José Paulo
DO PODER INVISÍVEL DO GOZO
A natureza invisível do poder
político tem como avesso o exercício do poder na politeia. Nesta, o poder é
exercido à luz do sol na Ágora pelo cidadão grego. Nada de decisões tomadas à
luz de velas em gabinetes escuros, obscuros e opacos ao olhar e ao ouvido do
cidadão.
O poder invisível é aquele dos
arcana imperii (autoridades ocultas, misteriosas) das autocracias. A democracia
nasce virtualmente com a promessa de pôr um fim nos arcana imperii, lugar
privado ou íntimo de exercício do poder. Trata-se do lugar da pessoalização do
poder.
Tornar público o exercício do
poder é acabar com existência do duplo poder: poder visível e poder invisível. Norbert
Bobbio diz: A publicidade é em si mesma uma forma de controle, um expediente
que permite distinguir o que é legal do que é ilegal. Que funcionário público
pode afirmar em público que usará dinheiro público para interesses privados? Só
o poder invisível usa dinheiro público para alimentar interesses privados? Nos
EUA, na Europa Ocidental, no Japão e no Brasil, o poder visível usa dinheiro
público para fazer a máquina econômica privada funcionar. Então a tese de
Bobbio foi suprassumida pela realidade dos fatos políticos.
No seu livro deliciosamente atual
Filosofia da história (Editora UNB),
Hegel escreve:
“Mesmo o historiador normal e
mediano, que de certa forma pretende e acredita manter-se compreensível e
submisso ao fato, não age de modo passivo no seu pensar, recorrendo às suas
categorias e encarando por meio destas os fatos”.
A era do homo informacionalis se
baseia na crença e na equação de que informação jornalística é igual a fato. De
que a informação aboliu a necessidade de categorias, aboliu a necessidade do
pensar reflexivo da realidade dos fatos.
Hegel diz:
“Não podemos jamais abandonar o
pensamento, pois é por meio dele que nos diferenciamos do animal. E há
pensamento no sentimento, na ciência e no conhecimento, na vontade e nos
instintos – desde que humanos”.
O homo informacionalis deseja ser
um animal informacionalis. Ele prega no jornalismo que não há pensamento
reflexivo na informação, pois, trata-se de manter a distância absoluta entre o pensar
e o factual. O ofício do jornalista se sustenta neste mito de que não há
significantes técnicos literários (condensação de ideia e estrutura de
pensamento atualizados) articulando os fatos como realidade dos fatos. O
jornalista crê que seu discurso é um discurso sobre o real onde os fatos são
apenas fatos independente da cultura mundial. A informação = fato teria o mesmo
estatuto da alucinação psicótica que define o real no campo lacaniano e na
psicanálise gramatical.
A soberania do homo
informacionalis na cultura mundial se sustenta no mecanismo do credo quia absurdum (creio porque é
absurdo). Freud diz que é o mesmo mecanismo que sustenta a religião cristã. O
amai a teu próximo como a ti mesmo significa amai teus inimigo como a ti mesmo:
ABSURDO gramatical em narrativa ilógica.
O homo informacionalis é o
cristianismo do século XXI. Cristianismo que faz da informação a substância
metafísica materialista (está no lugar do Estado de Hobbes como Deus mortal).
Tal religião gera uma teologia materialista informacionalis irracional. Toda a
cultura informacioanalis tem como motor a teologia materialista informacionalis
do credo quia absurdum.
Em um livro da década de 1980 (O Futuro da democracia), Bobbio usa
categorias como “duplo Estado” (do americano Alan Wolfe, Os limites da legitimidade), Estado visível e Estado invisível. Na
Itália, o Estado invisível é constituído pela “máfia, camorra, lojas maçônicas,
anômalas, serviços secretos incontroláveis e acobertadores de subversivos que
deveriam combater”. Paul Virilio criou um significante (≅ categoria
reflexiva hegeliana) para tal fenômeno na década de 1970: KRIMINOSTAT.
O kriminostat é uma realidade de
fatos presentes nas redes econômicas privadas e públicas, na política invisível
e visível (a aparência da semblância da não existência dele é criada e recriada
pelo conluio da ciência política universitária com o falar jornalístico e o
discurso do político profissional e a ingenuidade do uso da internet pelos
internautas). Serviço secreto informacionalis, a Okharna é o poder invisível
mais letal do Kriminostat que articula o modo de produção e circulação de
drogas ilegais e a sociedade da felicidade freudiana: a sociedade narcose ilegal.
Cerca de 180.000.000 de pessoas fazem uso cotidiano de drogas ilegais. Não
existe apenas um poder invisível. Há também toda uma sociedade invisível
mundial.
O homo informacionalis tem como
suporte a difusão de que não existe verdade verdadeira da realidade dos fatos.
A informação tomou o lugar da verdade de toda uma época. A verdade da sociedade
capitalista é a mais-valia do discurso do capitalista lacaniano. Esta verdade
resultou na luta de classes e revoluções sociais em todo o planeta e nas lutas
de classes na própria sociedade democrática representativa ocidental e além oceanos.
Entramos na sociedade
pós-capitalista. A mais-valia continua como categoria hegeliana da economia
capitalista, porém, ela não articula mais a sociedade mundial pós-capitalista.
O cientista político marxista, o jornalista e o político profissional creem que
vivem em uma sociedade capitalista. Por isso, eles usam a velha linguagem
fantasmagórica capitalismo americano (Trump) versus comunismo (Coréia do Norte)
para falar de uma possível guerra atômica no século XXI.
O Kriminostat e suas Okhranas são
o poder invisível (muito visível para quem quiser ver e crer na verdade verdadeira do século XXI) nazista da
sociedade pós-capitalista. Uma lúmpen-elite de poder invisível/visível governa invisivelmente/visivelmente
os governos empresariais corporativos e os governos nacionais. A verdade verdadeira
do século XXI é a existência do Kriminostat de uma sociedade pós-capitalista que
se ampara na ideia virtual (sendo progressivamente atualizada na realidade dos
fatos) de que todos devem gozar sem limites com o corpo de todos).
Olhem e vejam como a
possibilidade de uma guerra atômica está sendo metabolizada pela cultura mundial
do homo informacionalis cristão-nazista. Ela realiza a satisfação do gozo
absoluto, ou seja, de que todos gozem com o corpo de todos que se sustenta na realidade
gramatical ilógica do credo quia absurdum
milenarista cristão informacionalis.
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