José Paulo
Jeremy Scahill usa a expressão <guerras sujas- o mundo é
um campo de batalha>. O 11 de setembro de 2021 já foi esquecido. Mas a
partir dele, o neoconservadorismo americano fez do assassinato político sua
arma política secreta na geopolítica mundial.
O assassinato político pelas instituições estatais {CIA a
frente} tem uma história anterior ao 11 de setembro, pois, os EUA liberaram
para o campo da direita de países amigos o assassinato de líderes de países
inimigos [e o assassinato em seus próprios países] desde a década de 1950.
Bush filho e os neoconservadores foram a plebe rude
foucaultiana da transformação da forma de governo americana. No lugar da
democracia americana representativa clássica, presidencialista-republicana, a
plebe rude fabricou uma forma de governo neogrotesca, mafiosa,
tirânica/cesarista representativa com a aliança e unidade do governo, Senado, e
Suprema Corte.
A partir daí, o
capital americano e os presidentes da República aparecem como efeito dessa
forma de governo. O Próprio presidente Obama [o anjo negro da América} conduziu
pessoalmente os membros do Seals que assassinaram Osama Bin Laden. Ele deu a
ordem em tempo real cibernético. Essa ordem foi o canto do cisne que anunciava
a nova forma de governo supracitada, símbolo maior da guerra suja como
paradigma política para as Américas.
A transformação da forma de governo americana teve
consequências na América Latina? Com o fim do paradigma democrático americano,
as elites da A-L perderam o modelo de referência para a sua vida política
baseada em uma moralidade ética, ética pública de permanecer do lado legal e
lutar contra as ilegalidades. As economias criminosas latino-americanas
aparecem como um efeito do <capitalismo criminoso>, estudado por S.
Platt, outro americano.
Qual o papel ideológico da imprensa na América Latina. Ela
faz de tudo e mais um pouco para ocultar as guerras sujas como agente político
que desintegra a forma de governo democrática/representativa. Um canal do
Youtube se apresenta como diferente do resto da imprensa. Seu líder diz que o
ICL faz a crítica da realidade brasileira. Faz realmente?
2
Enzensberger:
“Os animais lutam, mas não fazem guerra. O homem é o único
primata que planeja o extermínio dentro de sua própria espécie e o executa
entusiasticamente e em grandes dimensões. A guerra é uma das suas invenções
mais importantes; a capacidade de estabelecer acordos de paz é provavelmente
uma conquista posterior. As mais antigas tradições da humanidade, seus mitos e
lendas heroicas, falam sobretudo da morte e do ato de matar. A luta travada em
maior proximidade física não se devia apenas à simplicidade da técnica de
construção de armas. Tratava-se também da maior satisfação psíquica obtida em
extravasar o ódio naqueles que se conhecem, nos vizinhos. Desta forma, a guerra
civil não seria apenas uma antiga tradição, mas a forma original de todos os
conflitos coletivos. Já se passaram 2500 anos desde que ela encontrou sua
clássica representação literária na insuperável história da guerra do
Peloponeso”. (Enzensberger: 9).
A guerra civil faz parte da stásis, um conjunto de
fenômenos como motim, rebelião, sublevação, revolta, insurreição, guerra civil.
(Schmitt: 55). A guerra civil é o agente que funda o campo político/estético do
brutalismo ao lado da pólemos ou guerra entre povos e Estados desde a
antiguidade. (Derrida: 110-111).
A guerra civil cria e recria o campo político/estético como
totalidade mitológica diabólica:
“Alors que l’intelloigence décompose le sens, le mythe le
composse. C’est pourquoi il ne saurait être compris d’après une supposée
valeurs explicativwe: le mythe n’est pas une science des primitifs mais un
moyen de compréhension immédiate du réel. L’opposé du sym-bolique, c’est,
proprement, le dia-bolique”. ( Godin:732).
No <Além da época posmoderna>, a totalidade diabólica
se constitui na tirania/cesarismo como natureza da natureza estética do campo
político das Américas?
3
A guerra não tem gramática? Ou ela é a gramática da
violência? Uma longa citação de Engels põe tal problema:
“Porém, nem a própria comunidade nem o agrupamento de que
fazia parte forneciam forças de trabalho disponíveis, excedentes. A guerra
proporcionava-as, e a guerra era tão antiga como a existência simultânea de
vários grupos de comunidades vizinhas. Até então não tinham sabido o que haviam
de fazer com os prisioneiros, e por isso os matavam, e, em tempos anteriores,
comiam-nos. Mas quando se chegou a esta fase da <situação econômica>, os
prisioneiros adquiriram um valor; por isso lhes foi consentido viverem, para se
poder aproveitar o seu trabalho. Desta maneira, a violência, longe de dominar a
situação econômica, foi posta, como se vê, ao serviço desta. Tinha-se
descoberto a escravatura. (Engels: 53).
A interpretação materialista histórica da violência parece
submetê-la à economia do trabalho escravo.
Segue:
‘A escravatura não tardou em transformar-se na forma
predominante da produção em todos os povos cujo desenvolvimento já tinha
ultrapassado as fronteiras das comunidades primitivas, para acabar por
transformar-se, por fim, numa das causas pri8ncipais da sua decadência. Só a
escravatura tornou possível a divisão do trabalho em maior escala entre a
agricultura e a indústria, e graças a isso pôde florescer a cultura do mundo
antigo, o helenismo”. (Engels: 53).
Parece que com o helenismo a violência é submetida à cultura
política econômica escravocrata grega do Estado lacaniano administrador da
mais-valia pública produtora da polis obra-de-arte
Segue:
“Sem a escravatura, não pode conceber-se o Estado grego, nem
a arte e a ciência da Grécia; sem escravatura, não teria existido o império
romano. E sem as bases do helenismo e do Império romano, também não chegaria a
formar-se a Europa moderna. Nunca deveríamos esquecer-nos de que todo o nosso
desenvolvimento econômico, político e intelectual teve como condição prévia um
regime em que a escravatura era uma instituição tão necessária como reconhecida
de modo geral [...]”. (Engels: 53-54).
A relação entre violência e economia escravista só é
inteligível na cultura política
econômica grega. Na época moderna dos 1500, a escravatura de outros povos pelo
europeu gerou um estado de violência permanente sobre os povos escravizados nas
Américas. A gramática da violência nas Américas estabeleceu-se como a guerra
racial permanente contra o escravo.
Indo ao Oriente, na China:
“O ambiente político era largamente propício à prática dos
talentos de peritos de qualquer especialidade, com interesse especial para os estrategistas
de profissão. Entre 450 e 300 a,C., gerações sucessivas foram exterminadas com
metódica regularidade, tendo-se a guerra transformado numa <ocupação
fundamental>. Qualquer pretensão de aderência ao idílico código moral,
reputadamente praticado nos reinados dos Reis Sábios, fora há muito abandonada.
A diplomacia baseava-se no suborno, na fraude e no ludibrio. A espionagem e a
intriga pululavam. Procedimentos traiçoeiros não eram vistos como anormais por
parte dos generais, que, sem pejo, rompiam as suas alianças, nem dos ministros
de Estado, facilmente corrompíveis”. (Sun Tzu: 46-47)
A gramática da guerra asiática da antiguidade inclui o
<general intellect gramatical> como fenômeno social das relações técnicas
de produção da guerra. Sun Tzu diz:
“A guerra é um assunto de importância vital para o Estado; o
reino da vida e a morte; o caminho para a sobrevivência ou a ruína. É
indispensável estudá-la profundamente”. (Sun Tzu: 91).
Na época moderna, a gramática da guerra é mediada pelo
direito natural moderno. (Strauss: 154).
“E contando-me a mim clarissimamente por razões que já expus,
que existia entre os povos algum direito comum que valia pra as guerras e nas
guerras [...]. ((Grocio: 22-23).
A etimologia do significante:
“Não repugna a origem deste nome”.
“Porque a guerra (bellum) vem da voz antiga duelo (duellum),
como dueno (duonus se converte em bueno, e duis en bis”. (Grocio: 45).
A gramática do direito da guerra justa ou injusta põe o
problema:
“Se há alguma guerra justa, e logo que é justo na guerra”.
“pois direito não significa aqui outra coisa que o que é
justo: negando, más bien por el significado que de palabra, que seja direito o
que não é injusto”.
“Mas é injusto o que repugna a essência da sociedade de los
que gozão de razão”. (Grocio: 46).
A tela gramatical do logos natural define o que é a guerra
justa ou injusta no campo político/estético internacional.
Na Europa, há a tela gramatical estética da guerra:
“A <arte da guerra>, tal como se concebia no século
dezoito, era em grande parte uma arte de manobra. Nela se incluíam elementos importantes
de estética e protocolo. Um exército era julgado tanto pela sua aparência no
campo de batalha como pela sua perícia e bravura. Para que fosse assim, algumas
exigências <estéticas> chegavam a ser defendidas em terrenos pragmáticos”.
(Clausewitz: 14).
A guerra política é a <guerra como simples continuação da
política por outros meios>. (Clausewitz: 87). Assim, a guerra é um ato de violência,
com a finalidade de fazer nosso inimigo obedecer à nossa vontade. Por esta razão,
o desarmamento ou destruição do inimigo ou ameaça disto deve ser sempre o
objetivo da guerra. A guerra é um ato político e também um eficiente
instrumento político, uma continuação do intercâmbio político e uma forma
diferente de executá-lo. A guerra é uma trindade maravilhosa, composta da violência
original de seus agentes, do jogo das probabilidades e da sorte (o que a torna
uma atividade do espírito), e de sua natureza secundária de instrumento
político: o que a coloca no domínio da razão”. (Gallie: 57).
A guerra é um agente que ergue uma tela gramatical do general
intellect gramatical no campo político/estético internacional. Na atualidade, o
agente desse campo é o Estado suicidário nuclear hitleriano (Virilio: 46) sob
uma nova versão.
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Brasil profundo. EUA:
amazon, 2021
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Além da época posmoderna.
EUA: amazon, 2024
CLAUSEWITZ, Carl von. Da guerra. SP: Martins Fontes, 1979-
DERRIDA, Jacques. Politique de l’amitié. Paris: Galilée, 1994
ENGELS, Friedrich. Temas militares. Lisboa: Estampa, 1976
ENZENSBERGER, Hans Magnus. Guerra Civil. SP: Companhia das Letras,
1995
GALLIE, W. B. G. Os filósofos da paz e da guerra. Brasília:
UNB, sem data GROCIO, Hugo. Del derecho de la guerra e de la paz. Volume 1.
Madrid: Reus, 1925
GODIN, Christian. La totalité. Volume 1. Paris: Champ Vallon,
1998
SCAHILL, Jeremy. Guerras sujas. O mundo é um campo de batalha. SP: Companhia das Letras, 2014
PLATT, Stephen. capitalismo criminoso. SP: Cultrix, 2017
SCHMITT, Carl. O
conceito de político. Petrópolis: Vozes, 1992
STRAUSS, Leo. Droit naturel et histoire. Paris: Flammarion,
1954
SUN TZU. L’art de la guerre. Paris: Flammarion, 1972
VIRILIO. Paul. L’insécurité du territoire. Paria: Galilée,
1976
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