terça-feira, 28 de janeiro de 2025

DEMOCRACIAS

 

 

 


 

 

José Paulo

 

O Estado mercantilista trumpista se contém no cérebro de Donald Trump como o Urstaat de Deleuze e Guattari?

 

“De todas as instituições, é talvez a única a surgir completamente armada no cérebro daqueles que a instituem. ‘os artistas de olhar de bronze’. Eis por que, no marxismo, não se sabia muito bem o que fazer com essa instituição, uma vez que ela não entra nos famosos cinco períodos, comunismo primitivo, cidade antiga, feudalismo, capitalismo, socialismo. Ela não é uma formação entre outas, nem a passagem de uma formação a outra. Dir-se-ia que ela está em atraso em relação ao que corta e ao que recorta, como se desse testemunho de uma outra dimensão, idealidade cerebral que se acrescenta à evolução material das sociedades, ideia reguladora ou princípio de reflexão (terror) que organiza as partes e os fluxos num todo. O que o Estado despótico corta, sobrecorta ou sobrecodifica, é vem antes, a máquina territorial, que ele reduz ao estado de tijolos, de peças trabalhadoras submetidas desde então à ideia cerebral”. Deleuze e Guattari: 262-263).    

 

A prática política despótica encontra-se como gramática de sentido no cérebro do homem político e seus auxiliares tirânicos como Trump E Rubio. Estes são um corte, sobrecorte e recorte na prática política do passado do Estado territorial e, sobretudo, da democracia jeffersoniana, ou da democracia de John Rawls. O quanto a democracia trumpista despótica se encontra longe da democracia moderna?

 

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Como passado, a tradição aparece como gramática de sentido lógico na prática política d atualidade:

 

“A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. (Marx. 1974: 335).

 

Em Engels a ideologia no cérebro já é uma espécie de gramática de sentido lógico no cérebro do homem:

 

“Toda ideologia, todavia, uma vez que surge, desenvolve-se3 em ligação com a base material das ideias existentes, desenvolvendo-a e transformando-a por sua vez; e não fosse assim, não seria uma ideologia, isto é, um trabalho sobre ideias conhecidas como entidades dotadas de substância própria, com um desenvolvimento independente e submetidas tão apenas às suas próprias leis. Os homens, em cujo cérebro esse processo ideológico se desenrola (...)”. (Engels: 203).

 

A democracia kantiana aparece como gramática de sentido no cérebro de Habermas:

 

“Ao formular sua doutrina do direito, Kant tomara como ponto de partida direitos subjetivos, que concediam a cada pessoa o direito de usar a força quando suas liberdades subjetivas de ação, juridicamente asseguradas, fossem atacadas. Quando o direito positivo sucedeu ao natural, momento em que todos os meios legítimos de usar a força passaram a ser monopolizados pelo Estado, esses direitos de usar a força transformaram-se em autorizações para iniciar uma ação jurídica”. (Habermas. 1997: 48).

 

O Estado territorial da democracia constitucional moderna estabelece para o uso da violência do aparelho de Estado a legitimidade sem ignorar a facticidade na prática política. Esta é a dimensão sem gramática de sentido do direito constitucional na prática política conjuntural. (Poulanztas: 90):

 

“Em nosso contexto interessa, em primeiro lugar, o conceito de legalidade, do qual Kant se serve para esclarecer o modo complexo de validade do direito em geral, tomando como ponto de partida os direitos subjetivos. Na dimensão da validade do direito, a facticidade interliga-se mais uma vez, com a validade, porém não chega a formar um amálgama indissolúvel – como nas certezas do mundo da vida ou na autoridade dominadora de instituições fortes, subtraídas a qualquer discussão. No modo de validade de direito, a facticidade                                                                                                                        da imposição do direito pelo Estado interliga-se com a força de um processo de normatização do direito, que tem a pretensão de ser racional, por garantir a liberdade e fundar a legitimidade. (Habermas. 1997: 48).  

 

No modo de ser psíquico da validade da gramática de sentido, na prática política fática, a gramática hegemônica se torna normatização constitucional que evita anarquia do capital e a anarquia das gramáticas de cada pessoa. O princípio da anarquia linguística e estabelece na medida em que cada indivíduo tem sua própria gramática política pessoal (Gramsci. 1977:2343).                                   

 

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A validade sem facticidade é um modo de ser psíquico retórico; a facticidade sem validade é anarquia; a validade sem facticidade é o funcionamento retórico do aparelho de Estado; a facticidade sem validade é o funcionamento despótico do aparelho de Estado. A práxis individual em um ou outro pode ser legítima/justa (validade) ou ilegítima/injusta (facticidade).

 

Sartre fala da práxis individual como fenômeno da prática política:

 

“Sur le terrain le plus superficial et le plus familier, l’expérience découvre d’abord,, dans l’unité de liaisons dialectiques, l’unification comme mouvement de la <práxis> individualle, la pluralité, l’organisation de la pluralité et pluralité des organisations. Cela, il suffit d’ouvrir les yuex pour le voir. Le probleme pour nous, c’est celui liaisons. S’il a des individus qui totalise”. (Sartre: v. 1: 194).   

 

A gramática de sentido da práxis individual é constituída pelos indivíduos que totalizam. Eles totalizam o sentido em uma gramática lógica da prática política da plurivocidade de práxis; a práxis política fática sem validade cria e recria o estado de anarquia no campo político:

 

“La réponse immédiate mais insuffisante, c’est qu’il n’y aurait pas même une ébauche de totalization partielle si l’individu n’état par soi-même totalisant. Tout la dialectique historique repose sur la práxis individualle en tant que celle-ci est déjà dialectique, c’est-à-dire dans la mesure où l’action est par elle-même dépassement négateur d’une contracdiction, détermination d’une totalizatin presente au nom d’une totalité future, , travail réel et efficace de la matière”. (Idem: 194).

 

A gramática de sentido lógico da plurivocidade de práxis individual do homem político existe em um campo da prática política paraconsistente - ligando passado e futuro na atualidade da conjuntura. Para ser eficaz e histórica. a práxis individual tem que produzir sentido em uma gramática cuja lógica tem raiz nas relações técnicas de produção:

 

“Mais j’ai dit que l’expérience fournissait elle-même son intelligibilité. . Il faut donc voir au niveau de la praxis individuelle (peu nous importe, pour l’instant, quelle sont les contraintes colletives qui la susciten, la limitent ou lui ôtent sont efficacité) quelle est la rationalité proprement dite de l’action”. (Idem: 194). 

 

 Como plurivocidade de práxis de gramática de sentido lógico, a experiência da prática política [como agir] fornece sua inteligibilidade. A práxis trumpismo fornece sua inteligibilidade no agir da prática política de governo. Da práxis do cérebro trumpista aparece a gramática de sentido lógico do Estado mercantilista e mais fenômenos da conjuntura mundial da atualidade e americana, esta como grande potência.  

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O desejo é um componente da práxis individual na prática política:

“Também não quero defender a ideia de que seria aconselhável a um egoísta, em meio a uma sociedade justa, transformar-se em um homem justo, dados os seus objetivos. Antes, o que me interessa é avaliar o bem de um estabelecido desejo de seguir o ponto de vista da justiça. Suponho que os membros de uma sociedade bem estruturada já possuam esse desejo. A questão é se esse sentimento regulador é coerente com o bem das pessoas. Não estaremos examinando a justiça ou o valor moral das ações a partir de determinados pontos de vista; estaremos, sim, avaliando o bem associado ao desejo de adotar-se um ponto particular, a saber, o da justiça. Precisamos avaliar este desejo não do ponto de vista do egoísta, seja qual for, mas à luz da teoria do bem”. (Rawls: 412).

O desejo pode ser movido pelo princípio de prazer (desejo do egoísta) que se manifesta como não-sentido na prática política; o desejo pode ser conduzido pelo princípio de realidade da lógica da gramática de sentido do bem. Tomando como exemplo o governo de Trump, o desejo deste não parece ser do homem político egoísta na práxis individual. Já a práxis de Elon Musk apresenta um forte teor de egoísmo despótico. Daí que dois déspotas um universal governamental e o outro egoísta particular não conseguem habitar a mesma prática política governamental. O desejo governamental de Trump parece se orientar pela gramática de sentido do Bem para todos os americanos. Já Musk   parte dos seus desejos econômico egoístas feudais virtuais. Musk representa a anarquia de desejos na prática política trumpista. Até quando?  Significa o não-sentido da prática política governamental; o aparelho de Estado é anarquia fática e injustiça - quando funciona pelo princípio de prazer das práxis individuais egoístas.

O mais-gozar é um fenômeno do Estado lacaniano barroco/feudal. O mais-gozar da prática política do Estado barroco divide a democracia feudal em forma de governo do dominante (EUA) e forma de governo do dominado (China). Gozar com a riqueza nacional (Mehrlust) pode ser o aparelho de Estado fiscal realizando o desejo do dominante ou do dominado. (Lacan. S. 16: 30,29; Bandeira da Silveira. 202: cap 12 e 23).

O mais-gozar é a dimensão do desejo fiscal do homem político na prática política do Estado lacaniano fiscal barroco/feudal da atualidade. Na prática política do aparelho de Estado barroco, o desejo barroco tem um duplo sentido: fatalidade e liberdade:

“Ao mesmo tempo , ele [o barroco] empresta do classicismo sua reflexão da fatalidade no quadro da história, visto como o polo oposto da liberdade”. (Benjamin: 130).

Fatalidade e liberdade são as afecções que geram desejos barrocos na prática política do Estado lacaniano fiscal. Na França, a Revolução francesa e a Comuna de Paris são momentos da liberdade da prática política na guerra civil entre dominante e dominado pelo mais-gozar. Nos EUA, a revolução americana é um momento de liberdade. Esse passado foi esquecido como gramática de sentido lógico da história. Os dois países passaram a viver a fatalidade da causalidade do capital. As Américas latina e luso sempre viverem pelo desejo da fatalidade [como mais-gozar] na prática política do Estado fiscal.  Da prática política, o fatalismo determina o agir da plurivocidade de práxis individuais do homem político e das massas. Acaba funcionando como princípio de realidade, este como um poder coercitivo das práxis individuais.    

 

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Barroco, tela gramatical, ensaios. EUA: amazon, 2022

BENJAMIN, Walter. Origine du drame baroque allemand. Paris: Flammarion, 1985

DELEUZE ET GUATTARI, Gilles et Félix. L’Anti-Oedipe. Capitalisme et schizophrénie. Paris: Minuit, 1972

ENGELS. Karl Marx e Friedrich Engels. Obras Escolhidas, v. 3. Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã. SP: Alfa-Omega, sem data

GRAMSCI, António. Quaderni del Carcere. v. 3. Torino: Einaudi, 1977

HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia. Entre facticidade e validade. V. 1. RJ: Tempo Brasileiro, 1977

LACAN, Jacques. O Seminário. Livro 16. De um Outro ao outro. RJ: Zahar, 2008

MARX. Os Pensadores. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. SP: Abril Cultural, 1974

POULANTZAS, Nicos. Poder político e classes sociais. SP: Martins Fontes, 1977

RAWLS, John. Uma Teoria da justiça. Brasília: UNB, 1981

SARTRE, Jean Paul. Critique de la raison dialectique. Paris: Gallimard, 1985

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