quinta-feira, 29 de junho de 2017

CULTURA GRAMATICAL DA CIDADE – ˂falar de si como grotesco>

José Paulo


    CULTURA GRAMATICAL DA CIDADE – ˂falar de si mesmo>
Hoje, o sujeito gramatical José de Souza Martins ($gjsm) é a voz SOCIOLÓGICA ESQUIZO que fala soberanamente pela sociologia uspiana-londrina. Estou entregando ao leitor este texto específico gramaticalizando o inconsciente esquizo do discurso do político do sociólogo uspiano, no qual JSM tem uma presença irrevogavelmente definitiva. Espero que o leitor compreenda que JSM é o sujeito gramatical, pois, ele fala de si mesmo

                                                                 DO ESQUIZO SOCIOLÓGICO
GILBERTO FREYRE
No Rio, quando se fala de $ esquizo logo as pessoas querem discutir Deleuze e Guattari. As cariocas desconhecem o $esquizo recifense (que morreu depois de uma longa tristeza por ter sido associado gramaticalmente à cultura nazista da política do Rio Grande do Sul cuja expressão política máxima sgrammaticatura são os generais nazistas Médici e Geisel).

Quando comecei a gramaticalizar o inconsciente do discurso do político do sociólogo de Pernambuco, logo vi toda a grandeza das lendas de minha origem familial colonial nordestina, lendas narradas nas histórias de minha avó e suas filhas, especialmente, minha tia BU preferida (Lourdes Maria Bandeira). Percebi, então, que Gilberto Freyre falava do sujeito sociológico nordeste patriarcal colonial, ao falar de si mesmo!                                                                                    


                                           A CULTURA DA CIDADE GRAMATICAL TOUT COURT

Não estou interessado em saber se os sociólogos e os filósofos da cidade de São Paulo são competentes como os da Europa e os dos Estados Unidos. Meu interesse é falar da relação entre o saber reflexivo e a polis no Brasil, fazendo-o com pinceladas fortes, curtas e breves.

Não vou recorrer à literatura especializada sobre tal objeto de conhecimento, pois, os intelectuais paulistas (excetuando o filósofo Paulo Arantes) pouco falaram sobre a relação entre conhecimento acadêmico e polis. Polis, porquê?

A polis significa que o saber produzido na cidade funciona no espaço procedural estranho da luta e do diálogo das culturas políticas das cidades que organizam a invasão do real pela ideologia gramatical dominante, que não precisa, necessariamente, ser uma ideologia da classe dominante. Ela pode ser e será a ideologia gramatical da classe simbólica, se esta classe se encontra bem estruturada nos países de periferia lacaniana do capitalismo central. Este parece ser o caso da cidade gramatical São Paulo. 

Mas nem sempre foi assim!

São Paulo fez uma longa luta com a cidade do Rio para se tornar a cultura de articulação da hegemonia da política nacional da cidade gramatical. Já escrevi suficientemente sobre este objeto de desejo simbólico, então, não vou voltar a ele aqui. 

Falando brevemente, a cultura universitária de SP esteve ligada à cultura europeia francesa ou inglesa. Só se pode falar de decadência se uma cultura teve sua época de esplendor. A era de esplendor da cultura francesa se liga aos pós-modernista, Derrida, Deleuze e Lacan depois do reinado de Sartre na década de 1950. Na década de 1960, Paris viu nascer o Lacan marxista mai 1968, ignorado por Jacques Allain-Miller e a filha de Lacan, Judiht, esposa de Miller, e também não metabolizou o Lacan fascista alemão da lógica do sujeito como efeito irrevogável significante.

O fascismo lacaniano cabe na fórmula determinista: o sujeito é efeito do significante (Lacan. S. 16: 47). Este certamente não é o sujeito da tese de doutorado defendida na Universidade de Paris VIII, sob tutela do dialético maoísta platônico Alain Badiou, pelo professor da USP Vladimir Safatle.

Ora, não se trata de pensar apenas o que há de irreflexivo no sujeito (Safatle: 23). Se o sujeito é efeito do significante, o irreflexivo pode ser aquela ideologia gramatical que invadiu o sujeito gramatical como efeito da invasão do significante nos modos de subjetivação próprios da praxis lacaniana, pois, se trata da invasão em choque com à gramatica em narrativa lógica lacaniana: rememoração, verbalização e simbolização (Safatle: 22).

A ideologia gramatical invasora comporta significantes negativos que explora o que há de irreflexivo no sujeito que é, de certo modo, a busca do reconhecimento gramatical na ideologia dominante moderna da classe simbólica que se encontra no comando da classe governante. O que permanece persistente e robusto é o discurso da clivagem e da contrariedade que bloqueia a sintetização, não como reconciliação entre a consciência e a negatividade radical do inconsciente. Trata-se do que bloqueia a sintetização entre o sujeito irreflexivo e a ideologia negativa radical gramatical da consciência, sintetização entre sujeito gramatical e objeto gramatical.

Se a negação é a presença do real que permanece fora da simbolização; se é modo ontológico da presença do real, isto significa, talvez, todo o impacto da negatividade da invasão da ideologia gramatical no real do ser do da sociedade (do qual o sujeito é e expressão) como efeito do significante ideologia gramatical da classe simbólica da cidade gramatical modernista.

Se a sociedade é a cidade cultural gramatical modernista (com suas instituições culturais e massas simbólicas da modernidade tardia), então, é válido tomar por objeto um sujeito vivo e soberano da sociologia do departamento da USP para demonstrar que o sujeito é uma propriedade do Lacan fascista e não de um outro Lacan, marxista, por exemplo, sujeito encarnado na biografia do mundo-da-vida da política russa: Lenin - Sujeito gramatical capaz de alterar os caminhos da história do século XX.                      

 Hoje, o sujeito gramatical José de Souza Martins (JSM = $gjsm) é a voz SOCIOLÓGICA ESQUIZO que fala soberanamente pela sociologia uspiana-londrina. Estou preparando um texto específico gramaticalizando o inconsciente esquizo do discurso do político do sociólogo uspiano, no qual JSM tem uma presença irrevogavelmente definitiva. Aqui apenas gramaticalizo três livros do sujeito esquizo JSM
                                                                                     II

Safatle é ligado a história parisiense freudiana (via lacaniana) da cultura da cidade gramatical São Paulo. Ele significa uma ruptura com a antiga sociologia brasileira da USP (Antônio Cândido, Florestan Fernandes, Octávio Ianni, Fernando Henrique e Francisco Weffort) que se orgulhava de fazer uma cultura universitária puramente paulista. José de Souza Martins é ligado a Londres, em parte, e, em parte, ligado à cultura uspiana da cidade de São Paulo. Hoje já é possível ler a sociologia londrina paulista através de Lacan integrado à filosofia da polis paulista como pensamento marxista paulista ocidental.

O Lacan de Safatle é o projeto uspiano de desenvolver o Lacan mai 1968 (Lacan dialético ocidental), ligando o marxismo psicanalítico de Lacan ao pensamento marxista ocidental alemão em defesa do sujeito como destroço na conjuntura do pós-modernismo tardio na cultura da política da economia e da cultura universitária: filosofia anglo-saxã da mente, pós-estruturalismo francês e filosofia neopragmática da intersubjetividade. Como sempre o totalitarismo atribuído ao sujeito de Hegel é a fonte de luz para os ataques, mas, também, para a resistência e persistência de um sintoma como o de um Outro caminho dialético:
“Essa resistência do sujeito como lugar de não identidade (não identidade do sujeito com o significante, ou melhor, sujeito como efeito do significante no território da subjetividade [ou subjetivação gramatical] territorial narrativa gramatical lógica) só pode ser compreendida se aceitarmos a natureza dialética dos pensamentos de Lacan e Adorno. A relação criativa e conflitual com Hegel é importante para os dois e, como já deve ter ficado claro, creio tratar-se de um grave erro defender que a influência das problemáticas hegelianas sobre Lacan esgotam-se na importação dos filosofemas de Alexandre Kojève e de Jean Hyppolite. Na verdade, a confrontação de Lacan com Adorno serve sobretudo para abrir as portas a uma reflexão mais ampla sobre o destino da dialética no século XX”. (Safatle: 33).

Com efeito, trata-se da presença ou não da dialética transmutada em transdialética se das páginas do livro A paixão do negativo. Lacan e a dialética, a dialética marxista lacaniana alemã deslizar do domínio da ética e da estética (Safatle: 33) para o domínio da política ou da cidade gramatical de significantes sociológica, onde o sujeito transliterário é autor ator-herói de seu agir em choque com a ideia do sujeito como simples efeito do significante, mesmo se tratando da gramática da sociedade do sujeito esquizo de Gilberto Freyre como equilíbrios de antagonismos (Freyre: 6-7, 420).   

Esta Ideia de sujeito gilbertiano não faz pendant com aquela que se encontra na física gramatical de Heráclito?
“51. Idem. Ibidem, IX, 9.
                                Não compreendem como o divergente consigo mesmo concorda; harmonia de tensões contrárias, como de arco e lira”. (Heráclito: 84).

O divergente não é o sujeito do fascismo alemã lacaniano que - ou se comporta tal como um cadáver para sustentar o sujeito Inácio de Loyola do jesuíta perinde ac cadáver, ou seja, sujeito simples efeito do significante Loyola da não-identidade deste significante com o sujeito convergente - ou como das Ding, ou na condição de objeto a [Safatle: 34-35] - objeto de reconhecimento do desejo sexual do senhor na sua condição de resto que cai da cadeia de significantes Companhia de Jesus.

É o sujeito heraclitiano convergente:
“96. IDEM, ibidem, IV, 4,3, p669 A.
                    Pois cadáveres, mais do que estercos, são para jogar fora”. (Heráclito: 88).

O sujeito Jesuíta colonial não é mais o sujeito perinde ac cadaver; ele é o sujeito equilíbrio de antagonismos da catequese da invasão do negativo no real do ser da vida indígena como destruição (Safatle: 26) do outro (o indígena) na transferência deste para o domínio católico ariano europeu:
“Ainda mais: procuraram destruir, ou pelo menos castrar, tudo o que fosse expressão viril da cultura artística ou religiosa em desacordo com a moral católica e com as convenções europeias. Separaram a arte da vida. Lançaram os fundamentos no Brasil para uma arte, não de expressão, de alongamento da vida e da experiência física e psíquica do indivíduo e do grupo social; mas de composição, de exercício, de caligrafia”. (Freyre: 109).

Trata-se, portanto do subdito sujeito que não é expressão da vida, mas da máquina de guerra freudiana da caligrafia do significante católico SENHOR SUJEITO Inácio de Loyola.      

O sujeito transliterário divergente é uma ideia que se encontra na física de Heráclito e por outros caminhos em Bakhtin. Tal sujeito é aquele da transdialética que é o poder de mover a dialética do sujeito de um domínio perinde ac cadaver para um domínio do autor como ator-herói. Toda a luta do indígena (de ataque-confrontação e, depois, no refluxo, de resistência) contra a colonização civil e jesuítica constrói o autor tribal como ator-herói (trans-sujeito), indício que se encontra no discurso do político literato José de Alencar, no século XIX romântico brasileiro.

O trans-sujeito faz pendant com o transliterário: 
“A abordagem mais séria desses problemas resume-se aos métodos biográficos e sociológicos, que, no entanto, não dão provas da compreensão formal-estética suficientemente aprofundada do princípio criador existente na relação do autor como o herói, a qual é substituída por uma relação psicológica e social, passiva e transcendente à consciência criadora: o autor e o herói não aparecem como componentes do todo artístico, mas como componentes da unidade transliteraria constituída pela vida psicológica e social”. (Bakhtin: 29).                
                                                                                    III

Agora faço a passagem abrupta não-jesuítica para o departamento de sociologia londrino da USP. Selecionei três livros de JSM, de três períodos diferentes da vida universitária do autor paulista, para iniciar a gramaticalização do inconsciente do discurso do político do sociólogo paulista vivo. Não se trata de um autômato sociológico! 

O primeiro livro é o Capitalismo e tradicionalismo.

SJM parte da literatura que opera com o sujeito sociológico “tipo humano” como o empresário, o caipira e outros para falar da constituição da economia nacional, onde a modernização agrária constitui o impossível dessa situação de industrialização restrita ao urbano. Neste período estudado a massa de investimento se dirige para o urbano, deixando o mundo rural à mingua. 

O urbano se constitui como atividade comercial, bancária e industrial. Tal expansão vê nascer uma ideologia urbana (Martins. 1975: 2) e seus efeitos: o empresário e o operário assalariado como tipos humanos. Um tipo humano que se destaca é o operário italiano que traz da Europa a ideologia gramatical anarquista criando uma atmosfera revolucionária na cidade de São Paulo. A historiografia universitária de esquerda só quis saber do anarquismo manufatureiro que criava a ilusão da sociedade de classes sob comando da luta de classes como na Europa do século XIX na França, Itália etc.

Está claro que a sociologia de JSM começa pelo sujeito humano moderno e que a infância de JSM estava impregnada deste desejo e crença de ser moderno em uma cidade gramatical moderna de São Paulo!

Porém, na sociologia criticada por JSM, a urbanização e sua evolução demográfica e ideológica cria o urbano em um contraponto ao rural caipira, pois, ela possui o funcionamento de um mercado livre de trabalho, a “liberdade de enriquecimento”, de alcançar o êxito”: “que marcou a ideologia moderna das populações adventícias especialmente em São Paulo”. (Martins: 2). Flertando com a sociologia uspiana, Martins assiná-la que a evolução supracitada produziu sua contraideologia cuja expressão literária se encontra na obra do pensador autoritário de Alberto Torres, um dos inimigos ancestrais da sociologia paulista da USP.

O livro de JSM é um documento brilhante da (re) constituição da ideologia gramatical sociologia moderna da polis paulista da modernidade em um contraponto ao tradicionalismo cultural do homem caipira do campo; antagonismo entre o homem moderno e o homem tradicional, entre o moderno e o caipira.

Em um claro desafio ao grupo dominante da sociologia da USP, ele foraclui da cultura da polis paulista o livro de Maria Sylvia de Carvalho Franco Homens livres na Ordem Escravocrata que estabelece a cultura do caipira como ideologia gramatical que invade o real do mundo urbano através do significante uso da violência sem limite no mundo-da-vida (Franco: 16, 17, 25, 27, 37). Deve-se a Maria Sylvia a ideia do caipira rural-urbano lumpesinal.

De fato, ersatz de capitalismo, deve-se ao capitalismo tradicional de JSM (como conluio do homem tradicional com o homem moderno) o sujeito gramatical do caipira empresarial urbano-rural:
“Entendendo-se a modernização como parte do processo de desenvolvimento econômico, como ajustamento social e cultural a uma nova estruturação da economia, podemos afirmar que os fatores de mudança são os que podem ser apreendidos no plano da modernização empresarial, através da compreensão da ação do produtor empresário. Pode-se afirmar, liminarmente, que a modernização não produz o empresário e que nem toda persistência de padrões costumeiros de utilização de fatores de produção é antiempresarial”. (Martins. 1975: 41). 
  
Trata-se, portanto da junção do rural com o urbano, ou seja, do tradicional com o capitalismo na linguagem importada de Marx a Weber, no qual o burguês moderno não é um sujeito humano dito e certo. No entanto, JSM não percebe que o capitalismo urbano brasileiro é uma cópia do original virtual das páginas de Marx ou Weber. De qualquer modo, ele fala de uma junção da cultura da propriedade rural com a cultura do capital constituindo o homem paulista (e, por extensão imaginária paulista, brasileiro), e a polis gramatical paulista. Trata-se do empresário burguês caipira-urbano, não necessariamente um sujeito da modernidade:
“Não se pode, pois, a meu ver, fazer qualquer afirmação taxativa, quanto à área estudada de que o empresário é uma virtude do meio urbano nem do contrário, de que a situação rural é virtualmente antiempresarial”. (Martins. 1975: 36).

Ao caracterizar a história da sociedade civil brasileira como tradicional/urbana, é surpreendente que ele não se remeta ao livro de Sergio Buarque de Holanda que define a cultura da política da economia rural do coronel dominada pelo tipo humano psicopata (Holanda: 105), que (se levarmos em conta JSM) não desaparece com o subcapitalismo, ou melhor, ersatz de capitalismo da cidade gramatical de São Paulo.

Sérgio Buarque introduz a ideia impressionante (para a década de 1930, entre nós) de uma cidade gramatical povoada por máquinas de guerra psicopáticas ou psicóticas freudianas. Tratar-se-ia de uma cidade máquina de guerra urbana freudiana gramatical. Portanto, de uma outra gramática em narrativa sociológica da cidade gramatical mais influente economicamente ao lado da capital política, a capital carioca.  

A ideologia da modernidade sociologia da cidade de São Paulo opera com a foraclusão da constituição da classe governante pelo uso da violência caipira rural-urbano, pois, tal fato ligaria umbilicalmente urbano e agrário à cultura da guerra oligárquica branca dos livros de Oliveira Vianna.

Com seu urbano-caipira, JSM põe e repõe o pensamento sociológico conservador autoritário de um Oliveira Vianna como melhor caminho para se investigar a formação da classe dirigente do Sudeste que vê seu ideal de eu ou eu ideal na ideologia gramatical sociológica do urbano empresarial burguês moderno em ruptura com o empresarial fazendeiro tradicionalista: homem moderno de paz, progresso e obcecado pela alta cultura europeia.    

Aliás, há menção, inconscientemente, a autodissolução do bem organizado Brasil Nação rural (do Ancien régime) como ideologia gramatical do pensamento autoritária agrário de origem, principalmente, nordestina e caipira paulista (Martins. 1975:3, 50).     

A ideia do urbano como civilização e pacificação do mundo-da-vida é uma banalidade, um truísmo ideológico da cultura da cidade pseudomoderna como percebeu JSM. Este é um aspecto da ideia de modernização das relações sociais do urbano se diferenciando do mundo rural como ferramenta da ideologia sociológica do urbano pacífico versus rural violento; do abstrato burocrático weberiano versus a pessoalização das relações citadinas.  

A ideologia gramatical do urbano moderno (da polis paulista) é uma peça essencial a constituição da ideologia moderna nacional, contra a qual JSM se rebelou, pois, para Martins a nação econômica não é uma continuação por meios ideológicos da formação da modernização da cidade de São Paulo em um antagonismo com o tradicional pessoalismo caipira agrário do sertão. Hoje, a sociologia de JSM está na crista da onda de uma plurivocidade de estado de guerra civil oligárquica e lumpesinal, rural-urbano, sub judice do CRIMINOSTAT.  

A cultura da polis paulista é uma junção do pessoalismo da cultura da propriedade rural exportada para a cultura do capital como pessoalismo urbano na personificação, latente, da figura do imaginário do sertão de Rosa, o burguês-coronel urbano-rural (Martins: 18-20). Inclusive, a alta cultura universitária e extra universitária é constituída por panelinhas, famílias, clãs e feudos altamente pessoalizados. Trata-se de um ersatz do coronelismo oligárquico urbano-rural como modo de produção e circulação de bens simbólicos de autores restritos para um mercado consumidor de leitores ultra restrito.     

Para o sociólogo incauto de Martins, em resumo, a viabilidade da economia nacional está na dependência direta não apenas da expropriação do proletário urbano, mas fundamentalmente da expropriação do homem rural por ele mesmo, confinado no agrarismo extensivo, produzindo excedentes, produzindo-se como caipira rural. Os sujeitos-autores da ideologia da polis paulista encontram-se indicados nas notas. Ver especialmente a nota 14, página 12.  

O livro de JSM é um livro de combate de uma luta contra a supremacia ideológica gramatical urbana do burguês paulista na construção da fantasia lacaniana (Lacan. S. 20: 74-75) sociológica do princípio de realidade que define a civilização paulista moderna Brasil Nação em plena autodissolução econômica no ar da atmosfera da polis paulista. Como o monopólio de influência sobre o resto do país da cultura de massa encontra-se no Sudeste, o Brasil imaginário é visto por lentes que distorcem a realidade com a aparência da semblância do discurso do político do sociólogo da modernização urbana em contraponto ao tradicionalismo antigo do mundo rural.

Tal ideologia gramatical sociológica persistente no real do ser da sociedade brasileira é capaz de fazer pouco caso de uma verdadeira realidade capitalista, entre nós, isto é, aquela do capitalismo de commodities com seu novo “tipo humano” (ou máquina capitalista de guerra sociológica?) sociológico, inegavelmente, o coronel oligárquico burguês caipira urbano-rural, que domina a política legislativa do Estado nacional de Brasília. Tal sujeito em tela é o sujeito esquizo-coronel urbano-rural como atualização do sujeito virtual equilíbrio de antagonismos do livro Casa-Grande e Senzala.  

No seu Capitalismo e tradicionalismo, JSM estabeleceu a gramática em narrativa sociológica da imaginária sociedade moderna e da concreta cidade gramatical conluio do antigo com o moderno.  

                                                                                                IV

Seu segundo livro a ser gramaticalizado é O Poder do atraso. Ensaios de sociologia da história lenta.
A gramaticalização começa com a constatação da ligação de JSM com a Igreja/pensamento conservador, a Universidade de Cambridge e o estudioso do pensamento conservador e da cultura popular, bem reconhecido no Brasil, o londrino Peter Burke (Martins. 1994: 16).

JSM se vê como o Marx paulista ao ligar sociologia revolucionária com o pensamento conservador. O DIKTAK sociedade agrária brasileira é o centro tático da sociologia gramatical de JSM. Martins pensa a sociedade brasileira da história sociológica lenta tendo o discurso do político do oligarca coronel (do sertão de Euclides da Cunha ou de Guimarães Rosa) no comando, ou do Partido do poder (do sistema político), ou do Partido da ruptura. (Martins. 1994: 14).

A sociologia da história lenta conservadora deve sua ligação com o Marx do 18 do Brumário de Luís Bonaparte: “ os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. (Marx. 1974: 335).     

O uso que Marx faz do significante tradição associado a ideia da história como repetição hegeliana (drama e comédia, respectivamente) fornece caução a ideia de JSM de uma ligação de Marx com o pensamento conservador, até certo ponto.

De fato, Marx transforma o significante tradição em um fenômeno da história trágica da burguesia na Revolução francesa e cômica da revolução liberal de 1848. Obviamente, Martins optou por não ir até a ideia de revolução de Marx possuída por fantasmas do passado. Tenho certeza que JSM nada sabe sobre esta faceta excepcionalmente maravilhosa do pensamento marxista de Marx. Trata-se do uso do significante tradição em Marx fazendo pendant com a estética em Freud. Martins nada parece saber de Freud ou de estética. Não falo isto para diminuí-lo, mas para caracterizar que a sociologia londrina da cidade de São Paulo, como sua coirmã a sociologia brasileira paulista, nunca quis saber nada sobre Freud. Aliás, como exceção, sobre estética e política temos o livro de Octávio Ianni Revolução e cultura:
“Os movimentos culturais, mesmo os mais herméticos, ou cosmopolitas têm algo a ver com movimentos da sociedade, os antagonismos sociais. As contradições de grupos e classes (frequentemente mesclando grupos raciais, regionais, e culturais como campesinato, classe operária, burguesia local e burguesia estrangeira) tandem a ser o substrato histórico-social dos movimentos culturais. Em muitos casos, as expressões fantásticas, maravilhosas, carnavalizadas, grotescas e outras da arte podem ser alegorias ou metáforas dos movimentos da sociedade, da revolução; em outros, podem ser expressões da contrarrevolução”. Ianni: 128). Em Ianni, a cultura/estética do grotesco não é um fenômeno político desprezível.
                                                                                              V

Se um texto pode funcionar como sinthoma da cultura da cidade gramatical, o livro A paixão o negativo é o sintoma dos novos caminhos da ideologia gramatical paulista. Novos percursos freudianos se abrem para a pesquisa da sociologia uspiana. Safatle está seguro que a junção do marxismo lacaniano com o marxismo ocidental alemão encerra toda história de um marxismo sociológico sem Freud na cultura da cidade gramatical estética paulista. Cito apenas um trecho para mostrar a forte luz desse novo caminho:
“Freud nunca modificará a estrutura de um conceito metapsicológico ou de um processo de subjetivação analítica porque ele teria se mostrado insuficiente para aprender as produções estéticas. A despeito disso, o mesmo sistema de interpretação mobilizado na apreensão analítica do material clínico estará guiando a apreensão do material estético. Nesse sentido, Freud não reconhece nenhuma resistência específica do material estético ao esquema interpretativo da psicanálise. Esse material será submetido a uma procura arqueológica de sentido que visa desvelar a racionalidade causal do fenômeno estético ao reconstruir uma espécie de texto latente que estaria obliterado pelo trabalho do artista. Um texto no qual se pode ler os motivos psicanalíticos maiores, como o Complexo de Édipo e a teoria da sexualidade infantil. Assim, atrás do sorriso dos quadros de Leonardo, Freud descobrirá os traços dos fantasmas originários ligados à figura da mãe fálica. Atrás de Irmãos Karamazov, o psicanalista verá a revelação do conflito edípico com sua ameaça de castração vinda do pai”. (Safatle: 270).

A infância é o mundo da tradição (fantasma, mito etc.) que articula o mundo moderno do adulto no presente da produção do contemporâneo na cidade gramatical estética.

A estética do marxismo ocidental alemão tem em Freud um efeito de ancoragem clara:
“ Se Freud chega a afirmar que os escritores são aliados preciosos é porque, para ele, há dois campos de exposição fenomenal de conceitos metapsicológicos: a clínica e a análise das produções culturais (estética e teoria social) ”. (Idem: 270). Nossa única preocupação é se a psicanálise marxista ocidental de Safatle abrirá caminhos para investigações sociológicas que acabam por compor a ligação entre política e ideologia da cultura da cidade gramatical paulista do século XXI.           
                                                                        UM INTERREGNO   

No O Poder do atraso, ocorre uma estranha fusão (e confusão formal) entre os significantes patrimonialismo e oligarquismo. Longe de ser um problema teórico, trata-se de um problema da gramaticalização do Brasil imaginário por JSM. Vou tentar clarear este ponto escuro mais do que obscuro da sociologia da história lenta.

A era colonial pode ser resumida à transdialética do Estado imperial patrimonialista colonial português com a sociedade oligárquica luso-brasileira. O Estado patrimonialista colonial tem seu centro em Portugal. Em relação ao território colonizado o Estado é externo-centrado na capital lusitana.  

Com D João VI, o Estado patrimonialista estabelece uma relação de internalização no território da cidade do Rio. Podendo ser considerado como fenômeno da era moderna. A geografia humana da política da década de 1990 tomou o lugar da velha geografia política:
“a atual geografia política reconhece como essência, para entender nosso mundo moderno, uma matéria teoricamente informada que reconheça a centralidade do poder e das relações de poder para compreender nosso mundo político”. (Gregory: 65).

Aqui o sujeito gramatical poder ainda não cedeu seu lugar ao sujeito gramatical tout court da cidade gramatical falar de si próprio

As guerras para manter a soberania carioca patrimonialista com d. Pedro I sobre as outras partes do território descolonizado é uma clara prova de que o Estado nacional patrimonialista foi sendo tragado pela sociedade oligárquica agrária em quase todas as regiões políticas do território outrora lusitano. As oligarquias regionais queriam erigir seus mil Estados oligárquicos em seus municípios fazendo pendant com a rede serial do significante fazenda-latifúndio colonial.    

Casa-Grande e Senzala (1936) e Populações Meridionais do Brasil (1920) são dois livros do pensamento conservador oligárquico que fazem da cidade gramatical oligárquica o objeto privilegiado para a leitura da história do nosso país.

O livro Os donos do poder. Formação do patronato político brasileiro (1958) vê no Estado patrimonialista luso agrário a origem da história do Brasil (Faoro: 3). Com a revolução portuguesa do Mestre de Avis é criado um Estado com estamento burocrático e uma burguesia mercantil marítima que se encaminha para o estabelecimento de uma sociedade de corte citadina na capital do imperii.

Daí advém a conquista do Império dentro do continente e no caminho da Índia. O Império patrimonialista urbano marinho acaba por esbarrar nas costas de nosso litoral (Faoro: 40-45). No início do século XIX, as guerras napoleônicas provocam a fuga de toda a sociedade de corte lusitana que se estabelece no Rio com seu Estado patrimonialista imperial.

Depois, d. Pedro I comanda a independência do Brasil e o Estado modelo continua sendo o paradigma patrimonialista em uma sociedade-cidade gramatical oligárquica dividida em inúmeras geografias políticas. Indo ao que interessa, o Estado patrimonialista brasileiro nacional é um Estado territorialmente carioca, pois, todas as instituições importantes desse Estado encontravam-se na cidade do Rio.  

Como no Rio se forma uma sociedade de corte patrimonialista, morada também dos homens das oligarquias regionais atraídos naturalmente ou cooptados pela política imperial, JSM funde patrimonialismo político (relações estruturas estatais localizadas na sociedade de corte, Rio) com oligarquismo patrimonial (avesso da ideia de cidadania moderna) municipal na forma do Estado total: “E o Estado baseado em relações políticas extremamente atrasadas, como as do clientelismo e da dominação tradicional de base patrimonial, do oligarquismo”. (Martins. 1994: 12). JSM funde em uma frase as duas correntes de pensamento suprassumidas. De um lado o pensamento político oligárquico e do outro, o pensamento político patrimonialista: respectivamente, Gilberto Freyre mais Oliveira Vianna e Raymundo Faoro.

A questão principal: a ideologia gramatical ‘moderna” que invadiu a sociedade política até o século XXI é oligárquica patrimonial municipal privada (Nordeste, Minas Gerais, São Paulo, Nordeste e Centro-Oeste) ou patrimonialista política carioca? O Sul tem uma característica própria de culturas políticas (populista aristocrático estanciero) que acabou no comando da política brasileira durante quase todo o século XX, a partir de 1930 até 1964. E retorna com seu populismo burocrático fascista militar, com Médici e Geisel, na década de 1970. 
                                                            OLIGARQUISMO E PATRIMONIALISMO

Fernando Haddad é a cidade gramatical paulista como perinder ac cadaver na leitura da política da era do bolivariano? Haddad toma como elemento norteador de sua interpretação o patrimonialismo político carioca de Raymundo Faoro. E esquece o oligarquismo paulista como fez a escola clássica da sociologia da USP. E SEU ALINHAMENTO NÃO É COM A PARTE MARGINAL (JFS) DA ESCOLA PAULISTA DA USP QUE É A EXPRESSÃO LONDRINA DA POLÍTICA DA CIDADE GRAMATICAL DE SÃO PAULO.

 Lendo a contemporaneidade política com Faoro, Haddad faz a opção pelo patrimonialismo da corte carioca para explicar a era Lula e principalmente a queda de Dilma Rousseff, e consequentemente, a era do bolivariano petista. Ele vê movimento o das massas de 2013 (que se tornou no Rio o início do fim da hegemonia do bolivarianismo sobre as massas grau zero partidárias, nos principais municípios do país) como fenômeno político, principalmente da internet da cidade de São Paulo, no comando dos movimentos de junho de 2013, nacionalmente. (Haddad: 35).

Ele parece ignorar que o confronto do governador Sérgio Cabral em aliança com Dilma e a GloboNews contra o movimento de massas encontra-se na origem do colapso da carreira política de Cabral (e da crise catastrófica atual do Estado do Rio), e também, fenômeno que acabou por arrastar Dilma para a crise do impeachment - e a potente ideologia gramatical PT sobre as massas para um beco sem saída.  

O importante é que Haddad foge a linhagem dos políticos filiados a cidade gramatical paulista (Haddad: 36).
                                                                                                       VII 

A novidade no texto de JSM é fazer do Estado da república um Estado patrimonialista das oligarquias. Se antes, o rei d. João VI e o seu filho d. Pedro I definiram o Estado patrimonialista carioca como apropriação privada da riqueza pública (com d. Pedro II tal significante patrimonialista se republicaniza com a ideologia pessoal moderna gramatical do imperador), na República, o Estado brasileiro se transforma em um Estado patrimonialista oligárquico.

Ele se torna a expressão não mais da sociedade de corte carioca, e sim a expressão da sociedade oligárquica dos coronéis urbano-rural: “Pois o que de fato aconteceu com a Independência e também com a República, foi a preservação de um certo absolutismo que o Exército representa; uma certa verticalização do poder, com base, porém, no poder paralelo e local das oligarquias, dos potentados. As oligarquias asseguram a estabilidade do poder. São, na verdade, os magistrados do processo político, como se viu na eleição de Tancredo Neves como primeiro presidente após a extinção do regime militar, e se vê agora, com extraordinária clareza, com os acordos políticos que definem os rumos da eleição presidencial de 1994”. (Martins: 28).

JSM poderia ter dito que José Sarney foi um presidente (que assumiu no lugar de Tancredo morto antes de tomar posse) do patrimonialista oligárquico municipalista. Uma personificação da cidade gramatical liberal pombalina de São Luís do Maranhão, o vice da chapa de Tancredo Neves, Sarney foi levado a tomar posse da presidência da República pelas mãos do absolutismo militar, como testemunhou FHC.      

Faoro mostra que d. Pedro I significa a aparência da semblância de uma sociedade de corte carioca liberal pombalista em junção com o real absolutismo europeu. (Faoro. 1994: 78-83). Fernando Haddad usa Faoro sem entender todas as implicações de uma interpretação da produção do contemporâneo a Raymundo Faoro. Aliás, seu texto é um balanço muito competente, e definitivo, do intelectual bolivariano sobre a era do bolivariano.

Para finalizar esta parte cito um resumo primoroso da sociologia lenta, mas que sempre acerta o alvo virtual de JSM:
“De fato, as indicações sugerem que o clientelismo político sempre foi e é, antes de tudo, preferencialmente uma relação de troca de favores políticos por benefícios econômicos, não importa em que escala. Portanto, é essencialmente uma relação entre os poderosos e os ricos e não principalmente uma relação entre os ricos e os pobres. Muito antes de que os pobres pudessem votar e, portanto, negociar o preço do voto, já o Estado tinha com os ricos, isto é, os senhores de terra e escravos, uma relação de troca de favores, como espero ter demonstrado acima: a Coroa portuguesa, por pobreza ou avareza, recorria ao patrimônio dos particulares para a realização dos serviços públicos, pagando, em troca, como o poder local e honrarias, isto é, com nada. Esse nada, porém, tinha a virtude real ou potencial de poder ser convertido em riqueza, terras e dinheiro”. (Martins. 1994:29-30).        

Indo em frente, ao contrário do modernismo moderno, o modernismo brasileiro é um moderno com tradição absolutista, ou melhor, o liberalismo pombalino em junção com o absolutismo real monárquico. E ainda, um moderno pombalista absolutista com patrimonialismo oligárquico do poder local municipalista da fazenda de cana-de-açúcar ou café. Portanto, o poder brasileiro é duplamente patrimonialista urbano-rural.        

Hoje nosso Congresso é a expressão do enunciado supracitado, pois, se trata de um Congresso do patrimonialismo oligárquico municipalista com aparência de semblância absolutista pombalino. De fato, o Congresso é um efeito do modo de produção oligárquico patrimonialista do coronel urbano-rural municipal cum semblância liberal absolutista. A gramática do território da trans-subjetividade desse Congresso é territorialmente o município oligárquico subjetivamente/objetivamente patrimonial acrescido do coronel oriundo de família liberal, média ou alta, da burocracia estatal pombalina:
“Certamente é essa disseminada prática que associa patrimônio e poder a principal responsável pela difusão e contínua renovação do que se pode ser chamado de cultura de apropriação do público pelo privado”. (Martins. 1994: 38).

Mas o pior ainda está por vir, pois a gramática da sociedade política JSM é assim:
“Minha concepção é a de que o oligarquismo brasileiro se apóia em algo mais amplo do que esse relacionamento – ele se apoia na instituição da representação política como uma espécie de gargalo na relação entre a sociedade e o Estado. Não só os pobres, mas todos os que, de algum modo, dependem do Estado, são induzidos a uma relação de troca de favores com os políticos”. (Martins. 1994: 29).

Tal enunciado incluiria as grandes instituições culturais públicas (universidades pública e privada, grandes editoras e jornais de papel, canais de televisão e de rádios etc.) nessa relação de troca de favores, por exemplo.

Até esta parte de meu texto já deu para perceber que JSM tem uma percepção gramatical sensível do Brasil para inglês ler o nosso país, seriamente. Há muito de verdadeiro na gramática de Martins (que abraçou inúmeros relevos da nossa realidade como o fenômeno camponês, que o limite desse texto digitalis me impede de gramaticalizar. Infelizmente JSM não viu ainda a associação entre oligarquismo brasileiro e KRIMINOSTAT internacional. Ele é um autor sem medo de gramaticalizar os fenômenos políticos nacionais fazendo pendant com o mundo internacional.

                                                                                                VIII

Finalizo como o excepciona livro, de tirar o fôlego, Linchamentos. Trata-se de um livro que deve ser lido com a ótica do fenômeno o estranho de Freud?

Para Jacques Alain Miller, Foucault partiu da ideologia gramatical freudiana para erguer o método arqueologia. Neste, a psicanálise freudiana significava falar de sexo e se dissolvia no discurso do político de Foucault entre 1966-1967. (Balbier: 67).

Em 1988, Jacques Alain Miller desconhecia o pequeno texto de 1980, de Foucault, Lacan, le ˂libérateur> de la psyhanalyse (1980). Neste curtíssimo texto, Foucault diz que Lacan salvou a psicanálise da ideologia freudiana ao pôr no lugar do objeto sexo o objeto sujeito, liberado do sujeito livre-arbítrio da filosofia e do sujeito determinado por condições sociais da sociologia:
Nous découvrions qu’il fallait chercher à libérer tout ce qui cache derrière l’emploi apparemment simple du pronom ˂je>. Le sujet: une chose complexe, fragile, dont il est si difficile de parler, et sans laquelle nous ne pouvons pas parler”. (Foucault: 205).

Nos últimos tomos do História da sexualidade, Foucault substitui o falar de sexo pelo falar de si já sob a articulação da hegemonia da cultura europeia lacaniana. Como Miller não leu o texto de Foucault de 1980, ele crê que Foucault é, inconscientemente, influenciado por Lacan, sem reconhecer Lacan como o intelectual hegemônico na conjuntura cultural em tela. Miller então traz a luz da cultura que: La introducción de El uso de los praceres representa sin duda la ampliación de la investigación más allá de la sexualidad en el sujeto para abarcar la constituición del sí-memso como sujeito”. (Balbier: 70).

Sem saber que Foucault já declarara (em 1980) sua queda na articulação da hegemonia da cultura europeia sob o comando de Lacan, Miller diz:
Ocurre como si ese rasgo pertinente, ‘hablar del sexo’, hubiera resultado demasiado débil para sostener la arqueología proyectada y que se hubiera necesitado agregar otro rasgo que progresivamente se superponía cada vez más al primero; ese rasgo seria ‘hablar de sí mesmo’. El término ‘poder’, partiendo del cual el objeto sexualidad está problematizado en el tomo I, cede el primer lugar en los tomos siguientes ao término del sujeto”. (Balbier: 70).

Do meu ponto de vista, fazendo pendant com o domínio do sujeito na cultura europeia, outra questão é tão importante quanto esta, que Foucault descobre no hermetismo lacaniano:
- Je pense que l’hermétisme de Lacan est dû au fait qu’il voulait que le lecture de ses textes ne soit pas simplesmente une ˂ prise de conscience> de ses idées. Il voulait que le lecteur se découvre lui-même, comme sujet de désir, à travers cette lecture”. (Foucault: 205).   

A via para o texto de Lacan é a gramaticalização do inconsciente do discurso do político Lacan usando a plurivocidade de caminho do ler a escritura do inconsciente lalangue para a metabolização do discurso no território da trans-subjetividade territorial do sujeito gramatical: interpretação/leitura,compreensão/explicação,subjetivação/metabolização.  

Lacan diz: L’inconscient est ce que lit. (Lacan. S. 20: 29). Não se trata de tomar consciência da realidade via luta ideológica de classes, e sim de gramaticalizar o inconsciente na escritura topológica do discurso do político do Lacan ou, então, de qualquer outro discurso do político do sujeito gramatical x, y ou z.

Desejo fazer a gramaticalização do discurso Linchamento pelo texto de Freud O estranho. Este texto é parte do dispositivo freudiano falar de sexo, ou melhor, ele compõe a ideologia gramatical freudismo que se tornou soberana na cultura de massa americana no pós-II Guerra?    

O estranho é falar de sexo ou falar de si mesmo? Não se trata de uma gramaticalização que Freud inicia da cultura ocidental como falar de si mesmo, falar do sujeito, e não falar do poder?  Para usar o texto O estranho tenho que me debater com a questão do sujeito nas ciências gramaticais da política.  
                                                                      DO SUJEITO MODERNO ENFIM

Iniciando pela sociologia temos tradição, modernidade e sujeito. Pode a modernidade ser prosaicamente idêntica à racionalização, ou então, mais poeticamente, ao desencantamento do mundo? (Touraine: 213).

Cascardi diz que o desencantamento do mundo é um significante imputado a Max Weber que viu o eclipse das crenças mágicas e animistas relativas à natureza se inscrever em um processo mais geral de ˂racionalização> que será visto como o traço determinante da modernidade no Ocidente (Cascardi: 21). No Ocidente se desenvolve um tecido de práticas e de crenças fundadas sobre a acessibilidade a priori da natureza ao cálculo racional e da autoridade da razão fazendo pendant com o processo de secularização intensificado por uma ação racional relativa a um fim (Zweckrationel).

Weber considera que o racionalismo ocidental se caracteriza pela emergência do Estado moderno e é ligado aos critérios da ciência do direito, administrada por juristas profissionais conforme aos princípios do direito natural racional. (Cascardi: 22). Aí há de eclodir o sujeito gramatical do inconsciente do discurso do político do juiz, se o sujeito é um efeito do significante, ou seja, do discurso:
“O que enuncio do próprio sujeito como sendo efeito do discurso torna absolutamente impossível que o meu se faça um sistema”. (Lacan. S. 16: 47). Aliás, o sujeito lacaniano não se transforma em instituição (Estado lacaniano) ou sujeito sociológico modernidade.  Mas tem mais ainda:
“Mais de uma coisa no mundo é passível do efeito do significante. Tudo o que está no mundo se torna fato, propriamente, quando com ele se articula o significante. Nunca, jamais surge sujeito algum até que o fato seja dito. Temos que trabalhar estas duas fronteiras”. (Lacan. S. 16: 65).

O sujeito faz pendant com a verdade, porém, o sujeito não diz a verdade, ele a suporta como verdadeiro. Aqui Lacan bebe com sofreguidão em Lenin:
“O que justifica essa regra é que, precisamente, a verdade não é dita por um sujeito, mas suportada”. (Idem: 67).

Em qualquer discurso a aparência da semblância é inevitável. Como o sujeito poderia dizer a verdade então? O sujeito só pode suportá-la. Mas qual sujeito? A posição lógico-positivista crê que a epistemologia do discurso científico sustenta o sujeito moderno que diz a verdade. A verdade verdadeira é a guinada freudiana que faz pendant com Lenine e sua teoria do sujeito revolucionário: as massas que suportam a verdade verdadeira de Lenin.

Lacan diz gongoricamente:
“Se a experiência analítica se acha implicada, por receber seus títulos de nobreza do mito freudiano (e da experiência leninista da revolução russa 1917), é justamente por preservar a contundência da enunciação do oráculo e, eu diria ainda, porque a interpretação permanece sempre nesse mesmo nível. Ela só é verdadeira por suas consequências, tal como o oráculo. A interpretação não é submetida à prova de uma verdade que se decida por sim ou não, mas desencadeia a verdade como tal. Só é verdadeira na medida em que é verdadeiramente seguida”. (Lacan. S. 18: 13).

Só é verdadeira se é seguida verdadeiramente pelas massas. A verdade verdadeira tem seu lugar na cultura da política, pois, ela é um saber que as massas seguem, como as massas russas seguiram Lenine em Outubro de 1917 na tomada do poder do czarismo.

O sujeito é o fato do dito leninista como efeito do significante revolução de Outubro. O sujeito é aquilo que suporta a revolução leninista como a verdade verdadeiramente a ser seguida. Trata-se das massas russas gramaticalizadas como leninista como defende a tese central da gramática historial do livro de Trotsky A história da Revolução russa? E Lukács defende a mesma ideia de gramaticalização das massas no seu Lénine (Lukács: 51)?   

As massas racionalmente gramaticalizadas como leninista sustentam a modernidade no país mais subjugado pela tradição feudal [tzarista] na Europa. Esperava-se uma ruptura radical com a tradição czarista como está esboçado no livro O Estado e a revolução. Mas os escritos de Lenin do período revolucionário logo após a tomada do poder mostram que a tradição permanece levando sua luta pela sobrevida na era da revolução socialista na URSS. Este problema moderno versus tradição atravessa toda a história da revolução russa mesmo depois de Stalin considerar que o campesinato era o último elo da tradição russa a ser destruída pelo sujeito moderno racional revolucionário.

Com Lacan não é preciso ir explorar, apenas, a estética marxista ocidental para encontrar o sujeito, pois, ele se encontra na política tout court da cultura revolucionária. Talvez, um ensaio mais teórico sobre o tema do sujeito e de seu eclipse se faça urgente. Mas o sujeito gramatical O estranho de Freud nos leva para o nosso caminho onde encontra-se atravessado o inconsciente do discurso Linchamentos.

                                                                                      X

O que significa O estranho? Antes preciso usar o material historiográfico para falar das massas como sujeito gramaticalizado leninista.

A Insurreição de Fevereiro é a revolução das massas contra a monarquia tzarista. Este acontecimento desloca o sujeito da esfera da política estatal tzarista e da sociedade civil burguesa-aristocrática para a fábrica, o quartel, a casa popular, a rua, enfim para as massas (Trotsky: 15). A objeção que se faz ao História da revolução russa é que ele é modelado pela filosofia da consciência:
“O processus político essencial de uma revolução está precisamente no fato de que a classe toma consciência dos problemas apresentados pela crise social e de que, ainda, as massas se orienta, ativamente, segundo o método de aproximações sucessivas”. (Trotsky: 16). Este é o esquema antigo no qual as massas se radicalizam se deixando conduzir pelo partido mais à esquerda até que não tendo mais nenhum partido mais extremista, a revolução se transforma em contrarrevolução.

Trotsky diz que há um outro esquema em ação:
“É somente através do estudo do processus político nas massas que se pode compreender o papel dos partidos e dos líderes que não temos a menor intenção de ignorar”. (Idem: 16). Esse processus políticos nas massas significa uma complexa gramaticalização (no lugar da tomada de consciência) que Trotsky descreve nas várias pagina do Capítulo VIII. Quem dirigiu a Insurreição de Fevereiro. A gramaticalização aparece como um choque das condições sociais objetivas (objetivismo) no estado de subjetivação normal das massas. Tal choque ensaia a gramaticalização séria das ideias leninistas pela multidão. A propaganda do leninismo inventada na revolução joga um papel essencial na gramaticalização da revolução pela multidão; porém não se deve esquecer o trabalho molecular dos revolucionários em seus veículos de propagação da ideologia gramatical revolucionária russa. (Idem: 141, 140, 142).

A conclusão do Capítulo VIII é clara e distintamente favorável a Lenin, pois, as massas falam de si próprias em linguagem do leninismo:
“A questão acima apresentada: Quem dirigiu a Revolução de Fevereiro? podemos, por conseguinte, responder com a clareza desejável: os operários conscientes e bem temperados e sobretudo os que se formaram na escola do partido de Lenine. Devemos acrescentar, porém, que esta liderança suficiente para assegurar a vitória da insurreição não estava em condições logo no início, de colocar a direção do movimento revolucionário entre as mãos da vanguarda revolucionária”. (Idem: 143). A subjetivação gramatical metabolizante das ideias leninistas da revolução pelas massas só estaria completa em outubro de 1917.     

Qual a relação do texto em tela com o livro Linchamentos? Linchamento significa a ação de uma multidão! JSM fala de uma multidão que usa uma violência sem limite beirando a legitimidade como é o caso da violência das massas gramaticalizadas via leninismo?

Sobre a legitimidade da violência revolucionária, Hegel é imperativo, dentro da filosofia dialética da consciência:
“Conforme o primeiro lado, a independência só confere ao encontrado a forma da individualidade consciente em geral, e, no que respeita ao conteúdo, permanece no interior da efetividade universal encontrada. Mas, conforme o outro lado, a independência confere a essa efetividade ao menos uma modificação peculiar, que não contradiz seu conteúdo essencial, ou seja, uma modificação pela qual o indivíduo, como efetividade especial e como conteúdo peculiar, se opõe àquela efetividade universal. Essa oposição vem a tornar-se crime quando o indivíduo suprassume essa efetividade de uma maneira apenas singular; ou vem a tornar-se um outro mundo – outro direito, outra lei e outros costumes, produzidos em lugar dos presentes – quando o indivíduo o faz de maneira universal e, portanto, para todos”. (Hegel: 194).

A gramaticalização das massas é o tornar-se o outro mundo leninista (na Rússia), o   mundo do estranho (para o mundo oficial e Ancien Régime) universal hegeliano revolucionário com outro direito, outra lei e outros modos de vida. Êxito! No entanto até quando o sujeito gramatical universal hegeliano será julgado como vitorioso, familiarmente estranho?  Será o problema do sujeito gramatical em uma conjuntura gramatical de uma época historial do saber do grotesco?

A multidão do linchamento é o sujeito gramatical estranho a sua época? Por isso, ele aparece como um ato de violência sem legitimidade?

O estranho em Freud se define como sujeito gramatical do inconsciente do discurso do político Freud. Ele começa testando sua hipótese no conto O homem de areia, de T. H. Hoffmann, um maître da estética do romantismo grotesco. O importante é que a infância pode existir como fonte do sentimento de estranheza no adulto através do complexo de castração ou complexo de Édipo. Freud recorreu à estética do trágico, mas a pesquisa sobre o grotesco põe e repõe Hoffmann na estética do grotesco (Kayser: 68-73). E não há algo de excessivamente grotesco (até no baixo sentido de dicionários) na castração antes dela eclodir como um fenômeno trágico clássico da antiguidade grega, no Complexo de Édipo?

Esclarecido o espaço estético do O estranho, acrescento que se trata de narrativa romântica moderna e por isso Freud começa pelos contos de Hoffmann o aproximando, gramaticalmente, de Shakespeare (Freud: 288). Trata-se do drama grotesco que liga Shakespeare ao romantismo alemão? na minha narrativa, o essencial é que a narrativa do conto O homem de Areia tem ligação com motivos da infância do autor Hoffmann (Freud: 290-291. Nota 1). O objeto narrativo do estranho se liga à infância do autor. O grotesco tem uma ligação umbilical com a primitiva infância agindo no mundo adulto. A infância é da ordem da tradição, do irracional, não do moderno, do racional. Esta última ordem dos fenômenos (racional, razão, moderno, modernidade, modernização) pertenceria ao mundo adulto.

Freud rompe com o modernismo ao dizer que a tradição (infância = com domínio do irracional, do fantástico, mundo do fantasma da castração, do mundo do sinistro, da estética do grotesco etc.) articula-se ao presente da modernidade. A imagem da modernidade já teve uma força de realidade que não parava de se inscrever no simbólico como uma força superior:
“Durante muito tempo a modernidade foi apenas definida pela eficácia da racionalidade instrumental, a dona do mundo que se tornou possível pela ciência e a técnica. Esta visão racionalista não deve ser rejeitada de forma alguma, porque ela é a arma crítica mais poderosa contra todos os holismos, todos os totalitarismos e todos os integrismos. Mas ela não dá uma ideia completa da modernidade; esconde a metade: a emergência do sujeito humano como liberdade e criação”. (Touraine: 218).

Nesse meu texto começo lidando com a multidão do linchamento como sujeito humano e criação. Como multidão de linchamento poética do pogrom russo de Puchkin:
                                                           “Somos covardes e pérfidos,
                                                             Imprudentes, maus e ingratos,
                                                             Frios eunucos pelo coração,             
                                                             Caluniadores, idiotas, escravos.
                                                             Em nós formigam os vícios. (Plekanov: 73).

                                                                                               XI

A multidão em narrativa sociológica uspiana de linchamentos de JSM nada tem a ver com a estética de Puchkin? Ela tem a ver com a infância da cidade gramatical de São Paulo? Tem ligação com a infância do autor sociólogo?  São Caetano do Sul é um município brasileiro do estado de São Paulo, na mesorregião Metropolitana de São Paulo e microrregião de São Paulo, onde nasceu JSM. Desejos e crenças da infância de Martins habitam a narrativa da sociologia da cidade gramatical de JSM? que significa a narrativa do discurso do político do grotesco do sociólogo?

O grotesco estético põe o saber de frente com o conhecimento da produção do contemporâneo como novidade. O grotesco é a novidade com la collusion de l’ancien et du nouveau (Rosen: 153).
  Colusão
Substantivo, feminino. JUR
concerto entre partes para enganar e prejudicar terceiros; conluio.
dolo das partes que litigam, simuladamente ou não, com o fim de enganar o juiz ou em prejuízo de terceiros.

O grotesco é o sujeito gramatical colusão do antigo com o novo, partes que que se confrontam (durante a era do pós-modernismo, simuladamente, a fim de enganar, derrotar, o grande juiz ocidental: a modernidade supracitada. Talvez o pós-modernismo quisesse derrotar o sujeito gramatical burguês modernista e o significante capitalismo moderno. (Touraine: 216). E ainda derrotar a modernidade como desencantamento do mundo (Touraine: 217), recantando-o com o conluio da subjetivação da tradição (antigo) com o moderno (novo).

O conluio põe e repõe o problema da inovação do saber grotesco como pensamento da ordem ou da desordem (Rosen; 160) da plurivocidade do discurso do mundo capitalista. JSM faz a sociologia do comportamento coletivo linchamento em conflito com o pressuposto moderno da razão que: “resulta de decisão repentina, impensada, de motivação súbita e, de modo geral, imprevisível. Mesmo que os dados até aqui reunidos nesta pesquisa mostrem claramente que há uma estrutura social estável por trás de sua ocorrência, que é a dos grupos de família e de vizinhança fortemente dominados por sentimentos familísticos e de comunidade. Sendo legalmente modalidades de delito, os participantes dessas manifestações prontamente se recolhem ao anonimato” (Martins. 2015: 22).

O justiçamento e uma modalidade de violência coletiva. Trata-se de uma violência coletiva humana? A sociologia parece escolher a opção de Puchkin de que, entre nós brasileiros, se trata de uma multidão humana, demasiadamente humana? JSM diz:
“Se nos Estados Unidos há claramente um caráter pedagógico na prática do linchamento uma tentativa de impor valores e limites de conduta, no caso brasileiro isto não está claro. Os linchamentos que aqui ocorrem, pela forma que assumem e pelo caráter ritual que frequentemente têm, são claramente punitivos, não raro situados no que poderia chamar de lógica da vingança e da expiação” (Martins: 26).

O sentimento de estranhamento do autor aparece no momento no qual (como na gramaticalização freudiana do conto O homem de Areia) a multidão pedagógica americana ou lógica brasileira é a tradição que não se sabe se é humano ou máquina (autômato-máquina no Hoffmann de Freud), se é do mundo vivo ou inanimado.

O linchamento cria a atmosfera narrativa (Freud. 2015: 286, 290-291) no cotidiano do mundo-da-vida na qual o efeito de estranhamento se dá pelo autor (e também o leitor) não saber se a multidão é humana ou uma máquina de guerra freudiana (que usa da violência real sem limite sobre a vítima) lumpesinal criminosa. Porém esta é a discussão de JSM. Como estou gramaticalizando o inconsciente do discurso do político do sociólogo JSM, tal problema em tela não está na superfície manifesta do texto sociológico.

O medo infantil do leitor não leva ao sentimento e estranheza do texto sociológico, e sim o desejo e a crença do objeto ou ser da ordem do vivo (multidão humana) ou do morto (máquina de guerra freudiana lumpesinal criminal). No âmbito da cultura da cidade gramatical, a televisão está no lugar da criança. O texto eletrônico virtual tem esse desejo e essa crença ambivalente de que ora se trata de um objeto vivo, ora se trata de um objeto morto. Ela pede para JSM tratar desse assunto na tela eletrônica, mas tal sujeito gramatical faz parte do inconsciente do discurso JSM. Então, ficam todos frustrados!

Para JSM a questão tática é: por que a população lincha? 
a hipótese mais provável é a de que a população lincha para punir, mas sobretudo para indicar seu desacordo com alternativas de mudança social que violam concepções, valores e normas de condutas tradicionais relativas a uma certa concepção do humano”. (Martins. 2015: 27). JSM põe e repõe no lado direito o humano e, no inconsciente do discurso sociológico da cidade gramatical se é ou não é máquina de guerra.

JSM diz:
“A vingança é uma forma de exclusão e de rejeição dos indesejáveis e do que eles representam enquanto agentes de uma concepção de sociedade que contraria a dominante e contraria direitos dos por eles vitimados. Uma hipótese decorrente é a de que o linchamento é uma forma incipiente de participação democrática na construção (ou reconstrução) da sociedade, de proclamação e afirmação de valores sociais. Incipiente e contraditória porque afirma a soberania do povo, mas nega a racionalidade impessoal da justiça e do direito.

O linchamento não é uma manifestação de desordem, mas de questionamento da desordem. Ao mesmo tempo, é questionamento do poder e das instituições que, justamente, em nome da impessoalidade da lei, deveriam assegurar a manutenção dos valores e códigos”. (Martins. 2015: 27).
A multidão sociológica do linchamento deixa de ser aquela multidão humana de Puchkin e se torna a multidão-máquina de guerra freudiana lumpesinal - saída de qualquer classe social urbana, pois lumpesinal (Marx: 372) – que como observa Rosen é a inovação de uma máquina de guerra grotesca, eu acrescento freudiana, participante da ideia prática, real, de uma ordem virtual (Rosen: 160). 

O linchamento é a justiça de rua associada a constituição do urbano na periferia de cidades como São Paulo, Rio e Salvador de uma população dividida entre “a desmoralização completa e a desesperada necessidade de afirmação dos valores tradicionais da família e da vizinhança: É nesse âmbito que a ameaça de desagregação social se torna mais visível e mais provável. É nele, também, que ganham visibilidade os prováveis agentes concretos da ruptura, do perigo e da alternativa próxima e ameaçadora que é a de vítima permanente da delinquência ou, mesmo, a de delinquente”. (Martins. 2015: 28).

Ainda nos encontramos no âmbito do humano no trecho supracitado. Porém, se o estado de guerra molecular, e de guerra grupal, das máquinas de guerra urbanas lumpesinais criminais trazem a desordem, o linchamento – como luta do humano contra o humano – deixa de possuir efeito de realidade. Daí que no estágio da crise da cidade gramatical atual a multidão do linchamento humana desaparece da paisagem da polis.

No entanto, ela pode retornar como multidão do significante máquina? A multidão do linchamento pode retornar como multidão-máquina de guerra lumpesinal do significante CRIMINOSTAT em luta (e fazendo a guerra civil) contra a desordem do significante democracia liberal 1988?

Para finalizar (pois a complexidade da sociologia do linchamento de JSM só pode ser gramaticalizada em forma de livro), o espaço urbano do linchamento seria uma expressão da modernidade da cidade gramatical. Daí a máquina de guerra grotesca linchamento introduzir o conluio do antigo com o moderno (já supracitado) para destruir a ideia e a imagem de modernidade da cidade gramatical:
“Os crimes destes dias no Rio de Janeiro contiveram um episódio horrendo, a cabeça de um homem atirada dentro de um quartel da polícia, tudo indica para dizer ao comandante quem é que comanda. O massacre que veio depois não difere em conteúdo da brutalidade. Como não diferem os linchamentos, praticados periodicamente em todo o Brasil, com maior concentração em Salvador, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Curiosamente, as áreas metropolitanas dessas e de outras cidades, supostos espaços de modernidade, são justamente os lugares dessas formas primitivas de justiça, as do justiçamento e da vingança. Pagam os inocentes. Nossa modernidade não é moderna, é apenas uma caricatura do moderno”. (Martins. 2015: 130).

Há uma clara revolta movida pelo desejo infantil e crença de JSM de que sua cidade gramatical natal era um lugar da modernidade que fez dele um adulto moderno? Um adulto que descobre não ser moderno através da sociologia do sujeito gramatical multidão de linchamento da cidade gramatical da periferia lacaniana R.S.I. (Real/Simbólico/Imaginário). A periferia real linchamento invade a subjetivação sociológica de JSM. O objeto significante não é a nação capitalista tradicional, e sim a cidade gramatical periferia lacaniana de uma caricatura grotesca de modernidade da máquina weberiana gramatical (glorificada e adorada pelos paulistas) - razão instrumental fazendo pendant com o sujeito livre e criador da cidade gramatical da teoria da beleza, de que fala Freud. (Freud: 275).

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MARTINS, José de Souza. Capitalismo e tradicionalismo. SP: Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1975    
-------------------------------  O poder do atraso. Ensaios de sociologia da história lenta. SP: Hucitec. 1994
-------------------------------  Linchamentos. A justiça popular no Brasil. SP: Contexto, 1995
PLEKANOV, G. A arte e a vida social. RJ: Editora LUX, 1955
ROSEN, Elisheva. Sur le grotesque. L’ancien et le nouveau dans la réflexion esthétique. Paris: PUV, 1991
SAFATLE, Wladimir. A paixão do negativo. Lacan e a dialética. SP: Editora Unesp, 2006
TORAINE, Alain. Crítica da modernidade. Petrópolis: VOZES, 1994             
TROTSKY, Leon. A história da revolução russa. 1°Volume. A queda do tzarismo. RJ: Paz e Terra, 1978


OUTROS
HADDAD, Fernando. Revista Piauí. 129. Junho. A falsa república.   

  


                                          
     
                        

          
              
                  
        
    


     
       

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