sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Guerras feudais, Príncipe feudal, jogos feudais

 

José Paulo 

 

Um problema da história da civilização política é a paz no campo político de imagens/textual. Do século XVII, o Estado mercantilista barroco teve a Igreja como aparelho de hegemonia que estabeleceu um campo político pacífico (Benjamin: 80). O Estado feudal estabeleceu um campo político da guerra feudal:

“Les combats particuliers, les duels, les recontres sont des actes que ne constituent point un état; et à l’égard des guerres privées, autorisées par les établissemens de Louis IX roi d france et suspendues par le paix de Dieu, ce sont des abus du governement féodal, systeme absurde naturel, et à toute bonne politie”. (Rousseau. 1964: 357).

As guerras feudais particulares não constituem um Estado. As máquinas de guerra não criam um Estado. O aparelho de contrahegemonia já é, virtualmente, a criação de um Estado. O aparelho de hegemonia De Estado pode criar e conservar um campo político pacífico.  

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A tela cibernética não é um trovão em um céu azul. Ela instaura e agencia infralógica  e supralógica da gramatica da formas ideológicas de afecções como: ódio, ira santa, pulsão de morte grotesca e guerras  particulares etc. Quem autoriza as guerras feudais é o Estado feudal/virtual da multinacional. As relações técnicas de produção fazem pendant com a gramática das formas ideológicas das afecções no cérebro humano. A família, a vizinhança. a polis, a sociedade civil, o aparelho de Estado são realidades da possível guerra feudal particular e/ou pessoal. O aparelho de administração da corporação cibernética de cibernautas [do Estado virtual/feudal multinacional] funciona pela lógica da guerra feudal contra o usuário. Uma classe dominante virtual é uma máquina de guerra feudal que quer ser hegemônica em relação aos Estados territoriais e seus povos territoriais de cibernautas [o influenciador é uma figura sublunar do campo político virtual].  Vivemos uma época da fabricação do povo virtual/feudal, súdito do Estado feudal/virtual da multinacional. A cidadania virtual é uma mercadoria [ela obedece à lógica da mercadoria]. Portanto, a gramática da mercadoria constitui o laço social entre o cibernauta e o Estado virtual/feudal.  

Já a gramática da modernidade de Rousseau gira em torno do inimigo, da relação entre coisas [Estados territoriais], e não das relações entre seres humanos:

“La guerre n’est donc une rélation d’homme à homme, mais une rélation d’Etat á Etat, dans laquelle les particuliers ne sont ennemis qu’aaccidentellement, non point comme hommes ni même comme citoyens (a), mais comme soldats; non point comme membres de la patrie, mais comme ses defenseurs. Enfin chaque Etat ne peut fixer avoir pour ennemis que d’autres Etats et non pas des hommes, attendu qu’entre choses de divers natures on ne peut fixer aucun vrai rapport”. (Rousseau. 1964:357).

A pós-modernidade é a subsunção da modernidade rousseauniana. Ela é a abertura de portas (Dumézil:50) para a emergência do Estado feudal/virtual como seu campo político sublunar das guerras feudais, guerras particulares. O problema da paz no campo político é abolido, esquecido, na tela feudal/virtual. As classes sociais, a sociedade civil e o Estado de entendimento entram na subsunção do moderno ao campo sublunar político feudal/virtual. Um efeito mais real que o próprio real, por exemplo, é a substituição da soberania popular da cultura nacional/popular pela audiência do cibernauta que decide a eleição.

Rousseau:

“Ce principe est même conforme aux maximes établies de touts les tems et à la pratique constante de tous les peuples policés. Les déclarations de guerre sont moins des avertissements aux puissances qu’à leurs sujets. L’étrangers, soit roi, soit particulier, soit peuple, qui vole, tüe ou détient les sujets sans déclarer la guerre au prince, n’est pas un ennemi, c’est un brigand. Même en pleine guerre un prince juste s’empare bien en pays ennemie de tout ce qui appartient au public, mais il respecte la personne etr les biens des particuliers; il respecte des droits sur lesquels sont fondés les siens. La fin de la guerre étant la destruction de l’Etat ennemie, on a droit d’en tuer les défenseurs de l’Etat ennemie qu’ils ont les armes à la main; mais sitôt qu’ils les posent et se rendent, cessant d’être ennemies ou instruments de l’ennemie, ils redeviennnent simplement hommes et l’on plus de droit sur leur vie. Quelquefois on peut tuer l’Etat sans tuer un seul de ses membres: Or la guerre ne aucun droit qui ne soit pas ceux de Grotiu; ils ne sont pas fondés sur des aurtorités de poetes, mais ils dérivent de la nature des choses, et son fondés sur la raison”. (Rousseaus. 1964: 537-38).

A gramática da guerra é a gramática das coisas reguladas pela razão. Qual razão? Logos clássico ou moderno, ou será a gramática lógica das coisas, dos fenômenos do campo social da guerra na civilização política, isto é, policiada.

A gramática da estrutura ideológica trifuncional de dominação é coisa da polis/sociedade/Estado:

“Trinta, quarenta gerações sucessivas imaginaram a pefeição social sob a forma da trifuncionalidade. Esta representação mental resistiu a todas as pressões da história. É uma estrutura”.

“Estrutura imbricada numa outra, mais profunda, mais ampla, dominante: o sistema igualmente trifuncional que os trabalhos de Georges Dumézil admiravelmente situaram nos modos de pensamento dos povos indo-europeus. Entre as três funções presentes em tantos textos recolhidos desde o Indo até à Islândia e à Irlanda, a primeira enunciando, em nome do céu, a regra, a lei, aquilo que promove a ordem; a segunda, brutal, veemente, forçando a obedecer, e, finalmente, a terceira, de fecundidade, de saúde, de abundância, de prazer, que conduz à realização dos <exercícios de paz> de que fala Charles Loyseau. E por outro lado é evidente a relação entre as três ordens> desse mesmo Loyseau, os três <caminhos> do senhor Torquat, os padres, os guerreiros e os camponeses dos bispos de Combrai e de Laon. De uma tal evidência que de nada serve fazer suposições, a não ser para melhor delimitar a investigação, cujos resultados estão expostos neste livro”. (Duby. 1978:16).

A estrutura tripartite trifuncional é a gramática do campo político ideológico da civilização política. (Dumézil: 83). A relação entre ideologia e gramática foi pensada por Roland Barthes:

“Havemos de ver , por exemplo, que a unidade ideológica da burguesia [isto é, clássicos e românticos] a forma não podia ser dilacerada, visto que a consciência também não estava”. (Barthes. 1973: 14).

Vivemos em uma época da consciência histórica (Gadamer: desintegrada:

“Segundo Aristóteles, dá lugar a dois fenômenos correlativos seguintes: ao espírito de discernimento da situação de outro e a tolerância ou indulgência que disso resulta. Assim, pois, o que é discernimento compreensivo senão a virtude de saber julgar equitativamente a situação do outro”. (Gadamer: 94).

A consciência é uma forma ideológica da qual a figura trifuncional aprece como forma ideológica;

‘Assim localizada a interrogação remete para outra categoria de problemas. O modelo das três funções sociais, esse postulado, essa evidência cuja existência jamais se provou o que só se evoca nas suas ligações com uma cosmologia, uma teologia, é claro está, com uma moral que serve de base a uma dessas <formações discursivas polêmicas> que são as ideologias, colocando pois ao serviço de um poder uma imagem simples, ideal, abstrata, da organização social, que ligações mantém esse modelo com o concreto das relações sociais? A ideologia, sabemo-lo bem, não é reflexo do vivido, mas um projeto de agir sobre ele. Para que a ação tenha qualquer possibilidade de eficácia, é preciso que não seja demasiado grande a disparidade entre a representação imaginária e as <realidades> da vida”. (Duby. 1978:20).                          

A gramática ou tela gramatical narrativa [ou escrita política]:

“a escrita, ao contrário, está sempre enraizada num além da linguagem, desenvolve-se como um germe e não como uma linha, manifesta uma essência e uma ameaça de um segredo, é uma contracomunicação, intimida”. (Barthes. 1973: 28).

Trata-se de ver a gramática ou escrita política como aparelho de contrahegemonia [contracomunicação], como o Príncipe da guerra barroca da atualidade:   

“Portanto, encontramos em qualquer escrita a ambiguidade de um objeto que é simultaneamente linguagem e coerção: há no fundo da escrita uma <circunstância> estranha à linguagem, há como que o olhar de uma intenção que já não é a da linguagem. Este olhar pode muito bem ser uma paixão da linguagem, como na escrita literária; pode também ser a ameaça de uma penalidade, como nas escritas políticas\; a escrita tem a função de reunir com um só traço a realidade dos atos e a idealidade dos fins. É por isso que o poder ou a sombra do poder acaba sempre por instituir uma escrita axiológica, em que o trajeto que separa habitualmente o fato do valor é suprimido no próprio espaço da palavra, dada simultaneamente como descrição e como juízo. A palavra torna-se um álibi [isto é, um algures e uma justificação]. Isto, que é verdadeiro para as escritas literárias, em que a unidade dos signos é incessantemente fascinada por zonas de infra ou de ultralinguagem, é ainda mais verdadeiro para as escritas políticas, onde o álibi da linguagem é simultaneamente intimidação e glorificação: efetivamente, o poder e o combate é o que produzem os tipos de escrita mais puro”. (Barthes. 1973: 28).

O poder e a luta do aparelho de contrahegemonia criam e recriam a gramática de Estado puro, ou seja, do Estado ontológico lacaniano da extração e distribuição da mais-valia pública ou riqueza da economia pública. A psicanálise é a gramática do aparelho de contrahegemonia do Estado lacaniano barroco? Em Philonenko, encontra-se uma história materialista e paraconsistente da paragramática do aparelho de hegemonia de Estado platônico:

“Parménides passava por ter sido o legislador de Eleia, e o pitagorismo fora, simultaneamente, uma teoria e uma organização política; quanto aos Turianos, teriam pedido uma legislação a Protágoras. Convencido de deter senão a verdade, pelo menos o método, Platão acabou por acreditar que era o único capaz de ensinar qual a tarefa do bom governo. Portanto, não surpreende que tenham existido, não sei sob que forma precisa, pequenos Estados platônicos – Atárnea (a oeste de Pérgamo), Assos (a norte de Lesbos), Cépsis (na Troáde). Diz-se que Hérmias, Corisco, Erasto foram os príncipes”. (Philonenko: 1977: 22).

O Príncipe moderno platônico foi capaz de dirigir um golpe de Estado para criar um Estado segundo a gramática dialética/materialista da política. (Philonenko. 1977: 23).  

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O Estado lacaniano é o grau zero da gramática do signo. (Barthes. 1973:16). A gramática do significante barroco é sem signo, isto é, sem o referente sociedade classes, e sim na relação como a dialética aspecto dominante e aspecto dominado na guerra feudal ou barroca pela distribuição da mais-valia pública na Constituição.

O Estado lacaniano é uma estrutura de dominação gramatical [ou seja, tela gramatical de dominação/hegemonia] com portas para entrada e saída do campo político da pólis e feudal europeu. São três portas: a pratica política, a pólemos/stasis, o trabalho rural, isto é, o campesinato. (Dumézil. 1985: 50,51). O capital capitalismo desintegrou a tela gramatical tripartite e trifuncional. Surge o poder de Estado [como forma ideológica burguesa] e como efeito da sociedade burguesa que dissolve o <poder de governo> da tela gramatical narrativa antiga e feudal:

Le philosophe n’aurait-il pas le droit de s’élever au-dessus de la foi qui régit la grammaire? Tous nos respect aux gouvernantes; mais ne serait-il pas temps pour la philosophie d’abjures la foi des gouvernantes”. (Nietzsche: 54).

O poder de governo é um fenômeno da fé na gramática governante/governado, dominante/dominado. A filosofia pode ser uma gramática de um aparelho de contrahegemonia. A porta do gramático já é a quarta porta, ela não é um aporta do céu ou da terra; ela não é do Estado celestial ou do territorial. O que ela é?

A porta do gramático da realidade do campo político é uma porta virtual. Por ela, entra o general intellect gramatical (Bandeira da Silveira; 2022), isto é, a pequena burguesia proprietária de capital cultural. (Bourdieu: 39). A pequena burguesia do capital cultural general intellect gramatical é o trabalho que entra pela porta do trabalho no campo político.  

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Nos últimos seis meses, 25 milhões de mães da famílias das classes baixas neopentecostal se juntaram aos 40 milhões de jogadores já existentes de jogos de azar bets. Tal fato levanta um problema em analogia com a antiguidade grega:

“O comentário de Goethe faz da Odisseia, numa carta cuidada a Schiller de 14 de Fevereiro de 1798, é importante. O Grego é o homem inicente, próximo do estado de natureza e na Odisseia, a radiosa imagem de Nausica apaga qualquer preocupação profunda. É neste sentido que Schiller, nas ‘Cartas sobre a educação estética do homem”, ao querer regressar a esta inocência, pôde escrever essa frase demasiada célebre: <O Homem só joga onde é Homem no sentido acabado do termo e só é plenamente Homem onde joga>. Para Schiller, o Grego é o Homem no estado de natureza, que vive na inocência do mito, que concilia o dever (Pllicht) e a inclinação (Neigung) na espontaneidade. É a imagem da aurora grega. (Philonenko. 1997: 32).

A mulher dos jogos de azar bets nõa é uma criação espontânea da realidade cotidiana brasileira. Um Estado feudal, virtual, mafioso bets conta com o Banco para dar a elas cartão de crédito para elas se endividarem. Tal fato põe e repõe o problema da consciência das classes baixas como fenômeno lúdico.

Recorro a Sartre, um exímio conhecedor da relação entre consciência e percepção. A estrutura de dominação ideológica lúdica se baseia na ideologia da prosperidade do Estado feudal/virtual/mafioso bets.

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A imagem é forma de consciência; ela é um fato da estrutura de dominação ideológica:

‘Ao iniciarmos a reflexão, percebemos que cometíamos até agora um duplo erro. Pensávamos, sem sequer nos darmos conta, que a imagem estava na consciência e que o objeto da imagem na imagem. Fazíamos da consciência um lugar povoado de pequenos simulacros, e esses simulacros eram as imagens. Sem dúvida alguma, a origem dessa ilusão deve ser procurada em nosso hábito de pensar no espaço e em termos de espaço. Nós a chamaremos ilusão da imanência”. (Sartre: 16-17).

A estrutura de dominação ideológica pós-modernista é a imagem como simulacro de simulação:

“Simulacros de simulação, baseados na informação, no modelo, no jogo cibernético, - operacionalidade total, hiper-realidade, objetivo de controle total”. (Baudrillard. 1991: 151).

Os jogos cibernéticos são a subsunção dos jogos caligráficos de Magritte. Em jogos cibernéticos, a imagem e a linguagem não se cruzam em um lugar-comum

“Magritte faz tudo o que é preciso para reconstituir (seja pela perenidade de uma obra de arte, seja pela verdade de uma lição das coisas) o lugar-comum à imagem e à linguagem”. (Foucault: 34).

Os jogos cibernéticos desintegram a consciência perceptiva dos fenômenos, pois a imagem existe como simulacro de simulação de um fenômeno autêntica A consciência perceptiva das massas pós-modernistas toma a revolução moderna como real pelo hábito de pensar no espaço e em termos de espaço, como imagem, pois, o tempo político é abolido. Não há mais passado:

“Na percepção, um saber se forma lentamente; na imagem, o saber é imediato. Vemos agora que a imagem é um ato sintético que une a elementos mais ´precisamente representativos um saber concreto, não imaginado. Uma imagem não se aprende; é exatamente organizada como objetos que se aprendem, mas, na realidade, a imagem se dá inteira como aquilo que ela é, desde seu aparecimento”. (Sartre: 21-22).

Uma estrutura de dominação ideológica sem passado desintegra a consciência perceptiva como um saber que se adquire via educação das massas. A escola pública perde seu sentido como educação das massas das classes baixas visando constituí-las como cultura nacional popular. O saber imediato da imagem estabelece um tempo fragmentado, descontínuo, dissolvendo a realidade como cultura política. A crise da democracia representativa se deve a essa substituição do saber da consciência perceptiva pelo saber instantâneo, imediato, da imagem. O saber da consciência implica em ele ser regido pelo princípio de realidade, ele é um saber de um aprendizado coercitivo; o saber por imagem é puro princípio de prazer. A imagem é o saber lúdico dos jogos de azar, que aboli a ética da coerção de qualquer forma de trabalho.

O Estado feudal, virtual, mafioso une o jogo de azar ao desejo de ganhar dinheiro sem coerção, ganhar riqueza pelo princípio de prazer. As massas são conduzidas pela imagem lúdica do paraíso perdido na terra: auri sacra fames.

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Dominante é um efeito contradição com o dominado, este como soberania popular. A soberania popular é a cultura nacional popular territorial dos jogos de caligrafia. Ela é um fenômeno do Estado de entendimento dos jogos de caligrafia de Magritte/Foucaultianos. O aspecto dominante da contradição existe em um campo feito por contradições, um campo político materialista paraconsistente e parasintático. A eleição é uma necessidade para instituir e (re) instituir   governo do dominante sobre o dominante e sobre o dominado. O Estado de entendimento é aquele dos jogos de caligrafia da imagem/textual. Daí as ditaduras eletivas que parecem querer se apresentar como ersatz de democracia das Américas. O bolsonarismo é um movimento que quer uma ditadura eletiva após a desintegração da democracia dos jogos de caligrafia da Constituição de 1988. NOS EUA, Donald Trump é o fenômeno análogo ao bolsonarismo. Na Venezuela, Maduro cria a ilusão de democracia para sua ditadura mafiosa. Na Argentina, Milei faz um governo ditatorial eletivo no campo político peronista democrático. As guerras feudais são a gramática da ditadura feudal das Américas.

As relações técnicas de produção territorial/subdesenvolvidas do campo político latino-americano fazem pendant com as relações técnicas de produção virtuais do Estado feudal, virtual mafioso do capitalismo criminoso do Banco. (Platt; 2017). O Estado feudal, virtual/territorial, mafioso tem um passado reprofundo sem passado do Estado profundo colonial. Bandeira da Silveira; 2021).

A gramática jornalística do Youtube já é o campo da democracia constitucional do Estado de entendimento dos jogos de caligrafia do passado/presente/futuro. É uma outra forma d dominação ideológica se procura fazer a passagem em ato do século XX para o Século XXI. a ilusão imanente do século XX existe na prática política do dominante. O banqueiro/intelectual carioca Armínio Fraga vive como se vivesse no século XX. Ora:

“Como relação social de produção, o capital é mercadoria, capital mercantil, capital comercial, capital industrial, capital fictício etc. As partes ou frações do capital não estão subsumidas a um todo, a um capital que englobe todos os fragmentos de capital. [O capital é um campo feudal fragmentado paraconsistente e materialista]. No campo político, as partes do capital lutam [fazem guerras particulares] para dominar as instituições do Estado, que são pedaços de Estado como governo nacional, parlamento, judiciário que se despedaça e mil partes, governos locais, burocracia pública. O Estado nacional não é uma totalidade. Como a filosofia da identidade opra com totalidade e conceito, ela ‘explica’ a existência e reprodução da sociedade do capital a partir do capital como um todo. Este todo da identidade é como se fosse dominação, coerção, segurança burguesa, e hegemonia sobre o Estado e a sociedade. Tal ilusão é um pressuposto do agir dos agentes no campo político”. (Bandeira da Silveira. 2024ª: cap. 26).

A imagem do capital identitário é a invasão do século XX burguês no século XXI feudal. O capital é um fenômeno do barroco/feudal da modernidade do século XXI. O século XX desencantou o Estado de entendimento dos jogos de caligrafia. O que acontece no século XXI como Estado de entendimento barroco/iluminista dos jogos vede caligrafia do Youtube e do Estado da civilização policiada, do Estado de polícia/logico?

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 Heidegger estabeleceu, sem o saber, a distinção entre Estado de Entendimento dos jogos de caligrafia que voam e sonham com o Estado substantivo, coisa em Rousseau e aparelho de Estado em Marx:

‘Que palavra é essa ‘o Ser’, segundo sua morfologia? Ao ‘ser’ correspondem outras formas, como ‘o voar’, ‘o sonhar’, ‘o chorar’ etc. Tais formas linguísticas se comportam na linguagem, como’ o pão’, ‘a habitação’, ‘a erva’, ‘a coisa’. Não obstante, logo descobrimos nas primeiras uma diferença. Podemos reduzi-las facilmente aos verbos, ‘voar’, ‘sonhar’, ‘chorar’ etc... o que as segundas parecem não permitir. Com efeito, que há para ‘a habitação’ a forma verbal ‘habitar’; ‘ele habita no bosque’. Todavia, quanto ao significado, a relação gramatical entre ‘a habitação’ e ‘habitar’ é diferente da mesma relação entre ‘o sonhar’ (o sonho) e ‘sonhar’. Por outro lado, há formações verbais, que correspondem exatamente às primeiras (o voar, o sonhar) e todavia possuem caráter e significação idênticos a ‘o pão’ , ‘a habitação’. Por exemplo: ‘o embaixador deu um jantar’, ‘o soldado se conhece no andar cadenciado’. Nesses casos já não atendemos ao fato de pertencerem tais formas a um verbo. O verbo se fez substantivo, um nome, seguindo o caminho de uma forma determinada, que se denomina em latim ‘modus infitivus”. (Heidegger: 83-84).   

Em Hegel, o Estado de entendimento é o seguinte:

“L’intitulé général Constitution recouvre une théorie de l’Etat. Elle commence par poser que l’Etat est pour ainsi dire l’esprit de la loi”. (Taminiaux: 57).

<Espírito da lei> é a tela verbal narrativa do ser do Estado de entendimento como voar e sonhar e chorar. O aparelho de Estado é uma coisa sem afecções, ou do bem, ou do mal. Já o Esatdo de entendimento possui afecções como ethos e páthos. Assim ,não é razoável falar de um desencantamento do Estado, como em Weber:

“Avantage techinique, uniquement: la rationalité de l’Etat moderne ne s’entend plus ici dans le sens d’une liberté supérieure, tout au contraire. L’administration bureaucratique s’offre comme la seule forme adéquate aux besoins de l’administration de masse: que le gigantisme des sociétés contemporaines , en termes démographiques, par rapport à toutes les sociétés historiques connues, restreigne de façon drastique le champ des possibles en matière de fonctionnement politico-administratif est l’un des présupposés fondamentaux de la sociologie politique wébérienne. Et c’est là précisément ce qui fonde son pronostic relatif à l’avenir de notre civilization. Des exemples antiques, celui de lEgypte notamment, témoignent déjà de ce que, une fois parvenue à la toute-puissance, la bureuaucratie ne peut plus disparaître, sinon avec l’effrondrement général de la civilization dont elle est solidaire. Cette irréversibilité de la domination bureaucratique est plus définitive encore dans l ecas de la bureaucratique des Etas occidentaux modernes, à raison même de as plus parfait rationalité. La mandarin de l’ancienne chine, le fonctio nnaire égyptien, romain ou byzantin, n’avaient à gérer des affaires infiniment moins complexes que ne le sont les tâches de l’Etat contemporain. Ainsi ses décisions pouvaient-elles être en partie liées pas des usages traditionnnels ou des príncipes patriarcaux. Il n’en va plus de même du fonctionnaire moderne: seule la connaissance qu’il a des contraentes impliquées par les systemes objectifs, qu’il s’agisse de la technique, de l’économie ou de la politique, comande l’orientation de son action. Le savoir spécialisé qu’il doit avoir (t sur la base duquel il est recruté) assure  as Victoire sur les résidus des modes d’administration obsolètes, telle celle des notables en Angleterre ou en France, et condamne par avance tout tetative de subversion de son pouvoir”. (Colliot-Thèléne:20).

 Weber criou o campo das ideologias do Estado mercantilista, imperialista, colonialista-europeu, enfim, da estrutura de dominação ideológica da burocracia lógica. A influência desse campo no Brasil é notável no final do século XX e ainda na segunda década do século XXI. Entramos em uma época do fim do Estado weberiano e sua estrutura de dominação ideológica da burocracia. Outras estruturas de dominação se apresentam como formas ideológicas do século XXI:

“O mercantilismo do capital asiático é a estrutura de dominação ou poder asiático que traça um caminho alternativo ao fim do capitalismo, fim do estado nacional, fim da política e outros milenarismos”.

“A outra gramática da dominação é a estrutura autoritária funcionando pela relação de mandonismo e obediência passiva, ou seja, sem crítica da gramática. Essa estrutura de dominação caracteriza no campo político a gramática do cesarismo”. (Bandeira da Silveira. 2024b: 511).

Cesarismo ou Estado feudal, virtual/territorial asiático são as gramáticas que assombram as Américas na quase quarta década do século XXI.      

 

 

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Brasil Profundo. EUA: amazon, 2021

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Gramática do general intelect. EUA: amazon, 2022

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Além da época posmoderna. EUA: amazon, 2024a

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Ciência política materialista. EUA: amazon, 2024b

BARTHES, Roland. O grau zero da escrita. Lisboa: Edições 70, 1973

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Lisboa: Relógio D’Água, 1991

BENJAMIN, Walter. Origine du drame baroque allemand. Paris: Flammarion, 1985

BOURDIEU, Pierre. Raison pratiques. Sur la thórie de l’action. Paris: Seuil, 1994

CALLIOT-THÉLÈNE, Catherine. Le désenchantement de l’État. De Hegel à Max Weber. Paris: Minuit, 1992

DUBY, Georges. Les trois ordres ou l’imaginaire du féodalisme. Paris: Gallimard, 1978

DUMÉZIL, Georges. L’oubli de l’homme et l’honneur des dieux. Paris: Gallimard, 1985

FOUCAULT, Michel. Isto não é um cachimbo. RJ: Paz e Terra, 1988

GADAMER, Hans-Georg. El problema de la consciência histórica. Madrid: Tecnos, 1993

HEIDEGGER, Martin. Introdução à metafísica. RJ: Tempo Brasileiro, 1978

NIETZSCHE. Par-delà bien et mal. Paris: Gallimard, 1971

PHILONENKO, Alexis. Lições platônicas. Lisboa: Instituto Piaget, 1997

PLATT, Stephen. Capitalismo criminoso. SP: Cultrix, 2017   

 SARTRE, Jean-Paul. O imaginário. SP: Ática, 1996 

  TAMINIAUX, Jacques. Naissance de la philosophie hégélienne de l’État. Paris^Payot, 1984         

  

    

              

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