segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

MOROLOGUS -máquina de comunicação de massa


José Paulo

OS mass media são uma máquina de comunicação morologus. Máquina de comunicação de dizer tolices, extravagancias, disparates, besteiras para a audiência. O morologus é o princípio de funcionamento da gramática da comunicação mass media.

O disparate de Goya se tornou o signo irrevogável no mundo da cultura ocidental com a soberania dos mass media do americanismo no mundo-da-vida. Sobre o americanismo, Heidegger é revelação na tradução brasileira:
“A maquinação é o acabamento incondicionado do ser enquanto vontade de poder.  Mas mesmo a maquinação enquanto essência do ser tem ainda uma inessência.
A inessência da maquinação exige uma humanidade que não desertifique toda tradição, mas propague para além da desertificação, isto é, para o interior de sua inessência, justamente uma tradição desertificada da metafísica (e, isto é, da história ocidental), essencialmente sem raízes. Esta instauração da inessência da maquinação está reservada ao americanismo.
Mais tenebroso do que toda e qualquer selvageria asiática é esta ‘moralidade’ desenraizada e alastrada até o engodo incondicionado.
Somente aqui o abandono do ser alcança a condição extrema de uma constância.
Será que reconhecemos suficientemente que tudo o que há de tenebroso reside no americanismo e de modo algum no mundo russo? (Heidegger. 2000: 156-157).  

O que é o americanismo senão um ersatz de ser social como sociedade de comunicação de massa.  Esta é o fim da história econômica da metafísica como organização da cultura do mundo ocidental. A máquina morologus de comunicação é um bandade Moebius. No lado direito o morologus, no avesso a teologia da comunicação de massa.
                                                                        II
O fim da era econômica da metafísica significa o início da era teológica heideggeriana. No livro “A ideologia alemã”, Marx diz que a era da metafísica é a era das ideologias filosóficas. Então, temos o fim da era das ideologias substituída pela era das teologias. Em Lacan, o livro “O Capital” é visto como o evangelho secular revolucionário da classe operária (Lacan. S.20:32). A teologia de Marx é o falar do capital fazendo pendant com o falar da revolução social como texto utópico. No entanto, me interessa a teologia heideggeriana dos massa media.
 Heidegger fala da teologia do americanismo:
“A teologia tornar-se diabologia que não se restringe certamente ao inofensivo do ‘diabo’ enquanto um anjo decaído, mas introduz e solta pela primeira vez a inessência  incondicionada de Deus na verdade do ente.  O desdobramento expressivo das diabologias é ainda iminente”.  (Heidegger. 2000: 160).

A teologia de Heidegger é falar de um  diabo que pode ser uma coisa análoga ao diabo do romantismo alemão:
“MEFISTÓFELES
                                                          Sou parcela do Além
Força que cria o mal e também faz o bem! (Goethe: 59).

A sociedade de comunicação de massa é Força que cria o mal?
A teologia fazendo pendant com a metafísica ocidental é a criação do falar do mal pela sociedade de comunicação de massa. O discurso dos massa media é o falar ficionalizado do mal da sociedade. Os mass media são a Força diabólica que criam o mal ao ficcionalizarem as misérias das nações e da Terra. Usa-se vulgariza-se e banaliza-se informação científica para ficcionalizar o mal que aflige os seres humanos. Por exemplo, a sociedade capitalista industrial asiática é um mal mundial, pois gera a poluição que se traduz por catástrofe climática. A fome e as doenças endêmicas na África são um mal a ser remediados pelos países civilizados do Ocidente. No Brasil, a violência urbana é um mal indeterminado que se traduz na ficcionalização do mundo como rua colonial ameaçadora e delegacia de polícia. Nos EUA, o terrorismo é o mal ficcionalizado pelo americanismo fazendo parelha com o serial killer americano.  Na Europa, o mal é as massas que se revoltam organizadas pelo WhatsApp contra estado de exceção econômico do Banco de Macron.  

 Faz o bem?
Os mass media fazem o bem ao organizarem a cultura nacional, como no Brasil. Porém, trata-se de um bem diabólico. A organização da cultura serve à gramática de dominação econômica do Banco que levará o país rumo a um apocalipse econômico.  

Um outro aspecto é a teologia do sentido:
“Alors que l’intelligence décompose le sens, le myte le compose.  C’est pourquoi il ne saurait être compris d’après une supposée valeur explicative: le mythe n’est pas une science des primitifs mais un moyen de compréhension immédiate du réel. L’opposé du symbolique, c’est, proprement, le dia-bolique”. “(Godin:732).

A força de lei dos mass media se deve a atividade de compreensão imediata do real como teologia do mal em imagens mitológicas eletrônicas. Trata-se, portanto, de pensar os mass media como ersatz do mito. O dia-bolique se encontra na oposição entre o simbólico e o saber mitológico. Qual mito?
 O simbólico nos remete para a logos de uma época em oposição ao discurso mitológico:
“Car le langage n’appartient pas exclusivement au domaine du mythe; dès le départ, une autre force est agissante en lui, la force du logos”. (Cassirer:120).

A teologia da leitura de Heidegger pela psicanálise em gramática econômica da sociedade de comunicação de massa pensa a linguagem dos mass media em uma unidade concreta com o mito. Tal fato é correlato ao início da linguagem e arte:
“Comme le langage, l’art, dans ses débuts, se révèle étroitement mêlé au mythe. Mythe, langage, et art forment d’abor une unnité concrète encore indivise, qui ne se déploie que progressivement en une tríade de modes de figuration spirituels et indépendants”. (Cassirer: 120-121).
A teologia da imagem eletrônica é o início de uma era na qual a linguagem aparece em um todo concreto indivisível com o mito e a estética:
“Cari l n’y a pas ici des désignations simplement <abstraites>; chaque mot se transforme immédiatement en une figure mythique concrète, en dieu ou en démon”. (Cassirer: 119).

A sociedade de comunicação de massa secreta uma linguagem religiosa secular.

A linguagem da sociedade de comunicação de massa funciona através de uma teologia de imagens figurativas em uma ação ersatz do dia-bolique no lado direito; no lado avesso, ela se constitui pela “matematização galilaica” (Husserl: 16) da cultura informacinalis como ersatz de metafísica:
“A ‘matemática’ só se torna decisiva para a metafísica com a mudança da veritas para a certitudo. A matemática não é contudo aí apenas um modelo de conhecimento ‘maximamente rigoroso’. Ao contrário, o elemento matemático – o estar-certo -caracteriza o modo fundamental do ser enquanto a re-presentacionalidade”. (Heidegger: 160).  

A compreensão imediata do real como o estar-certo da matematização da cultura dota os mass media de uma força violenta, injusta, sem regra, arbitrária. A gramática dos mass media contém seu WhatsApp, ou seja, a força sem regra, arbitrária da comunicação (Derrida. 1994: 20). E mais ainda:
“il s’agit toujours du rapport entre la force et la forme, entre la force et la signification; il s’agit toujours de force <performative>,  force illocutionnaire ou perlocuttionaire, de force persuasive et de rhétorique, d’affirmation de signature, mais aussi et surtout de toutes les situations paradoxales où la plus grande force et la plus grande faiblesse s’échangent étrangement”. (Derrida. 1994: 20-21).  

A estatística usada nos mass media é uma invasão do real como certitudo ou estar-certo que caracteriza o modo de funcionamento do ser da sociedade de comunicação de massa como re-presentacionalidade. No domínio da subjetividade, os mass media trabalham com a certitudo articulando a verdade como vontade de poder:
“Na mudança essencial da verdade enquanto veritas para a verdade enquanto certitudo está prelineado o ser enquanto re-presentacionalidade do re-presentra-se, na qual a essência da subjetividade desdobra-se. O nome mais simples para a determinação da entidade do ente que aqui vai se preparando é a ‘vontade’: vontade enquanto querer-se”. (Heidegger: 162).  

Os mass media trabalham a subjetividade da audiência como vontade de poder (vontade como querer-se):
“Logo que o ser se abre porém como vontade sob o modo de vontade de poder, o ser-si-mesmo da subjetividade na qual a vontade quer a si mesma mostra-se como a constante legitimação do poder comandar enquanto a maneira decisiva do querer-para-além-de-si (a extensão do poder)”. (Heidegger: 163-164).

A audiência não é inocente ou passiva. Ela é a subjetividade (sujeito sgrammaticatura) como vontade de poder legítima de comandar o real da realidade dos fatos da política e do Estado de polícia. Dou um exemplo.

A televisão carioca começou uma campanha para destruir o milagreiro João de Deus. João foi preso pela polícia (Estado de polícia) que se apresenta como extensão da vontade poder “mulher assediada” sexualmente pelo milagreiro. O poder da televisão é a extensão da vontade poder da multidão de mulheres que se definem como uma subjetividade assediada. A máquina de comunicação morologus é a produção de besteira que leva a gramaticalização da realidade dos fatos pela psicanálise em gramática econômica. Esta gramaticalizou a ficcionalização da libido de João de Deus pelos mass media como a produção da besteira  <João de Deus é uma versão caipira latifundiária do dom Juan europeu>.  Para o João de Goiás, a multidão de mulheres é parte de seu latifúndio sexual. A relação da psicanálise em gramática econômica com a animalidade dos mass media se apresenta assim:
“Este indeterminado, este sem-fundo, é igualmente a animalidade própria ao pensamento, a genitalidade do pensamento: não esta ou aquela forma animal, mas a besteira. Com efeito, se o pensamento só pensa coagido e forçado, se ele permanece estúpido enquanto nada o força a pensar, aquilo que o força a pensar não é também a existência da besteira, a saber, que ele não pensa enquanto nada o força?”. (Deleuze: 434).

Os mass media e a psicanálise em gramática econômica constituem uma banda de Moebius do ser da cultura Ocidental no século XXI.


CASSIRER, Ernest. Langage et mythe. À propos des noms de dieux. Paris: Minuit, 1973
DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. RJ: Graal, 1988
DERRIDA, Jacques. Force de loi. Paris: Galilée, 1994
GODIN, Christian. La totalité. V. 1. De l’imaginaire au simbolique. Paris: Champ Vallon, 1998
GOETHE. Fausto & Werther. SP: nova Cultural, 2002
HEIDEGGER, Martin. Nietzsche. Metafísica e niilismo. RJ; Relume Dumará, 2000
HUSSERL, Edmund. A crise das ciências europeias e a fenomenologia transcendental. RJ: Forense Universitária, 2012
LACAN, Jacques. Encore. Le Seminaire. Livre XX. Paris; Seuil, 1975    


  

  





  

  






  

Um comentário:

  1. Muito bom, estamos vivendo uma situação do querer por querer e o querer por poder, a banalização dos meios de comunicação de massa gera na sociedade uma sensação de poder pela cultura do ódio, que é o oposto a meu ver do que se repara nas citações teológicas. cabe uma pergunta: quando será que a humanidade vai acordar para isso e se convencer que o mal é apenas a ausência do bem? ´Pois teoricamente fazer o bem deveria ser bem mais fácil, assim como existe nos dias de hoje uma necessidade quase explícita de que para salvarmos o planeta e a humanidade, necessário é que se apague a cultura do satanismo dos que detém o poder condigno no mundo atual.

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