana? O César é o gozo corporal de enriquecer sem limite [em uma realidade econômica política virtual] a partir da mudança da forma de governo; passagem da república constitucional para a tirania romana ou cesarismo.

Leo Strauss diz, ora:

“as cidades exaltam grandemente o tiranicídio”. (Strauss: 67-68).

A cultura política econômica senhorial natural ou da polis ´[do governante] é um fenômeno no qual o tiranicídio não é um fato da normalidade da vida. Não o é, pois, há o limite ético para o enriquecimento da família senhorial e do governante ou político, ou classe política.  

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As formas de governo são do um, de poucos ou da multidão no poder governamental. As formas de governo justas existem se o governante governa pelos interesses comuns no9 campo político/estético: monarquia, aristocracia, democracia constitucional. As formas injustas governam segundo os interesses privados do um, de poucos, da multidão: tirania ou cesarismo, oligarquia, democracia aconstitucional.

Então, o que é a tirania?

“a tirania é uma monarquia que exerce um poder despótico sobre a comunidade política; a oligarquia é o controle do governo nas mãos dos que possuem todas as propriedades; a democracia, ao contrário, existe quando o poder está nas mãos daqueles que apenas nada possuem, ou seja, são pobres”. (Aristoteles: 781).

O princípio da justiça na forma de governo foi cancelado pelo republicanismo de Maquiavel ao criar a identidade absoluta entre monarquia e tirania. Então, a felicidade não é mais um fenômeno da liberdade ´política:

Porém, se os homens se associam não só por causa da existência material, e sim com o fim de lograr uma vida feliz [já que do contrário, uma coletividade de escravos e de animais seria um Estado; e isso em realidade é impossível, porque estes seres não participam em absoluto da felicidade de uma vida baseada em uma vontade livre”. ( Aristoteles: 783-784).

A ciência política freudiana desfaz a fronteira entre homem e natureza, pois ela fala de um campo político cultural animal:

“Poque nossos parentes, os animais, não apresentam uma luta cultural desse tipo? Provavelmente, alguns deles – as abelhas, as formigas, as térmitas – batalharam durante milhares de anos antes de chegarem às instituições estatais, à distribuição de funções e às restrições ao indivíduo pelas quais hoje os admiramos”. (Freud: 146).

Há a relação entre forma de governo e cultura política econômica:

Nem se realiza em ordem ao comercio e as relações financeiras..., pois se fosse assim, os etruscos e os cartagineses e todos os povos que têm relações comerciais entre si seriam virtualmente cidadãos de um único Estado”. (Aristoteles: 784).

Há o campo político internacional virtual através da gramática da cultura política econômica do capital? A gramática da cultura política econômica do capital da modernidade cria e recria um campo política/estético planetário?      

Adam Smith tem uma visão cor de rosa do campo político da civilização do capital:

“O principal comércio de todas as sociedades civilizadas é mantido entre os habitantes da cidade e do campo. Consiste na troca da produção bruta pela produção manufaturada, troca essa que é ou imediata, ou feita por intermédio da moeda, ou de alguma espécie de papel que representa moeda. O campo fornece à cidade os meios de subsistências e as matérias-primas da manufatura. A cidade paga esse abastecimento enviando aos habitantes do campo toda uma parte da sua manufaturada”. (Smith e Ricardo: 233).

Marx teceu um campo político do capital inglês da estética brutalista:

“As leis cruéis contra as coligações dos trabalhadores foram abolidas em 1825 ante a atitude ameaçadora do proletariado. Mas, apenas em parte. Alguns belos resíduos dos velhos estatutos só desapareceram em 1959. Finalmente, a lei do Parlamento, de 29 de junho de 1871, pretendeu eliminar os últimos vestígios dessa legislação de classe como reconhecimento legal das Trades Unions. Mas uma lei do Parlamento, da mesma data [destinada a modificar a legislação criminal na parte relativa a violências, ameaças, e ofensas], restabelece, de fato, a situação anterior sob nova forma. Com essas escamoteações parlamentar os meios que podem ser utilizados pelos operários em caso de greve (...) foram subtraídos ao domínio do direito e colocados sob uma legislação penal de exceção, a ser interpretada pelos próprios fabricantes, na sua qualidade de juízes de paz”. (Marx:539).

Marx é irônico com a civilização capitalista da economia política:

“A serenidade estoica com que o economista político presencia as violações mais cínicas do ‘sagrado direito de propriedade’ e as violências mais contundentes contra as pessoas desde que necessárias para estabelecer as bases do modo de produção capitalista [...]. (Marx: 528).               

A propósito. Cria-se uma superfície profunda da meia-noite para o proletariado no campo político/estético do cesarismo/tirania da cultura política econômica do capital inglês.

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Em Marx. um problema estratégico da cultura política econômica do capital é a mais-valia econômica:

“Como nasce a mais-valia? Não brota da circulação, senão que se realiza na circulação. Os produtos se vendem por seu valor, não por mais do que eles valem; o preço não excede seu valor; E ainda vendendo pelo que valem, o vendedor obtém uma mais-valia”. (Marx. 1974: 35).

O fenômeno da mais-valia na tela gramatical do capital se traduz por relação de exploração entre as classes sociais: burguesia e classe operária. Como a mais-valia é o referente da produção da riqueza capitalista, a burguesia aparece como uma classe parasita [abjeta] do trabalho alheio. Então, há necessidade para a reprodução ampliada do capital da cultura política econômica brutalista do capital.

Na economia política de Ricardo permaneceu a dúvida se ele havia descoberto a mais-valia:

“O valor de uma mercadoria, ou seja, a quantidade de qualquer outra pela qual pode ser trocada, depende da quantidade relativa de trabalho necessário para a sua produção, e não da maior ou menor compensação que é paga por esse trabalho”. (Ricardo e Smith: 255).

Diz um especialista em Ricardo sobre a mais-valia:

“Em todo caso, Ricardo não ofereceria uma orientação clara. A julgar pelos Principles, poderia facilmente obter-se a impressão de que o trabalho é simplesmente a medida e não a fonte do valor, e que o valor não significa mais que as relações de cambio entre as mercadorias. Ricardo foi, muitas vezes, muito explícito a este respeito”. (Blaug: 68).

Na cultura política econômica do capital, o capital não é uma coisa, como pensa Ricardo, e sim relação social de produção industrial; assim, a cultura política econômica põe e repõe a luta de classes no campo político/estético capitalista.

Os economistas burgueses se esforçaram em negar a mais-valia e a luta de classes. Eles chegaram a falar em cultura política econômica capitalista visando o bem-estar:

“Se o valor é a importância que os bens possuem para o bem-estar humano, e se essa importância se baseia no fato de haver algum ganho de bem-estar que depende de se dispor deles, também é claro que a grandeza do valor deve necessariamente ser determinada pela grandeza do ganho de bem-estar que depende do respectivo bem. Um bem terá valor elevado se dele oferecer uma importante vantagem para nosso bem-estar, e terá um valor baixo se dele oferecer apenas um ganho de bem-estar insignificante”. (Bohm-Bawerk:160).

Althusser chamou a luta entre a concepção política de mundo de Marx e a concepção burguesa como luta de classe na teoria. A luta de classe é o motor da história, um processo sem o sujeito homem (Althusser:26, 31). A luta de classe se transformou hoje, em uma luta no campo do general intellect gramatical. Este existe como um fenômeno das classes médias universitárias que, ou servem como estrutura de dominação na cultura política econômica do capital, ou resistem ao domínio do capital no campo político estético. O fenômeno em pauta encontra-se na tela gramatical da cultura política econômica do mercantilismo do capital. (Bandeira da Silveira. 2022: cap. 8, parte 2).

Retomando a linha mestra. Os economistas do general intellect gramatical burguês viveram seu drama de classe média intelectual:

“e assim se compreende por que, desde Adam Smith até nossos dias, inúmeros teóricos acabaram por se desesperar totalmente de encontrar a natureza e a medida do valor dos bens em relação com o bem-estar humano e recorreram a outras explicações estranhas: ao trabalho ou ao tempo de trabalho, aos custos de produção, à ‘dificuldade da obtenção’ à resistência da Natureza contra o homem e a outras desse gênero”. (Bohm-Bawerk:161).

Os economistas burgueses da classe média universitária ocidental procuraram desintegrar a crítica da gramática do capital. Ora, o mercantilismo do capital asiático hoje hegemônico, ou seja, como paradigma do capitalismo mundial, tem como cultura política econômica de vanguarda a China. A cultura política econômica chinesa tem como um pilar a crítica da gramática do capital:

     

“No mercantilismo capitalista, o general intelecto empresarial existe no processo de produção e como práxis social. Existe como força produtiva direta e, também, como práxis social no ciberespaço. Este fenômeno tem sido alvo de interpretações como do semiocapital, capital semiótico: uma crítica da economia política do valor”.

“A partir de ‘O capital’, a crítica do valor econômico se tornou uma luta do capital contra o trabalho. A crítica da economia política de Marx não é economia política, simplesmente. Ela vê esta como campo de ideologias econômicas a serem desmascaradas”. (Bandeira da Silveira. 2021: cap. 3).

Vivemos em uma época além da pós-modernidade:

“A relação entre os fenômenos da globalização anarcocapitalista e o mercantilismo do capital asiático chinês é o de escuridão que avança sobre o campo de luz. Aliás, o mercantilismo do capital asiático aparece através de fenômenos com cores quentes e vibrantes. O que substitui a globalização em desintegração final?”. (Bandeira da Silveira. 2024: cap. 6, parte 4).

 

ALTHUSSER, Louis. Réponse a Jonh Lewis. Paris: Maspero, 1973

ARISTOTELES. Obras. Politica. Madrid: Aguilar, 1982

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Crítica da gramática do capital. EUA: amazon, 2021a

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Mundialização do mercantilismo capitalista. EUA: amazon, 2021b

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Gramática do general intellect. EUA: amazon, 2022

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. além da época posmoderna. EUA: amazon, 2024

BLAUG, Mark. Teoria económica de Ricardo. Un estudo histórico. Madrid: Ayuso, sem data  

FREUD. Mal-estar na civilização. Obras Completas. Volume 21. RJ: Imago, 1974

BOHM-BAWERK. Teoria positiva do capital. Volume 1. SP: Abril Cultural, 1986

MARX., Carlos. Teorias de la plusvalia. Tomo 1, Madrid: Editor Alberto Corazon, 1974

MARX, Karl. Le capital. Livre premier. Paris: Editions Sociales, 1977

RICARDO E Smith, David e Adam. Investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações. Princípios de economia política e tributação. Pensadores. SP: Abril Cultural, 19743

STRAUSS, Leo. De la tyrannie. Paris: Gallimard, 1977

     

        

     

   

                            

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