ARISTÓTELES E FREUD
Dizer algo de um modo simples
sobre a diferença entre palavra e significante parece impossível. Mas recorrendo a Aristóteles e Freud, talvez, isso se torne possível. A
diferença é que a palavra tem significados e o significante princípio.
No dicionário Houaiss, a palavra
felicidade tem significados como satisfação, contentamento, sorte, êxito. Em
Aristóteles a palavra remete para o significante homem feliz, ou princípio da
felicidade que é: “ o homem feliz vive bem e se conduz bem” (Aristóteles: 25-26).
Trata-se do princípio que articula a ética (de êthos cultural político, pois,
articulado pela razão) na polis democrática de homens livres e normais. O avesso de tal princípio ético é
o pathos (a realidade trans-subjetiva associada ao campo dos afetos e ao estado
de animus), que destrói a politeia. O pathos define a cultura política do bárbaro.
Então, o princípio da barbárie pode ser pensado na cultura política
contemporânea.
O princípio da felicidade se
realiza com o magister ético que só ex-iste em uma biografia como interseção da
vida subjetiva com a trans-subjetividade de uma cultura política de uma época.
Ao contrário da palavra
felicidade, o significante felicidade ex-iste por um princípio que articula a
realidade dos fatos magister ético (Aristóteles: 41). Pensando tal significante
como cultura política, o magister ético pode ser a própria classe política
democrática no século XXI. Isso seria uma solução para a crise da democracia
representativa sem liquidar a lógica da representação. Esta passou a funcionar
pelo princípio da barbárie, do homem pathos.
No Brasil, este desejo do magister ético está
condensado na prática das ações da comunidade jurídica que confronta (ataca) e dialoga
com a classe política e a sociedade de significantes civil para sair da
dominação na política do princípio da barbárie. Bolivariano ou burguês, o
oligarquismo é o princípio da barbárie que articulou a crise brasileira que
significa autodissolução do significante ético nação, definitivamente. O território existencial nacional das massas não existe a partir do principio da infelicidade!
Em Freud, a felicidade se articula
pela lógica de sentido do princípio do prazer: “ O que chamamos de felicidade
no sentido mais estrito provém da satisfação (de preferência, repentina) de
necessidades represadas em alto grau, sendo, por sua natureza, possível apenas
como uma manifestação episódica” (Freud: 95). Trata-se da satisfação das
pulsões (incluindo as pulsões do instinto de morte). Matar proporciona
felicidade em alto grau e intensidade. O princípio do significante felicidade
pode articular (e conduzir) trans-subjetivamente as massas na guerra. O
princípio da felicidade freudiano faz da guerra um estado de felicidade para as
massas como manifestação episódica. Trata de um princípio aristocrático
nietzschiano?
O princípio do prazer (felicidade)
faz pendant com o sofrimento do corpo, do mundo e o pior dos sofrimentos, ou
seja, o sofrimento subjetivo na interseção com a subjetividade dos outros, ou
seja, trans-subjetivo “de nossos relacionamentos com outros homens. O
sofrimento que provém dessa última fonte talvez nos seja mais penoso do que
qualquer outro” (Freud: 95).
A trans-subjetividade é a
articulação do princípio do prazer (da felicidade) com outro princípio, o da
realidade:
“Não admira que, sob pressão de
todas essas possibilidades de sofrimento, os homens se tenham acostumado a
moderar suas reivindicações de felicidade – tal como, na verdade, o próprio
princípio do prazer, sob a influência do mundo externo, se transformou no mais
modesto princípio de realidade -, que um homem pense ser ele próprio feliz, simplesmente
porque escapou à infelicidade ou sobreviveu ao sofrimento, e que, em geral, a
tarefa de evitar sofrimento coloque a de obter prazer em segundo plano” (Freud:
95-96). Assim, Freud diz que o princípio da infelicidade a ser evitado define o
homem feliz.
Na cultura política universal,
este Freud é Hegel: “ a história é um vale de lágrimas”. Tal infelicidade acaba
com a modernidade que se define pela tarefa de evitar sofrimento. Todavia, a
cultura política americana do pós-II Guerra Mundial - que se transformou no
modelo cultural mundial - se articulou pelo princípio da felicidade ética, do
magister ético? Ou pelo modelo de evitar o sofrimento? Ou o homem feliz
americano é aquele da realização da satisfação das pulsões do desejo sem
limite?
A tela gramatical musical
associada ao uso de drogas acenava com um modelo de homem feliz – no mundo-da-vida-
que é o avesso do magister ético. Trata-se do homem pathos feliz! Toda uma
cultura política do pathos acabou por criar um caminho de vida americana que
continua na religião política do pathos sem drogas e sem música que revire as
vísceras como o Tea Party (direito/avesso). Isso é a barbárie populista religiosa americana. Isso é um
significante que articula a política americana para além da política prosaica.
Faz ex-istir a vida americana como cultura política religiosa civil, como
queriam os federalistas?
Não são palavras, são
significantes!
ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos.
Brasília: Edunb, 1992
FREUD. Obras Completas. O
mal-estar na civilização. v. XXI. RJ: Imago, 1974
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