José Paulo
A dominação é uma forma particular de um mundo como
plurivocidade de poder. Weber fala de 2
tipos de estrutura de dominação, antagônicos. (Weber. V. 2:188). A dominação
segundo uma constelação de interesses, sendo paradigma o mercantilismo do
capital em um contraponto ao capitalismo liberal. A dominação do mercantilismo
do capital é da época da sociologia weberiana na Alemanha. Seu amigo e
companheiro Werner Sombart fala de <neomercantilismo> europeu, claro. (Sombart:
83).
A dominação do mercantilismo do capital asiático é a tela
gramatical dos fenômenos econômicos ou estrutura do capitalismo planetário,
tomando hegemonia como estrutura de dominação:
“No ´posfordismo, a hegemonia é da multinacional em aliança
com o capital fictício. No regime mercantilista capitalista, a hegemonia é a
aliança da multinacional mercantilista com o general intelect industrial”
“O general intelect empresarial torna-se uma fração do
capital na posição de hegemonia no bloco no poder. Este fenômeno define a
distinção entre semiocapitalismo e o mercantilismo capitalista”. (Bandeira da
Silveira.2021: Cap. 2).
O mercantismo do capital asiático é a estrutura de dominação
ou poder asiático que traça um caminho alternativo ao fim do capitalismo, fim
do Estado nacional, fim da política e outros milenarismos.
A outra gramática da dominação é a estrutura autoritária
funcionando pela relação de mandonismo e obediência passiva, ou seja, sem
crítica da gramática. Essa estrutura de dominação caracteriza no campo político
a gramática do cesarismo
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Na sociologia da dominação weberiana ou é anarquia ou
dominação, mas não há a estrutura de dominação como tela gramatical estética no
campo político. Nietzche diz que os polos glaciais da gramática da vida são,
caos ou estética:
“Mas o caráter do mundo é, ao contrário, o de um caos eterno,
não pelo fato da falta de uma necessidade, porém pela falta de ordem, fde um
encadeamento de forma, do belo, de sabedoria, em resumo, de toda a estética
humana”. (Nietzche1977. 130; 1982: 138).
O universo não é uma tela gramatical estética e a natureza
não tem gramática estética política:
“Ora como poderemos permitir-nos censurar ou louvar o
universo! Defendamo-nos de lhe censurar uma falta de afeto ou de razão ou o
contrário destas coisas: não é nem perfeito, nem belo, nem nobre, e não quer
transformar-se em nada disso; não procura de forma alguma imitar o homem! Não é
tocado por nenhum dos nossos juízos estéticos e éticos! Não possui instinto de
conservação, não possui qualquer instinto e ignora toda a espécie de lei.
Defendamo-nos de dizer que eles existem na natureza. Essa só conhece necessidades:
nela não há ninguém que ordene, que obedeça, que infrinja”. (Nietzsche.1977:
130).
A natureza é o grau zero da dominação estético/política. A
extrema direita das Américas quer fazer do campo político um retorno á
natureza, ao campo das necessidades como grau zero da dominação
estético/política. A extrema direita quer tornar a natureza o divino da vida
política que não é mais um campo político/estético. Contudo:
“Quando deixaremos de ser obscurecidos por todas estas
sombras de Deus? Quando teremos completamente <desdivinizado> a natureza?
Quando nos será permitido, enfim, começarmos a nos tornar naturais, a
<naturizarmos-nos>, nos homens, com a pura natureza, a natureza
reencontrada, a natureza liberta?”. (Nietzsche. 1987: 131).
Quando não será mais necessário a estrutura de dominação
estético/política?
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Nietzsche pensa a estrutura de dominação estético política a
partir da relação Renascimento/Barroco?
A tela gramatical estética é a pintura do mundo:
“A mais ínfima parcela do mundo é uma cosa infinita!”.
“Dele só pinta aquilo que lhe agrada. E o que é que lhe
agrada: aquilo que sabe pintar!”. (Nietzsche. 1987: 29).
Sobre o barroco o iluminismo classicista:
“Do recalque das paixões. Se é constantemente proibida a
realização das paixões como algo
<vulgar> que é necessário deixar ás naturezas grosseiras, aos burgueses,
aos camponeses, se portanto se quer não refrear as próprias paixões, mas apenas
a linguagem de seus gestos, nem por isso deixa de se alcançar, ao mesmo tempo,
aquilo que se não quer: refreiam-se as próprias paixões , ou ao menos saem elas
enfraquecidas e transformadas; foi assim que ocorreu, exemplarmente, à corte de
Luís XIV e a tudo o que dela dependia. A época seguinte, educada no hábito de
refrear a realização das paixões, perdeu mesmo a própria paixão; foi ela
substituída pela graça, pela frivolidade, pela ligeireza; foi uma época marcada
pela incapacidade de se mostrar descortês: a tal ponto que só se dirigia e só
se conseguia ofender com considerações delicadas. Talvez a nossa época forneça
a mais curiosa contrapartida desse século: vejo por toda parte na vida, no0
teatro, e, do mesmo modo, em tudo o que se escreve, o prazer que se tem diante
de qualquer fulgor grosseiro e de qualquer gesto malsão da paixão,... por preço
nenhum a própria paixão! No entanto há-de acabar-se assim por encontrá-la e os
nossos netos terão uma sincera selvageria, e não só a das maneiras ou grosseria
do tom”. (Nietzsche: 1987: 76; 1982:86-87).
“O solitário. Detesto seguir alguém assim como detesto
conduzir. Obedecer? Não! E governar, nunca! Quem não se mete medo não consegue
metê-lo a ninguém, E só aquele que o inspira pode comandar. Já detesto guiar-me
a mim próprio! Gosto, como os animais das florestas e dos mares, De me perder
durante um grande pedaço, Acocorar-me a sonhar num deserto encantador, E
forçar-me a regressar de longe aos meus penates, Atrair-me a mim próprio...para
mim”. )(Nietzsche: 1987: 23).
O grau zero da domi8nação é o anacoreta?
O campo político estético do indivíduo nada é sem as
aparências de semblância do campo político da sociedade:
“Egoísmo estelar. Se como um tonel que rola, Eu girasse sem
cessar em volta de mim, Como é que não havia de arder? A correr atrás do sol
ardente?”. (Nietzsche. 1987: 22).
Ou:
“Todos os esgotados amaldiçoam o sol; Para eles o valor das
árvores está ...na sombra”. (Nietzsche: 1987: 26).
Buscar a escuridão do campo político barroco é um fenômeno
que faz parte da nossa classe política. Ora, o campo político barroco:
“<Ele desce, ele cai>, troçai vós; A verdade é que
desce sobre vós. O seu excesso de felicidade foi a sua desgraça, O seu excesso
de luz acompanha a vossa escuridão”> (Nietzsche: 26-27).
A relação entre doença do corpo/espírito absoluto e tela
gramatical no campo político:
“Qualquer filosofia que ponha a paz mais alta do que a
guerra, qualquer ética que conceba negativamente a felicidade, qualquer
metafísica, qualquer física que encarem um final, um qualquer estado
definitivo, qualquer aspiração, sobretudo estética ou religiosa, possuindo um
ao-lado, um para-além, um de-fora, um por-cima, autorizam a que se procure
saber se não foi a doença que inspirou o seu filósofo. Dissimulam-se
inconscientemente as necessidades fisiológicas do homem, sobrecarregam-se com a
capa de objetividade do ideal, da ideia pura,; leva-se a coisa tão longe que
acaba por meter medo; e muitíssimas
vezes me perguntei se a filosofia, em geral, não foi até agora uma simples
exegese do corpo, um simples erro do corpo. Atrás das mais altas evoluções
éticas que guiaram até agora a história do pensamento ocultam-se mal-entendidos
nascidos da conformação física tanto dos indivíduos como das classes, e
finalmente deraças inteiras”. (Nietzsche.1987: 10-11).
As estruturas de dominação [filosofia, ética,
metafísica, milenarismo, física, religião, estética política etc.] não são
apenas associadas à doença no campo político do indivíduo e/ou do corpo/alma da
sociedade. Mas ao sofrimento nos campos supracitados do discurso político da
filosofia:
“Os pensadores doentes se deixam arrastar precisamente porque
sofrem”. (Nietzsche. 1987: 10).
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Nietzsche estabelece a gênese do campo político do indivíduo
na cultura política ocidental:
“Os índices da corrupção. – Observai os sintomas destas circunstâncias
sociais, necessárias de tempos e tempos, que se designam pelo termo de
<corrupção>. Logo que a corrupção penetra em qualquer parte, vê-se reinar
uma plurivocidade de superstição, em face da qual a crença geralmente adotada
até então pelo povo empalidece e se torna impotente: porque a superstição é um
livre pensamento de segunda categoria; quem se lhe entrega elege certas formas,
certas fórmulas que lhe agradam; concede-se o direito de escolher. O supersticioso
tem qualquer coisa de mais <pessoal> do que o crente; uma sociedade
supersticiosa será aquela onde se encontram já muitos indivíduos e prazer em
tudo o que é individual”. (Nietzsche. 1977: 59;1982: 71-72).
O campo político do indivíduo inviabilizou a forma de governo
republicana constitucional grega como estrutura de dominação hegemônica. Ele
funcionou como um sintoma da <corrupção> permanente dessa forma de
governo.
Antigo/moderno. Como a forma de governo presidencialista das Américas
é calcada no grande indivíduo [presidente da república}, ela aparece como um estado
permanente de forma de governo como corrupção cesarista.
Assim:
“Em quarto lugar, quando os costumes se <corrompem. É o
momento em que surgem esses seres a que se dá o nome de <tiranos>: são os
precursores, são por assim dizer as precoces guardas-avançadas do indivíduo
(...). Quando a decomposição chegar ao apogeu, assim como a luta de tiranos de
todas as qualidades, vê-se sempre chegar o César, o tirano definitivo que vibra
o golpe de misericórdia à luta enfraquecedora dos concorrentes preponderantes
fazendo trabalhar o cansaço em seu proveito. Quando parece o indivíduo, em geral,
é no momento da sua maturidade perfeita, estando a <cultura> por
consequência no zênite de sua fecundidade..., mas não é graças a ele , não é
por via do tirano, se bem que as pessoas de cultura muito grande gostem de lisonjear
o César, fazendo-se passar por obra sua. A verdade é que eles têm necessidade
de paz exterior porque trazem a sua inquietação dentro deles, porque o seu
trabalho é uma coisa interior. É o grande momento da traição, da corruptibilidade:
porque o amor ao eu descoberto de fresco é então muito mais poderoso do que o
amor à <pátria>, velho conceito roto, enterrado sob excessos de
vocabulário (...)”. (Nietzsche. 1961: 60-61).
A relação do campo político do indivíduo com o campo político
da sociedade tem esse ponto sensível [fantasia, objeto real] que é o indivíduo
como tirano. A cultura política de Roma fez do tirano o César e da tirania o
cesarismo, uma forma de governo em estado permanente de corrupção na cultura
política ocidental e, talvez, em outras civilizações. A forma de governo cesarismo
é o agente de corrupção da juventude nas Américas, ao ponto de fazer desaparecer
o jovem [como fenômeno histórico] como agente político [no campo político] de
mudança da forma de governo. A tela gramatical estético/político do jovem foi desintegrada.
Sobre o futuro no cesarismo:
“O futuro é tão incerto que as pessoas vivem dia a dia,
estado de alma que favorece o jogo [de poder] dos tentadores de todas as
espécies: porque também não se deixa seduzir, e corromper, senão por <um
dia>, reservando-se um futuro de virtude!”. (Nietzsche. 1977: 61).
O que é o indivíduo cesarista:
“Sabe-se que o indivíduo, esse autêntico homem <em si>,
pensa mais nas coisas do momento do que o seu antípoda, o homem do rebanho,
porque não pensa contar mais consigo do que conta com o futuro; liga-se do
mesmo modo aos tiranos, porque se julga capaz de ações e de investigações que
não contar nem com a inteligência nem com o perdão da multidão, ... uma vez que
o tirano ou o César compreendem o direito do indivíduo, mesmo nas suas aberrações
[...]”. (Nietzsche. 1977: 61).
O campo político do cesarismo cria e recria, põe e repõe, o
mundo como produção política do heteróclito: de aberrações, de monstros
políticos.
A figura de Napoleão Bonaparte é o agente heteróclito
perfeito da modernidade da Europa:
“Porque pensa dele, e quer que o pensem, aquilo que Napoleão
exprimiu um dia da forma clássica que lhe era particular: <Tenho o direito
de responder a todos os vossos queixumes com um eterno EU. Estou apartado de
toda a gente, não aceito as condições de ninguém. Deveis submeter-vos a toas as
minhas fantasias e achar muito simples que me dê semelhantes distrações>.
Foi o que ele disse à mulher um dia em que ela tinha razões para duvidar da sua
fidelidade”. (Nietzsche. 1977: 62).
Napoleão é a fantasia, por excelência, como objeto real na
junção do campo político do indivíduo com o campo político da Europa:
“As épocas de corrupção são aquelas em que as maçãs caem da árvore:
quero dizer os indivíduos, aqueles que carregam em si o sémen do futuro, os
promotores da colonização intelectual, os que querem modificar as relações
entre o Estado e a sociedade. A palavra corrupção é só um termo injurioso
quando designa os outonos de um povo”. (Nietzsche. 1977: 62).
No campo político/estético, o indivíduo aparece como uma prática
política molecular que, fora o outono de um povo, aparece como agente de
mudança do presente em direção ao futuro. Ele não aparece como antípoda da multidão barroca que trás o futuro.
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Mundialização do
mercantilismo capitalista. EUA: amazon, 2021
NIETZSCHE. A gaia ciência. Lisboa: Guimarães, 1977
NIETZSCHE. Le gai savoir. Paris; Gallimard, 1982
SOMBART, Werner. El apogeo del capitalismo. México: Fondo de
Cultura Económica, 1946
WEBER, Max. Economia e sociedade. Volume 2. Brasília: UNB,
1999
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