José Paulo
“Não é a toa que aqui nos
serviremos da palavra termo para
designar o simbólico em questão”. (Lacan. S. 19: 167).
Termo é um conceito de Charles S. Peirce:
“Ou pode haver uma relação que
consiste no fato da mente associar o signo com seu objeto; neste caso, o signo
é um nome (ou símbolo). (Peirce:
11-12).
O signo representa a linguagem ou
campo simbólico e o objeto ou referente a realidade. A gramática faz pendant
com a posição de verdade na linguagem através da lógica:
“porque a lógica é isso, é situar
na gramática aquilo que assume a forma da posição de verdade, aquilo que torna
a linguagem adequada para produzir a verdade. Adequada não significa que ela sempre
o conseguirá. Então, investigando bem suas formas, acredita-se chegar perto do
que vem a ser a verdade”. (Lacan. S. 19; 177).
O problema da existência da
realidade como posição de verdade separa Lacan e Marx?
Lacan diz:
“Mais de uma coisa no mundo é
passível do efeito do significante. Tudo o que está no mundo só se torna fato,
propriamente, quando com ele se articula o significante. Nunca, jamais surge
sujeito algum até que o fato seja dito”. (Lacan. S. 16: 65).
Marx diz:
“Como en general en toda ciencia
histórica, social, al observar el desarrollo de las categorías económicas hay
que tener siempre en cuenta que el sujeto – la moderna sociedad burguesa en
este caso – es algo dado tanto en realidad como en la mente, y que las categorías
expresan por lo tanto formas de ser, determinaciones de existencia, a menudo
simples aspectos, de esta sociedade determinada, de este sujeto, y que por
lo tanto, aun desde el punto de vista científico, su existencia de ningún modo
comienza en momento em que se comienza a
hablar de ella como tal”. (Marx. 1982: 27).
A gramática materialista de Marx diz
que a sociedade burguesa moderna (sujeito) tem uma existência anterior ao Marx
começar falar dela. Lacan diz que Marx estabeleceu a sociedade moderna burguesa
como sujeito a partir da articulação do significante dito por Marx: capital do
livro “O Capital” ou do “Grundrisse”.
O capital é o fato dito que produz a sociedade burguesa moderna como efeito do
significante ou discurso capitalista.
A lógica do capital situa na gramática ou
discurso de Marx a posição da verdade, ou seja, aquilo que torna a linguagem
marxista adequada para produzir a verdade. Ela nem sempre conseguirá produzir a
verdade - “Então, investigando bem suas formas, acredita-se chegar perto do que
vem a ser a verdade”.
II
Lacan diz:
“Há uma face do saber sobre a
verdade que extrai sua força de negligenciar totalmente o conteúdo dela.
Isso permite asseverar que a
articulação significante é de tal forma sua hora e seu lugar que a verdade não
é nada senão essa articulação”. (Lacan. S. 19: 168).
A verdade do nosso mundo é a
articulação significante capital/trabalho da sociedade industrial: sua
gramática capitalista. No Ocidente, estratégias tornaram precária a articulação
significante em tela. A articulação significante
define a realidade (sujeito) como seu efeito. Mas a realidade continua se
distinguindo do significante, do discurso:
“Resta deixar claro que é
realmente de sujeito que se trata, o que é corroborado pelo fato de que, na
minha lógica, o sujeito, se exaure ao se produzir como efeito de significante,
mantendo-se tão distinto deste”. (Lacan. S. 19; 166).
O sujeito se enfraquece, torna-se
exausto, absorvido, consumido, haurido e também está sujeito a ser invadido por
estratégias de sua precarização absoluta ao ser produzido como efeito do
significante e não ser reduzido a um epifenômeno do significante capital. Isto
significa uma porta aberta para o sujeito em colapso?
Lacan diz:
“A verdade ser mostrada, no
sentido passivo, revela assumir um sentido ativo e se impor como demonstração
ao ser falante, que nesse momento não pode fazer mais do que reconhecer não
apenas que habita o significante, mas que não é nada além da marca deste. A
liberdade de escolher seus axiomas, isto é, o ponto de partida escolhido para
essa demonstração, consiste apenas, com efeito, em dela sofrer como sujeito as
consequências, as quais, por sua vez, não são livres”. (Lacan. S. 19: 168).
O sujeito sociedade burguesa
moderna habita o significante capital/trabalho. Ao ser produzido como efeito do
significante (discurso capitalista), ele se exaure, e estar sujeito à invasão
de estratégias que geram sua precarização absoluta como sociedade moderna
articulada por uma ordem do direito moderna.: sociedade de direito do trabalho
ocidental.
A pauperização absoluta do
trabalho é uma relação da origem da sociedade industrial moderna. A luta de
classe do trabalho, a mias -avalia relativa e a sociedade salarial significam a
saída da pauperização. Hoje, há o retorno da pauperização absoluta sob novas
formas, todas significando a desarticulação da sociedade de direito do trabalho
com consequências graves para o sujeito sociedade capitalista.
O Ocidente criou estratégias
(capitalismo globalizado, por exemplo) para desfazer a potenciada da gramática
articulação significante para sua autodestruição:
“El capital es la contradicción
en proceso (puesto) que se esfuerza por reducir a um mínimo el tiempo de
trabajo como única medida y fuente de la riqueza. Disminuye el tiempo de
trabajo en la forma de tiempo de trabajo necessario, para aumentarlo en la
forma del superfluo; pone, por tanto, cada vez más el superfluo como condición
– question de vie et de mort – del necesario. Por un lado despierta a la vida
de todos los poderes de la ciencia y de la naturaliza, así como de la
cooperación social y del intercambio social, para hacer que la creación de la
riqueza sea (relativamente) independiente del tienpo de trabajo empleado em
ella. Por el otro lado, procura medir con el tienpo de trabajo esas gigantescas
fuerzas sociales creadas por esta suerte y reducirlas a los límites
imprescindibles para que el valor ya creado se conserve como valor. Las fuerzas
productivas y las realaciones sociales -
unas y otras, aspectos diversos del desarrollo del individuo social – se le
aparecen al capital únicamente como medios, y no son para él más que medios
para producir fundándo-se em su mezquina base. In fact, empero, constituyen las
condicines materiales para hacerla volar por los aires”. (Marx. 1982:
XXXVI-XXXVII).
O desenvolvimento capitalista gerou a
sociedade do trabalho científico, ou mais exatamente, trabalho simbólico como
trabalho supérfluo como condição do trabalho necessário para o ato da produção
da riqueza. Esta condição se tornou um peso inútil para a reprodução ampliada
do capitalismo ocidental e um fato utópico de uma sociedade de classes em
direção a uma revolução criativa pós-capitalista. Tal fato está na base da
criação da estratégia capitalismo globalizado (globalização que tem como elo
mais débil a União Europeia), e também estratégias para o deslocamento da
sociedade industrial capitalista - via capitalismo corporativo mundial para a
Ásia, em especial, a China e Índia. A técnica cyber só se torna tempo de
trabalho supérfluo utilmente preponderante na reprodução da acumulação
planetária com o capitalismo corporativo mundial cyber fazendo pendant como o
neomercantlismo de Estados asiático.
IV
O capitalismo é a realização do
capital/trabalho como processo:
Es de la naturaleza de este
proceso el que su comienzo y su fin deban no sólo estar separados el uno del
otro, sino hasta en aparente conflicto. Pero el conflito no es otro que aquél
que hay etre potencia y acto, entre el mero ‘proyecto’ de un concepto y su
completo desarrollo y repercusión”. (Cassirer1971: 19).
O “projeto” de um conceito é o discurso em potência, discurso virtual
ou gramática atualizado no processo em discurso completo desenvolvido e sua
repercussão. O capitalismo é uma gramática ocidental em potência em conflito
com o ato (atualização) do “projeto” de um conceito ou gramática, gramatica
atualizada no Oriente asiático.
A totalidade concreta é potência
e ato. Assim, é necessário que o sujeito (sociedade capitalista ocidental)
esteja sempre presente na gramática como premissa. Ao substituir a sociedade
capitalista ocidental por uma sociedade capitalista asiática no comando da
economia mundial, o fim entra em conflito com o começo.
Marx diz:
“El sujeto real mantiene, antes
como después, su autonomía fuera de la
mente, por lo menos durante el tiempo en que el cerebro se comporte únicamiente
de maneira especulativa, teórica. En consecuencia, también en el método teórico
es necesario que el sujeto, la sociedade, esté siempre presente en la
representación como premissa”. (Marx> 1982: 22).
O sujeito real não é mais a
sociedade capitalista ocidental e sim a sociedade capitalista industrial
asiática do capitalismo corporativo mundial cyber. Na mente ocidental, o
sujeito real continua sendo uma inexistente sociedade capitalista ocidental. A
que se deve tal autoilusão?
V
O idealismo tem como objeto as
formas culturais da história universal como linguagem, conhecimento, religião e
mito. As formas são estudadas como totalidade concreta do espírito como
princípio lógico ou lei do método dialético em Hegel, apogeu do idealismo
clássico. (Cassirer1971:24). Com o materialismo da modernidade, a cultura passa
a ser um campo ao lado dos campos econômico e político. Marx trabalha neste
diapasão.
O princípio lógico do campo
cultural da história universal cede seu lugar à gramática da sociedade da
modernidade que põe e repõe a unidade das formas econômica, política e
cultural. A gramática da sociedade é capitalista; ela tem como princípio lógico
da gramática em narrativa capitalista a articulação significante
capital/trabalho.
No século XXI, há as estratégias
de substituição da sociedade industrial capitalista pelo capital fictício no
comando da economia, cultura e política no Ocidente. As estratégias são: a
financeirização da economia, o capitalismo globalizado, a União Europeia, a
economia industrial asiática, em especial a chinesa, o sistema neomercantilista
de Estados asiáticos, os Estados Unidos como enclave científico do capitalismo
corporativo mundial cyber cuja história natural econômica faz pendant com o
neomercantilismo asiático. Todos os fatos supracitados constituem os elos da
cadeia capitalista mundial.
Na atualidade, o financista e
profeta capitalista Soros diz que a união Europeia é o elo mais fraco da cadeia
em questão. Ele fala de uma União Europeia em colapso pois a lógica da União
Europeia se dissolve no ar com o Brexit. A chefe do FMI Lagarde fala da
desaceleração da economia chinesa, do Brexit, do ajustamento dos juros, da
guerra comercial mundial entre EUA e China como fenômenos que seriam a causa
múltipla da gramática capitalista em colapso.
A gramática capitalista em colapso
é irreversível?
Se EUA e China fazem parar a
guerra comercial, a China reverterá a desaceleração econômica? Se a política
britânica suspender o Brexit, a União Europeia evita o colapso? Se o capital
fictício mundial mudar a política de ajustamento de juros, o capitalismo
globalizado deixará de ser um capitalismo em colapso?
Vivemos em uma ´época da lógica
da reversibilidade?
CASSIRER, Ernest. Filosofía de
las formas simbólicas. México: Fondo de Cultura Económica, 1971
LACAN, Jacques. O Seminário. De
um outro ao outro. Livro 16. RJ: Zahar, 2008
LACAN, Jaques. O seminário. Livro
19. RJ: Zahar, 2012
MARX. Elementos fundamentales
para la crítica de la economia política. Grundrisse (1857-1858). España: Siglo
XXI, 1982
PEIRCE, Charles S. Semiótica. SP: Perspectiva: 2000
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