quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Lacan, Heidegger, Barroco e o perverso

 José Paulo

 

Lacan estabelece o campo lacaniano a partir das relações da comunidade psíquica linguística (CPL) freudiana com a CPL filosófica e a marxista de maio de 1968. Do Seminário 16 ao Seminário 20, ele desenvolve o campo lacaniano barroco. O Seminário 20 é a discussão com Heidegger sobre o mundo como realidade no discurso: filosofia, do analista, do maître:

“Já aqui, por mais nada a não ser por avançarmos na corrente do discurso analítico, demos esse salto que se chama concepção de mundo, e que deve, entretanto, ser para nós o que há de mais cômico. O termo concepção de mundo supõe um discurso inteiramente outro que não o nosso, o da filosofia”.

“Nada é menos garantido, se sairmos do discurso filosófico, do que a existência de um mundo. Só há mesmo ocasião para sorrir quando se ouve colocar, sobre o discurso analítico, que ele comporta qualquer coisa da ordem de tal concepção”. (Lacan. 1975. S. 20: 32).

A concepção de mundo é a gramática de sentido como forma de consciência ideológica: política, religião, direito, filosofia, arte. (Marx. 1974:). Heidegger fez um a leitura da ideologia através do conceito de vontade de poder de Nietzsche. Assim, temos o conceito de concepção política de mundo”. (Heidegger. 2000:133), ideologia como vontade de poder, como potentia psicótica grotesco/gótico, como gramática de sentido do céu dos céus das ideias. (Vieira: 63; 44-45). Lacan procurou cancelar o significante de Marx ideologia que chegou ao jornalismo brasileiro em 2024.

Lacan quer pôr no lugar da ideologia o evangelho:

“Eu diria mesmo mais – colocar tal termo para designar o marxismo, faz igualmente sorrir. O marxismo não me parece poder passar por concepção de mundo. A isto é contrário, por toda sorte de coordenadas contundentes, o enunciado do que diz Marx. É outra coisa, que chamarei um evangelho. É a anunciação de que a história instaura uma outra dimensão de discurso, e abre a possibilidade de subverter completamente a função do discurso filosófico, na medida em que sobre ele repousa uma concepção de mundo”. (Lacan. 1975. S. 20: 32).    

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De Derrida, o Livro “Do espírito” fala do fim da tela gramatical metafísica que começa com Platão, é restaurada por Descartes, Leibniz e chega até Hegel. Heidegger viu o fim da tela do espírito como o fim da supremacia da Europa na história mundial. Ele viu na gramática de sentido do nacional-socialismo a possibilidade da Europa restaurar a comunidade psíquica/linguística/filosófica/ alemã como hegemônica:

“O despertar do espírito, a reapropriação de seu poder passa pois, uma vez mais ainda, pela responsabilidade do questionamento tal como se acha confiado, assinalado, destinado a ‘nosso povo’. Que o mesmo capítulo se abre, na sua conclusão, tratando do destino da língua (Schicksal der Sprache) na qual se funda a relação (Bezug) de um povo com o ser, isto bem mostra que todas essas responsabilidades estão entrelaçadas, a de nosso povo, a da questão do ser e a da nossa língua. Ora, no início do capítulo sobre a gramática da palavra ‘ser’, ´ainda a qualidade espiritual que define o privilégio absoluto da língua alemã”. (Derrida.1990:85). 

A gramática de sentido do ser do campo político metafísico europeu indica a potentia psicótica grotesca/gótica. O grotesco é a multidão ou povo de uma CPl nacional da transformação do campo político mundial. ele significa a desintegração do campo anterior e a fabricação do novo campo pelo povo alemão. O gótico é o ser de um campo político que busca o céu dos céus da criação e recriação de ideias políticas mundiais:

“A gramática das palavras não se ocupa somente nem em primeiro lugar com a forma literal e fonética das palavras. das palavras. Toma os elementos morfológicos, que as palavras apresentam, como indicações de determinadas e diferentes direções de possíveis significados e como indícios de suas possíveis inserções, prelineadas pelos significados, numa proposição, i, é numa maior estrutura linguística. (Heidegger. 1978: 81).

A essência da gramática de sentido é o ser das CPLs que lutam em um campo político de época para ser a tela gramatical soberana como estrutura de dominação gramatical. A estrutura da gramática de sentido dos jogos de significante do ser é uma abertura para o fenômeno invadir o campo da política de uma época:

“Que palavra é essa, ‘o Ser’, segundo a sua morfologia? Ao ‘ser’ correspondem outras formas, como ‘o voar’, ‘o sonhar’, ‘o chorar’ etc. tais formas linguísticas se comportam na linguagem, como ‘o pão’, ‘a habitação’, ‘a erva’, ‘a coisa’. Todavia, logo descobriremos nas primeiras uma diferença. Podemos reduzi-las facilmente aos verbos, ‘voar’, ‘sonhar’, ‘chorar’ etc...o que as segundas parecem não permitir”. (Heidegger. 1978: 83).

Voar, sonhar, chorar constituem a prática política grotesco\gótico da tela verbal espiritual. Assim, a tela gramatical metafísica parece indestrutível como CPL soberana do campo político europeu e/ou mundial.

O jovem Marx viveu o ocaso da hegemonia da tela metafísica europeia moderna com a crítica da modernidade hegeliana, que se perpetua aos dias de hoje - com o Estado hegeliano do século XX. (Lefebvre: 4).       

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No colapso da tela verbal espiritual hegeliana, o jovem Marx procurou fabricar uma tela gramatical do campo político simbólico da gramática de sentido da prática política da transição do feudalismo para a Europa moderna:

“A emancipação política se resolve de um modo muito simples., ela é, ao mesmo tempo, a dissolução da velha sociedade, sobre a qual descansava o Estado que se tem alienado ao povo, a sociedade do poer senhorial”. (Marx. 1982: 481).

A emancipação política tem na potentia psicótica grotesca/moderna sua força histórica revolucionária para a época moderna:

“A revolução política é a revolução da sociedade burguesa. Qual ra o caráter da velha sociedade? Uma palavra a define. O feudalismo. A velha sociedade civil tinha um caráter diretamente político; nela, os elementos da vida civil, por exemplo a possessão dos bens, ou a família, ou o tipo e o modo de trabalho, se haviam elevado ao plano de elementos da vida estatal, sob a forma da propriedade territorial, o estamento ou a corporação. Determinavam, sob esta forma, as relações entre o indivíduo e o conjunto do Estado, isto é, suas relações políticas ou, o que tanto vale, suas relações de separação e exclusão com respeito a outras partes integrantes da sociedade. Naquela organização da vida do povo, a possessão dos bens ou o trabalho não se elevava ao plano de elementos sociais, senão que, ao contrário, se levava até seu extremo sua separação do conjunto do Estado, para constituí-los na sociedade aparte dentro da sociedade. Entretanto, as funções e condições da vida da sociedade civil seguiam sendo funções e condições políticas, embora políticas no sentido do feudalismo;”. (Marx. 1982: 481).

A gramática de sentido do ser do campo político feudal era o Estado ser o suporte da democracia feudal do dominante. Para estes, era carreada toda a mais-valia pública fiscal do Estado lacaniano feudal. (Bandeira da Silveira. 2022: cap. 16):

“dito de outro modo, excluíam ao indivíduo do conjunto do Estado e convertiam a relação especial de sua corporação com o conjunto do Estado em sua própria relação geral com a vida do povo, a par que convertia sua atividade e sua situação civil determinadas em sua atividade e situações gerais. E esta organização traía como consequência o que a unidade do Estado se revelara necessariamente como a consciência, a vontade e a ação da unidade do Estado, e que o poder de Estado se manifestara, assim mesmo, como incumbência particular de um senhor dissociado do povo e de seus servidores”. (Marx. 1982: 481-482). 

O Estado feudal não incluía a CPL-individuo no campo político do Outro da Europa. O discurso do maître lacaniano construía o real [como heteróclito] da realidade do campo político feudal. (Lacan. S.20: 33). A revolução política moderna se faz contra gramática de sentido gótica do discurso do maître feudal:

“a revolução política, que derrubou est poder senhorial que elevou os assuntos do Estado a assuntos do povo e constituiu o Estado político como incumbência geral, isto é, como um Estado real, acabou necessariamente com todos os estamentos, corporações, grêmios e privilégios, que eram outras tantas expressões do divórcio entre o povo e sua comunidade. A revolução política suprimiu, com isto, o caráter político da sociedade civil. [...]. rompeu as atadura do espírito político, que se achavam como cindido, dividido e estancado nos diversos becos sem saída da sociedade feudal:”. (Marx. 1982: 482)

O Estado lacaniano da gestão da mais-valia pública fiscal se redefine com gramática de sentido moderna. A foraclusão dos jogos de significantes feudais desintegra a democracia feudal do discurso senhorial. No lugar, a relação do capital com o Estado lacaniano define a gramática de sentido do mais-de-gozar, ou plus-de-jouir, ou Mehrlust (Lacan. S. 16: 30-29) do campo político moderno, campo político do capital como estrutura de dominação ideológica da sociedade de classes sociais da modernidade. A transformação do campo político europeu é uma imagem textualizada de jogos de caligrafia:

“Sem embargo, ao levar-se ao cume o idealismo e Estado se levava a sua culminação, ao mesmo tempo, o materialismo da sociedade civil. ao sacudir-se o jugo político, se sacudiam, a par com ele, as correntes de ferro que aprisionavam o espírito egoísta da sociedade civil. a emancipação política foi, ao mesmo tempo, a emancipação da sociedade civil em relação à política, sua emancipação até da mesma aparência de um conteúdo geral”. (Marx. 1982: 482).

Marx fala de uma tela verbal narrativa pós-burguesa do ponto de vista da CPL-individuo como soberana no campo político mundial:

“Só quando o indivíduo real recobra dentro de si o cidadão abstrato, e se converte, como homem individual, em <ser> genérico, em seu trabalho individual e em suas relações individuais; só quando o homem souber reconhecer e organizar suas <forças próprias> como forças sociais, e quando, portanto, não se arranca já de si mesmo a força social, sob a forma de força política, podemos dizer que se leva a cabo a emancipação humana”. (Marx. 1982: 484).

Trata-se da emancipação da espécie humana, emancipação de todos os seres do planeta. Assim, Marx adianta o sujeito humanidade como relação entre a essência da técnica e o general intellect.  

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A essência da técnica (Heidegger. 1972:19) era o inconsciente não penado da época pós-Segunda Guerra mundial:

“Segundo isto, o grave, o que nos dá que pensar, não é de modo algum prefixado por nós, nem somente estabelecido ou pré-assentado. Segundo a afirmação em questão, o que de por si dá mais que pensar, o gravíssimo, é isto: que todavia não pensamos”. (Heidegger. 1972: 12).

Marx pensou a essência da técnica como general intellect. (Bandeira da Silveira. 2022b):

“Nos estudos preliminares à “Crítica da economia política” encontra-se uma versão, segundo a qual a história da espécie humana está comprometida com uma conversão automática de ciência natural e técnica em autoconsciência do sujeito social (general intellect) que controla o processo da vida material”. (Habermas: 64).

O general intellect é um sujeito do inconsciente da

 prática política gramática, barroca, universal - na medida em que qualquer discurso tem um inconsciente. (Lacan. S. 16: 68). 

Baltasar Gracián fala do inconsciente a céu aberto dos simulacros de dissimulação da prática política barroca da CPL-jesuítica do século de ouro:

“A vida do homem consiste numa milícia contra a malícia do homem. a astúcia luta com estratégias de intenção. Nunca faz o que indica. Aponta para enganar, golpeia indiferente no ar e desfere o golpe, atuando sobre a realidade imprevista com dissimulação atenta. A fim de conquistar a atenção e a confiança dos outros, deixa transparecer um intento. Logo em seguida, porém, muda de posição e vence pela surpresa. A inteligência perspicaz previne-se da astúcia observando-a detidamente, espreita-a com cuidado, entende o oposto do que a astúcia quis que compreendesse e percebe de imediato as falsas intensões. A inteligência ignora a primeira intenção, aguardando a segunda, e até a terceira. A simulação cresce mais ainda a ver seu truque descoberto e tenta enganar contando a verdade. Muda de jogo, engana com a aparente falta de malícia. Sua astúcia se baseia na maior franqueza. Mas a observação se adianta, discernindo através de tudo isso percebendo as sombras envoltas em luz. Decifra a intenção, que mais parece singela. Assim é a luta da astúcia de Pitão contra a franqueza dos penetrantes raios de Apolo”. (Gracián: 29).    

O inconsciente barroco é o da potentia psicótica dos jogos de estratégica da foraclusão dos significantes soberanos (MacCarthy: 333). Pela práxis individual do: despistar, do simular, dissimular, enganar, mentir, iludir, sugestionar, do golpe político...    

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O lugar da imaginação no inconsciente da prática política só é bem compreendido com a gramática de sentido da pintura que faz a esfera do imaginário se encontrar com a esfera do simbólico no quadro “A vocação de São Mateus”, de Caravaggio:

“Mais decisivo ainda é forte raio de Sol que ilumina o rosto e a mão de Jesus no sombrio interior, assim levando o seu chamamento até S. Mateus. Sem esta luz – tão carregada de sentido simbólico -m o quadro perderia a magia, o seu poder de nos fazer sentir a presença divina”. (Janson: 500).

Gracián:

24 – Temperar a imaginação

Devemos ora refreá-la, ora estimulá-la. Toda felicidade depende da imaginação, e esta deveria ser orientada pelo bom senso. Às vezes, ela se comporta como um tirano. Não lhe bastando especular, toma conta de nossa vida, a qual torna agradável ou desagradável, tornando-nos infelizes ou satisfeitos demais conosco mesmos. A alguns causa desgosto, pois a imaginação é um algoz dos tolos. A outros promete felicidade e aventura, alegria e vertigem. Ela pode fazer tudo isso, se não for temperada pela prudência e pelo bom senso”. (Gracián: 33-34).

A imaginação em qualquer tela se torna o imaginário de produção e irradiação de imagem textual, por exemplo, imagens da gramática de sentido no campo político simbólico barroco.  

A relação da imagem plástica da profundidade do espaço/tempo com o campo político barroco ergue uma comunidade psíquica linguística de gosto, de estilo:

“É ele o agudo sentimento da incontrolável força do tempo. Porque o verdadeiro protagonista do drama do Barroco é o tempo. Assim, se a pintura tem buscado e achado essa visão e afeto de profundidade que nos atrai e arrasta em direção ao fundo do quadro, se nos arrebata até esses lejos de que tanto vezes nos falam os poetas, se nos obriga a sentir-nos envoltos nesse espaço contínuo, é porque esta visão espacial é a única na qual pode ser representado plasticamente o tempo. Esta visão de profundidade é a forma visual sobre a qual se pode projetar a sucessão dos atos como se desenvolvem na consciência. Já Spengler assinalava a equivalência espaço-tempo dizendo <que a profundidade do espaço é o tempo solidificado>. E partindo da representação da lejanía espacial na pintura barroca, Klages tem insistido nessa essencial comunidade de significação. Ante a imagem de uma visão do mar em repouso, em cujo estremo limite do horizonte veríamos desfazer-se a nubecilla de humo de um navio, e a que suscita a recordação da irrecuperável juventude, o grande filósofo assinala como <ambos os afetos os encontrarão confundidos quem possua o dom de entrar no reino da interioridade”. (Orozco: 57).  

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Derrida fala da afecção:

“Tentemos aproximar nossa linguagem desse braseiro. Braseiro do espírito, nesse duplo genitivo pelo qual o espírito afeta, se afeta, e s acha afetado pelo fogo. O espírito se inflama e dá fogo, digamos o espírito in-flama, em uma ou duas palavras, verbo e substantivo ao mesmo tempo. O que se toma e se dá ao mesmo tempo é o fogo. O fogo do espírito. Não esqueçamos o que foi dito anteriormente e que relemos ainda: o espírito entrega a alma (psiquê), não a entrega só na morte”. (Derrida: 103).

A afecção é fogo afetada pela tela espiritual barroca e afetando a tela e, simultaneamente, o campo político barroco. A afecção de gosto universal é o real da realidade do discurso (Lacan. S. 20: 33) político barroco:

Começa por descobrir o elo mais fraco da CPL- indivíduo, das afecções da vaidade ou <ídolos> da CPL- do inconsciente da prática política barroca:

“26. - A arte de influenciar a vontade dos outros envolve mais habilidade que determinação. É preciso saber qual a porta de acesso. Cada vontade tem seu foco de interesse: varia de acordo com o gosto. Todos são idólatras: uns da estima, outros do dinheiro, e a maioria do prazer. A minha consiste em identificar os ídolos capazes de motivar os indivíduos. É como possuir a chave do querer alheio. É preciso atingir a motivação básica, que nem sempre consiste em algo elevado. A maioria das vezes é mesmo muito baixo, porque no mundo existem mais desordenados do que disciplinados. Primeiramente, avalie a índole; então toque no ponto fraco. Tente-o com o objeto de sua afeição e infalivelmente dará xeque-mate no seu arbítrio”. (Garcián: 34).

A tela neobarroca da televisão é um pastiche surrealista da tela barroca clássica:

“A minha tese geral é de que muitos importantes fenômenos de cultura do nosso tempo são marcas de uma <forma> interna específica que pode trazer à mente o barroco”. (Calabrese: 27).

Qual o elo mais fraco da tela neobarroca?

“Por <clássico> entenderemos substancialmente categor4izações dos juízos fortemente orientadas para as homologações estavelmente orientadas. Por <barroco> entenderemos, ao contrário, categorizações que <excitam> fortemente a ordenação do sistema e que desestabilizam em algumas partes, que o submetem a turbulências e flutuações e que o suspendem quanto á resolubilidade dos valores”. (Calabrese: 39);

A tela barroca de gosto põe e repõe o campo político numa crise permanente. A tela neobarroca destitui esse jogo de significantes do fim da política. Ora! O elo mais fraco dela é a evolução das relações técnicas de produção que criam uma nova tela de gosto pós-neobarroca. Ela cria e recria a tela cibernética do neogrotesco (Sodré; 92) psicótico ou simulacros de dissimulação de psicóticos grotescos. (Kayser, 1986; Rosen, 1991).

A tela barroca é movida pela razão da gramática de sentido barroca:

“Esteja sempre do lado da razão, e com firmeza de propósito que nem a tirania o desviará da razão”. (Gracián: 35).

A prática política do Principe barroco/gótico é o de evitar a forma de governo do tirano:

“La position sublime de l’empereur d’une part, l’impuissance criminelle de ses actes d’autre part, ne permettent pas de décider au fond s’il s’agit d’un drame du tyran ou de l’histoire d’un martyr”. (Benjamin: 74):

“Mas onde estará essa fênix de equidade? Poucos cultivam a integridade. Muitos a louvam, mas poucos a habitam. Alguns a seguem até que a situação se torne perigosa. Em perigo, os falsos a renegam e os políticos a simulam. Ela não teme contrariar a amizade, o poder e  mesmo o seu próprio bem, e é nessa hora que é repudiada”. (Gracián: 35).

A definição do político barroco serve, como gramática de sentido, para o político moderno? Este ainda guarda as aparências de semblãncia (Arendt: 31) de representar a gramática de sentido dos interesses dos representados. O político pós/moderno age pelos simulacros de simulação   de psicótico grotesco; ele, com efeito, á da CPL-do perverso para quem o Outro [como gramática de sentido] persiste como simulacro de dissimulação, isto é, fora dos jogos de signos da democracia constitucional. A CPL/ do perverso sustenta e recria o campo da ditadura na forma democrática de governo. Por exemplo, na forma de regime democrático constitucional 1988:

“Assim é a simulação, naquilo que se opõe à representação. Esta parte do princípio de equivalência do signo e do real (mesmo se esta equivalência é utópica, é um axioma fundamental”. (Baudrillard. 1991: 13)”.

Mesmo que a representação opere como pura ficção (Kelsen: 315) da gramática de sentido representante/representado - no campo político simbólico/moderno.

Baudrillard segue:

 “A simulação parte, ao contrário da utopia, do princípio de equivalência, parte da negação radical do signo como valor, parte do signo como reversão e aniquilamento de toda referência. Enquanto, a representação tenta absorver a simulação interpretando-a como falsa representação, a simulação envolve todo o próprio edifício da representação como simulacro”. (Baudrillard. 1991: 13).     

Gracián:

“Os astutos elaboram sofismas sutis e falam de louváveis motivos superiores ou de razão de Estado. Mas o homem realmente leal considera a dissimulação uma espécie de traição e preza mais ser firme do que o ser sagaz e se encontra se4mpre do lado da verdade. Se diverge dos outros, não é devido à sua inconstância, mas porque os outros abandonaram a verdade”. (Gracián: 35).

A tela verbal do relato da verdade é aquela da CPL-do psicótico barroco/gótico. Ela é uma aporia com a tela verbal da CPL-do perverso neogrotesco <astuto>  do poder estratégico no Youtube, por exemplo.  

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A história da civilização política é aquela da comunidade psíquica linguística (CPL) que para a semiótica á a CPS, isto é, comunidade psíquica de significantes ou CPS (Greimas: 259). As gramáticas de sentido podem ser da língua natural ou do conjunto de significantes artificiais, significantes semióticos. (Greimas: 258: 262). O CPS da época pósmodernista é do perverso (CPSp). Uma serie de livros tratam da época do perverso pós-modernista no poder governamental: Da “Sedução”, de Baudrillard, A “Anti-Natureza”, de Clémant Rousset, o Pós-modernismo. A “lógica cultural do capitalismo tardio”, o “Crítica de la razon cínica”, de Peter Sloterdijk.

O problema gravitacional é a gramática de sentido das CPS ou CPL. Há gramática de sentido das CPL: neurótica, psicótica, perversa, filosófica ou homem normal que se guia pelo logos. (Samaranchy: 192). A investigação do neurótico, do psicótico e do perverso tem sido objeto do campo do indivialismo metodológico freudiano. (Kelsen. 1993). Na psicanálise dialética fazendo pendant com a ciência política materialista (Bandeira da Silveira, 2024a; Bandeira da Silveira, 2024b; Bandeira da Silveira, Sociologia e psicanálise gramatical, 2017, amazon), a CPL existe como tela verbal de relato no campo da civilização política.

Hoje interessa investigar a época da atualidade que é um choque agônico entre a CPL perversa (do Outro como simulacros de dissimulação [na televisão e no Youtube) e a CPL do filosofo da terceira década do século 21. Platão falou de uma gramatica de sentido natural (Nescke-Hentschke; 1995), do direito natural em oposição a gramática de direito positivo, gramática semiótica, pois, pois.

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Em 1983, na aurora do globalismo libera pós-modernista (Ianni; 1996), o professor Eugène Enriquez publicou um livro sobre Freud, dominação e o Estado. Ele fala do capital capitalismo como uma estrutura racional pilotada por fetiche. (Enriquez: 260). O capital capitalismo aparece como a comunidade psíquica linguística do perverso. Bem! a CPLp se define pelo significante fetiche no campo lacaniano da filosofia:

“Mais il y a la loi, qui comande la transgression, et qui est elle-même transgressive. La loi comande de <fair ela loi> parce que seule la loi peut transgresser. Ce quid ire que le signifiiant de la loi doit apparaître dans le réel, como un objet. C’est le fetiche. La présence du fetiche au couer de tout perversion est notée par Lacan qui, parlant de la fonction que l’objet a reçoit du symbolique, nomme celle <de fetiche dans la strutyure perverse comme condition absolut du désir>”. (Juranville: 259).

A CPLp é o inconsciente a céu aberto sem recalque, a não ser o recalque originário. (Juranville: 258=259). A globalização liberal pós-modernista fez do inconsciente a céu aberto o fenômeno dominante no Ocidente e Oriente? Para existir, o inconsciente a céu aberto necessita de tela técnica de imagem textualizadas. Assim, a televisão aparece como a tela da CPlp através do discurso publicitário que faz da mercadoria capitalista um fenômeno de uma sociedade do espetáculo. (Debord; 1992). O nosso problema é a existência da CPLp no campo político de época. Assim, um fenômeno elementar é o da autoridade:

Nietzsche definiu a autoridade governamental como ´poder da gramática de sentido no campo da civilização política. (Nietzsche: 54). Baltasar Gracián fala da autoridade no campo político do barroco:

“42. Autoridade nata.

“É de uma força superior, secreta. Não deve emanar de artificialismo enfadonho, mas de um domínio natural. Todos se submetem a ela sem saber o porquê, reconhecendo o secreto vigor da autoridade nata. Tais pessoas têm um caráter altivo: reis, por mérito, leões por direito natural. Cativam o respeito, o coração e até a mente dos outros. Quando abençoados com outros dons, nascem para ser excelentes políticos. São capazes de realizar mais com uma insinuação do que outros com prolixidade”. (Gracián: 40).

A autoridade é uma gramática de sentido natural, do direito natural. Ela não é uma gramática de sentido artificial, semiótica, gerada pela Constituição. A não ser que ela seja um fetiche lacaniano? A não ser se ela for a autoridade instalada como CPLp no campo político de uma formação social territorial. A autoridade fetiche do inconsciente a céu aberto? 

Quant a l’identefication imaginaire qui donne sens à tous les phénomènes de la perversio, c ‘est l’identification à la mére comme l’objet primordial. C’est à la plenitude imaginaire de la mère que la transgression porte atteinte, et lui portanto atteinte, elle la suppose. Bien plus elle lui apporte ce qui est censé la combler, soit le phallus dont la castration est déniée, puisqu’il est là dans le fetiche. Le paradoxe de la transgression, c’est qu’elle est un mal , bien sur, mais un mal qui s’efface comme tel parce qu’il apport ela joissance. Dans la perversion, le mal radical est dénnié. La transgression est le seul Moyen de produire avec tout mal um bien. Mais c’est aussi introduire la violence exercée sur soi et sur l’autre dans le désir”. (Juranville: 260).  

Fazer da Constituição um fetiche de imagem textualizada põe e repõe a CPLp como autoridade governamental em geral na tela técnica cibernética de um campo político - dos países continentais das Américas. O desejo de poder/autoridade e realiza por uma gramática de sentido do fetiche como objeto constitucional. A violência dessa gramática fetichista de sentido gera toda a violência sobre si e sobre o outro como estamos vendo na violência verbal da guerra feudal particular do  pastor Malafia com Bolsonaro e personalidades  dos partidos políticos do campo ditatorial de 1988.   

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No Brasil, nos EUA, na Argentina, a relação da CPL do rico com o Estado lacaniano d mais-valia fiscal pública define a época atual. Há a gramática de sentido privatista feudal do rico, que quer uma ditadura feudal dos direitos materiais do dominante e zero de direitos materiais do dominado na distribuição da mais -valia feudal fiscal. Assim, o campo político é uma estrutura de dominação gramatical do rico, uma ditadura plutocrática, cujo modelo de maior potentia perversa é os EUA.

A investigação da CPlp do rico nas Amáricas é a chave para o entendimento da gramática de sentido do perverso no poder gramatical, como autoridade da gramática de sentido da comunidade psíquica de significante do rico perverso. O Rio Grande do Sul e o Paraná aparecem como a mais avançada estrutura de dominação ideológica da CPLp no campo político federalista territorial brasileiro.       

 

 

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