terça-feira, 30 de outubro de 2018

CONDOTTIERO BOLSONARO: GUERRA E POLÍTICA


José PAULO

   

Capitão Bolsonaro é um intelectual?

Tal interrogação em tela é a chave para entender a anatomia do macaco pela anatomia do homem?

Jair Messias Bolsonaro é um intelectual no sentido de Gramsci: todo homem é filósofo!

Uma definição de cultura é aquela do homem cultivado ou pela cultura subjetiva, ou pela cultura objetiva. Nossa cultura é masculina, não apenas em seus conteúdos contingentes, mas em sua forma de cultura objetiva. (Simmel. V. 1: 155). Se Lula não foi cultivado por uma cultura formal, Jair Messias é um efeito de uma cultura formal militar. A escola militar cultural prepara oficiais para direção e comando da burocracia militar. No Brasil, os militares se envolveram na política com o putsch que destruiu a monarquia brasileira. Depois se envolveram na política como chefes de governo representativo e presidentes de ditadura.

A escola militar de oficiais se transformou em uma cultura política militar que guiou o golpe de Estado militar 1964 e a instalação do Estado militar 1964. Na cultura política militar, a ESG (Escola Superior de Guerra) se constituiu como uma escola intelectual militar. Bolsonaro não chegou na ESG e não foi educado inteiramente na cultura política militar. No entanto, foi das Agulhas Negras, escola universitária para a formação de jovens oficiais intelectuais.

Gramsci mostra que o Exército tem uma estrutura intelectual-burocrática similar ao do partido político.

ESTRATIFICAÇÃO DAS FUNÇÕES INTELECTUAIS
EXÉRCITO                                                                                        PARTIDO POLÍTICO

Estado-maior                                                                                  
Oficiais superiores realizam planos                                            Dirigentes
Oficiais subalternos garantem a execução                                 Quadros intermediários
Soldados                                                                                             Militantes de base
(Buci-Glucksmann: 49).

Jair Messias foi da escola dos quadros intermediários. Mas ele teve que estudar teorias da guerra e história da guerra (estratégia e tática, alvo e ataque, força e razão, publicidade e propaganda, opinião pública e opinião militar) para se graduar como tenente. Isto é o suficiente para denominá-lo como um intelectual, ou no sentido de Gramsci, ou no sentido comum acadêmico.

Na política, o presidente Messias pensou a política como continuação da guerra por outros meios, meios políticos. Na vida parlamentar medíocre não teve a oportunidade para aplicar o conceito global de política como guerra, de Napoleão Bonaparte. (Clausewitz: 15). Só pode manejar a filosofia da política napoleônica na eleição presidencial 2018.




Descobrir no ciberespaço a política como cibercultura da guerra, este foi o primeiro passo do capitão Bolsonaro.  Descobrir e fabricar uma ciberideologia antilulista radical, eis o segundo passo tático do presidente da República. São fatos que alavancaram Bolsonaro para um lugar no segundo turno da eleição 2018 e, finalmente, para a vitória.   

Se apresentar como enfant terrible da política parlamentar (ele que foi um enfant terrible militar), eis o passo a frente que o levou a atacar sistematicamente a democracia 1988 e sua Constituição. Tornar o STF um alvo tático de ataques feitos por uma artilharia pesada (com ajuda de seu filho artilheiro-deputado Eduardo), eis um modo de tentar pôr canga nos juízes do STF. Ameaçar alterar a composição do STF, eis uma tática que irritou o STF e trouxe esta instituição para um confronto aberto com a candidatura de Jair. Mas estas táticas foram um meio da política como guerra de ganhar aliados, obter milhões de votos.  

Ao ser declarado eleito pela contagem dos votos, o capitão Jair fez meia-volta, volver. Ele leu um discurso no qual se apresenta como constitucionalista e defensor eterno da democracia 1988, como seu herói, o Duque de Caxias foi defensor perpétuo da monarquia de d. Pedro II. A ligação pessoal de Jair com a casas real brasileira não é um acaso da política republicana. Talvez, o quase presidente Jair (ele ainda não assumiu o cargo) não seja um republicano em uma República sem republicanos.                      

                                                                                                       II

O capitão Bolsonaro é um estrategista da política brasileira assim como Napoleão III foi o estrategista da política europeia que destruiu a democracia francesa 1848. A diferença entre eles é que Napoleão III não tinha passado por uma a escola militar de oficiais. Ao fazer a Guerra contra a Prússia foi derrotado humilhantemente por Bismarck. Eduardo Bolsonaro declarou guerra a Venezuela. Seu Pai, um entusiasta da “paz” interna, vai criar uma comoção generalizada na América Latina com a perturbação da paz externa?

Enquanto a cabeça de Bolsonaro puder rolar no cadafalso do STF, a tática é apresentar o capitão Bolsonaro como Jairzinho paz e amor, em uma paródia soturna ao Lulinha paz e amor.   Ao tomar posse na presidência da República, então, o verdadeiro Jair Bolsonaro aparecerá como carne e osso, ou então com sua farda de gala de general 4 estrelas do Exército brasileiro., pois, ele será o comandante-mor das Forças Armadas nacionais: general dos generais!    

A estratégia de criar o bloco-de-poder NOVA DIREITA foi um golpe de mestre do capitão. Falar que os mass media são parte do seu Exército ideológico, eis a ratificação da interpretação que a psicanálise em gramática marxista vinha fazendo já há algum tempo. A Globo News é o centro tático nervoso ideológico do exército messiânico. Não obstante, a Nova Direita é um fenômeno político do programa mínimo do capitão.

O programa mínimo se declara ultraliberal ao gosto do Mercado Financeiro e do grande capital neocolonial mundial. A contradição principal da era do programa mínimo é aquela entre o bloco-de-poder ultraliberal, neocolonial e o Estado getulista 1988. O capitão dará um passo de cada vez?

Primeiro seu ministro da economia anuncia a Reforma da Previdência e o corte de privilégios do funcionalismo público. A Reforma da Previdência extinguirá os privilégios das castas burocráticas, menos os privilégios da casta burocrática militar? A inconsistência não será um problema, pois, os mass media defenderão a Reforma da Previdência do chicago boy conhecido, na gíria jornalística, como Posto Ypiranga. Quando o capitão comanda, os mass media fazem ordem unida.  

Teremos uma Reforma  da Previdência autocrática!

O que se anuncia no governo Bolsonaro é o uso da política externa como suplemento da política interna. O capitão é um admirador da política do americanismo atual, da política do equilíbrio de poder de Donald Trump.

O livro “A Guerra” da Biblioteca do Exército, de Quince Wright , se debruça com vagar no conceito política do equilíbrio do poder. O livro consta da bibliografia universitária dos cadetes das Agulhas Negras.

Há uma passagem do livro que cai como luva na interpretação da política de Trump:
“Um equilíbrio de poder estável, estimulando o comércio internacional, as comunicações e a difusão da cultura desenvolve condições favoráveis ao constitucionalismo, à democracia, às convenções e às organizações internacionais, que tendem a unificar a civilização e a estabelecer preferência do bem-estar sobre o poder, enfraquecendo desta forma a disposição dos governos em dar atenção à força”. (Wright: 107).  

Quince parece falar da política do equilíbrio do poder da civilização do globalismo ultraliberal, que Trump está desintegrando com sua política nacionalista do isolamento americano imperial:
“Quando falham os esforços para federalizar os Estados de uma civilização, as tendências imperialistas ou a anarquia se seguem aos períodos de equilíbrio de poder”. (Wright: 107).

Bolsonaro pode ser seduzido pela nova política de equilíbrio de poder do americanismo a Trump? Se o capitão fizer a leitura da política do equilíbrio de poder do americanismo aplicada a política brasileira fazendo pendant com a política na América Latina, Então:
“No emprego dinâmico da expressão equilíbrio de poder existem já aspectos de uma situação em que a lei, a organização e a opinião pública podem vir a se tornar mais importante do que o poder militar”. (Wright: 100).

A ideia militar de uma guerra com a Venezuela pode ser a causa da formação de um bloco-no-poder do capitalismo neocolonial. Em um Brasil assolado pela stásis em suas múltiplas formas, a política como guerra é uma questão cadente. Buscar o equilíbrio de poder interior à Nação, eis um problema que aflige a ESG e os generais. Se envolver na guerra lumpesinal criminal dos de baixo, exige uma política militar que tenha o apoio da opinião pública e da ordem legal. Os mass media passam a ter um lugar tático decisivo na luta do bloco-no-poder contra o crime e os criminosos. Se o bloco-no=poder neocolonial quer governar durante 20 anos, ele tem que pacificar as grandes cidades, lugar no qual se articulam as organizações criminosas dos de baixo. 

A política como guerra militar pode não se encontrar ao alcance do governo Bolsonaro?  

O que é a guerra?  

Philonenko diz:
“La guerre n’est pas lutte. Le propre de la guerre est d’être une action violente s’inscrivant dans une histoire. Le terme qui doit retent dans cette définition est le mot histoire. La guerre ne se sépare pas de l’histoire et toutes les actions violentes ne sont pas pour autant des action de guerre: c’est seulement quand une action violente s’inscrit dans l’histoire, lorsqu’elle s’écrit en s’inscrivant, qu’elle atteint la dimension de la guerre. Toutes les actions qui ne débouchent pas sur l’histoire doivent être rangées sous le concept de lutte. Cést ainsi qu’il n’y a pas, stricto sensu, de guerre animale; il existe seulement des luttes animales et l’ont pourrait reprocher à la philosophie hégélienne d’avoir mis sur le même plan la lutte du maître et de l’esclave et la guerre propriement dite”. (Philonenko: 184).   

A violência inscrita na história política brasileira em um sentido amplo subssume a luta à guerra. A luta política é aquela de um embate entre adversários. A guerra faz da política o espaço do conflito entre inimigos. O capitão diz que vai varrer da face da terra os vermelhos, os comunistas. Não e trata de “retórica”, se isto tiver ao alcance de sua mão, em algum momento.

A destruição da pequena burguesia pública será a inscrição da violência na história do messianismo e do condottiere Bolsonaro. A história se apresenta pela dialética entre o bloco-no-poder capitalista neocolonial versus o Estado getulista 1988.

Na terceira-década do século XXI, a história se define pela dialética amigo e inimigo:
 “A distinção especificamente política a que podem reportar-se as ações e os motivo é a discriminação entre amigo e inimigo. Ela fornece uma determinação conceitual no sentido de um critério, não como definição exaustiva ou especificação de conteúdos. Na medida em que ela não é derivável de outros critérios, corresponde, para o político, aos critérios relativamente independentes das demais contraposições: bom e mau, no moral; belo e feio, no estético etc.”. (Schmitt: 51-52).

A história da república messiânica será aquela  da política como guerra, ou seja, desprovida de moralidade política.  
         
                                                                              III

A gramática da guerra move a ideologia do superministro da economia, que será o gramático-condottiere-econômico do bloco-no-poder do capitalismo neocolonial.  O bloco-no-poder é aquele que tem como classe social gramatical hegemônica o grande capital neocolonial do terceiro-mundo. A forma política do bloco em tela é aquela da ditadura econômica do capitalismo neocolonial do terceiro-mundo.

O desenvolvimento da contradição bloco-no-poder versus Estado getulista 1988 se atualizará em uma guerra econômica (uso da violência econômica sem limite do Estado messiânico como ersatz de violência militar na história) do bloco-no-poder neocolonial contra o trabalho assalariado e contra a sociedade salarial pública. A guerra econômica militarizada do capital neocolonial se traduzirá em uma economia de guerra para o trabalho em geral e a sociedade salarial em particular.

A violência da história na política e na sociedade da era messiânica não significa um choque traumático para a democracia 1988?

BUCI-GLUCKSMANN, Christine. Gramsci et l’État. Paris;  Fayard, 1975
CLAUSEWITZ, Carl Von. Da guerra. SP: Martins Fontes, 1979
PHILONENKO, Alexis. Essais sur la  philosophie de la guerre. Paris: J. Vrin, 1988
SCHMITT, Carl. O conceito do político. Petrópolis: VOZES. 1992
SIMMEL, Georg. Philosophie de la modernité. V. 1. Paris: Payot, 1989
WRIGHT, Quince.  A guerra. RJ: BIBLEX, 1988              

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