José Paulo
O que é o pós-modernismo para a ciência política
dialética-materialista?
Ele aparece como um aparelho de hegemonia de um Estado
pós-modernista territorial? Ou ele existe com uma máquina de guerra ideológica
da globalização burguês-virtual?
A máquina de guerra pós-modernista transforma o campo
político da cultura do gosto em um estado de anarquia generalizado? O sujeito é
um efeito do significante:
“Mais de uma coisa no mundo é passível do efeito do
significante. Tudo o que está no mundo só se torna fato, propriamente, quando
com ele se articula o significante. Nunca, jamais surge sujeito algum até que o
fato seja dito”. (Lacan. S.16: 65).
O significante é sinônimo de discurso e este de gramática.
Portanto, a subjetividade é efeito de sentido do dito da trela gramatical.
Deleuze deixou um livro sobre a lógica do sentido. Trata-se de dizer que o grau
zero do sentido é a anarquia no campo político; um campo sem gramática, sem
tela verbal narrativa atualizada no aparelho de hegemonia de um Estado. A
máquina de guerra ideológica pós-modernista busca o grau zero de efeito de
sentido no campo político da cultura do gosto. Daí o campo das ideologias
pós—modernistas falarem em fim do
sujeito, da subjetividade moderna e qualquer subjetividade, fim da verdade.
Trata-se do fim do aparelho de hegemonia que funciona partir da verdade criada
pela tela verbal narrativa no campo político da cultura do gosto: verdade ou
clássica, ou barroca, ou gótica ou grotesca.
Deleuze fala do fim da lógica do sentido?
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O sentido “é o exprimível ou o expresso da proposição e o
atributo da coisa”. (Deleuze:23):
“O expresso não se parece de forma alguma com a expressão. O
sentido se atribui, mas não é absolutamente atributo da proposição, é atributo
da coisa ou do estado de coisa. O atributo da proposição é o predicado, por
exemplo, um predicado qualitativo como verde. Ele se atribui ao sujeito da
proposição. Mas o atributo da coisa é o verbo verdejar, por exemplo, ou antes,
o acontecimento expresso por este verbo [...]. Verde designa uma qualidade, uma
mistura de coisas, uma mistura de árvore e de ar em que uma clorofila coexiste
com todas as partes da folha. Verdejar, ao contrário, não é uma qualidade na
coisa, mas um atributo que se diz da coisa e que não existe fora da proposição
que o exprime designando a coisa”. (Deleuze: 22).
O sentido faz pendant com a tela verbal narrativa:
“Como diz Bergson, não vamos dos sons às imagens e das
imagens ao sentido: instalamo-nos logo ‘de saída’ em pleno sentido. O sentido é
como a esfera em que estou instalado para operar as designações possíveis e
mesmo para pensar suas condições. O sentido está sempre pressuposto desde que
eu começo a falar; eu não poderia começar sem esta pressuposição”. (Deleuze: 31).
O sentido é um efeito do pressuposto da própria gramática em
funcionamento da prática política no campo político da cultura do gosto:
“Para cada um de seus nomes, a linguagem deve conter um nome
para o sentido deste nome. Esta proliferação infinita de entidades verbais é
conhecida como paradoxo de Frege”. (Deleuze: 32).
O funcionamento do paradoxo na prática política a desintegra?
“Não se pode eliminar o paradoxo do sistema do Grundgesetze
der Arithmetik a não ser modificando-o, isto é, transformando-o em outro
sistema!”. (Newton da Costa: 222).
O efeito de sentido paradoxal da tela verbal narrativa é o
motor da transformação da prática política em um contexto. Como aparelho de
hegemonia, a prática política pode sustentar o Estado territorial nacional
(Dumézil:39, 40) como Estado gestor da mais-valia pública (Lacan. S. 16: 30,
29) para o dominado. Como máquina de guerra ideológica, a prática política se
apropria da mais-valia pública para o dominante. Há um paradoxo entre o
sustentar para o dominado e o sustentar para o dominante. Trata-se de um
paradoxo que pode desintegrar a prática política como Estado territorial na
forma de regime - sem alterar a gramática verbal narrativa do campo político.
A gramática do estoicismo permite vincular o sentido com a
fantasia; ela é:
Impressão produzida por agentes externos no núcleo da alma,
algo assim como uma impressão sigilar”. (Elorduy:33).
O hegemonikón ou eu político pode ser o agente que
imprime um efeito de sentido [no campo político do indivíduo ou da multidão] como
fantasia de gosto [barroco, grotesco etc.] capaz de pilotar a prática política:
“A parte principal da
alma, o hegemonikón, é o núcleo central de energia que comunica suas forças
respectivas a cada um dos sensórios. Embora os sensórios não se identifiquem
com a posição anatômica do organismo, senão que são ‘espíritos racionais emitidos
aos órgãos desde a mente”. (Elorduy: 37).
Há analogia do efeito de sentido verbal narrativo com a
prática política real:
“Os sentidos são como esses tentáculos ou ‘como galhos que se
arrancam daquela parte principal como o tronco, julgando a alma como um rei das
coisas que lhe anunciam os sentidos por suas sensações”. (Elorduy: 41).
Daí o pressuposto saber da gramática, pois, na prática
política, as sensações têm como soberano a alma ou, mais precisamente, o
hegemonikón:
“A comparação do rei – baseada na sinonímia entre realeza e
hegemonia [...]. prova que ‘o sentido interior leva vantagem (praestat) em
relação aos sentidos externos, dos quais é superior (moderator) e juiz’. Por
conseguinte, demonstra que ‘a razão leva vantagem a todos os demais no homem; e
si há algo superior a ela, é Deus”. (Elorduy: 41).
Na prática política,
o efeito de sentido da fantasia Deus é superior ao efeito de sentido da
fantasia razão. Daí Hobbes falar do Estado como <Deus mortal>.
(Hobbes:110). O Estado virtual é a coroa, ou seja, gramática sobreposta ao Estado
territorial; a coroa é o símbolo imortal da prática política - em qualquer
campo político da cultura do gosto. Sem
a tela de juízo de gosto, há o grau zero da prática política como efeito de
sentido da fantasia.
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O pós-modernismo aparece como uma máquina de guerra
semiológica/ideológica do Norte copiada pelos professores universitários do
Sul:
“A semiologia mostra-nos, no universo dos signos, o universo
das ideologias que se refletem nos modos comunicativos pré-constituídos”. (Eco:
XVIII).
Harvey diz sem margem à dúvidas:
“O projeto teológico pós-moderno é reafirmar a verdade de
Deus sem abandonar os poderes da razão”. (Harvey: 47).
O Estado virtual burguês pós-modernista é um fenômeno de uma
tela metafísica, daí, nas Américas ele ter como “classe-apoio” massas
evangélicas e a classe média fascista das grandes capitais, estas com a
hegemonia sobre o lumpesinato policial das classes baixas. Um Foucault
pós-modernista (Harvey: 50) e um Heidegger também [este através de Derrida}
(Harvey:53), todos são peças da montagem da máquina da guerra ideológica que se
transforma em um aparelho de hegemonia universitário do Estado burguês
territorial pós-modernista. No campo político da cultura do gosto, o sujeito
esquizo é a subjetividade que corresponde ao Estado burguês pós-modernista:
“Jameson (1984) explora esse tema com um efeito bem
revelador. Ele usa a descrição de Lacan da esquizofrenia como desordem
linguística, como uma ruptura na cadeia significativa de sentido que cria uma
frase simples; quando essa cadeia se rompe, ‘temos esquizofrenia na forma de um
agregado de significantes distintos e não relacionados entre si’”. (Harvey:
56).
Essa é a prática política essencial do Estado burguês
pós-modernista no campo político da cultura do gosto. Ela cria e recria um
campo de ideologias pós-modernistas como abolição do sentido no horizonte da
prática, da experiencia do agente. Assim, o tempo político deixa de regular o
campo político:
“Se a persona é fabricada por meio de ‘certa unificação
temporal do passado e do futuro com o presente que tenho diante de mim’, e se
as frases seguem a mesma trajetória, a incapacidade de unificar passado,
presente e futuro na frase assinala uma incapacidade semelhante de ‘unificar o
passado, o presente e o futuro da nossa própria experiencia biográfica ou vida
psíquica’. (Harvey: 56).
Tal fato significa a desintegração da tela verbal narrativa
como soberana na prática política de uma forma de regime da democracia feudal
modernista do dominado. A tela digital toma o lugar, na prática política, da
tela verbal narrativa. A tela digital é a lógica do simulacro de simulação
(Baudrellard: 1981: 177), do efeito de sentido no campo político da cultura do
gosto. Assim, o barroco é sobrepujado pelo neobarroco (Calabrese; 1988) e o
grotesco pelo neogrotesco (Rosen: 1991; Sodré; 1992).
Nas Américas, a massa social esquizo aparece desintegrando a
topologia da narrativa tradicional [de 1988, no Brasil] esquerda e direita no
campo político. Essa multidão esquizo [como abolição do princípio da
não-contradição na prática política] é a sustentação do Estado territorial
burguês pós-modernista liberal.
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O campo político é também uma tela de juízo de gosto:
“Mas – visto com ‘dada’ sob o ângulo da relação estética –
essa lógica dos significantes determina o processo aberto da interpretação, no
sentido de que a mensagem, como fonte oferecida a destinatário, propõe, também,
com forma significante a preencher, os níveis que já articulam grupos de
significados (denotados e conotados). Estruturando-se ambiguamente em relação
ao código e transformando continuamente suas denotações em conotações, a
mensagem estética compele-nos a experimentar sobre si léxicos e códigos sempre
diferentes. Nesse sentido, fazemos continuamente confluir para dentro da sua
forma vazia novos significados, controlados por uma lógica dos significantes
que mantém tensa uma dialética entre a liberdade da interpretação e a
fidelidade ao contexto estruturado da mensagem. E só assim se compreende por
que, em todo o caso, a contemplação da obra de arte suscita em nós aquela
impressão de riqueza emotiva, de conhecimento sempre novo a aprofundado, que
impelia Croce a falar de cosmicidade”. (Eco: 68)
O artista tem um lugar
na prática política da cultura do gosto; ele cria as gramáticas a partir das
quais surge o campo político das ideologias. Ele também é o intérprete da
gramática da prática política. O Estado burguês pós-modernista liberal se serve
de uma estética vinculada à lógica do significante simulacro de simulação. Não
é a estética pela estética, e sim uma estetização generalizada da obra de arte:
“ao final desta história da estética, a cultura democrática
de ponta a ponta orientada para o fechamento do mundo, tende a se estruturar
segundo três momentos: no campo da arte, a obra só pode ser um prolongamento do
artista e, se ela ainda é um mundo, só pode ser um microcosmo engendrado por
esse pequeno demiurgo que é o gênio”. (Ferry: 341).
Com o Estado burguês pós-modernista, a obra de arte não é
mais uma interpretação do campo político da cultura do gosto. Por outro lado, a
tela estética engendra uma região heterogênea (Cascardi:356) neobarroco e uma
região reprofunda heteróclita (neogrotesco) no campo sublunar da política.
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Lyotard fez a filosofia do Estado burguês pós-modernista
virtual. Ela anuncia o colapso do metarrelato marxismo-leninismo e da tela
metafísica universitária no campo político da cultura mundial:
“considera-se pós-moderna a incredulidade em relação ao
metarrelato. É, sem dúvida, um efeito do progresso das ciências; mas este
progresso, por sua vez, as supõe. Ao desuso do dispositivo metanarrativo de
legitimação corresponde, sobretudo, a crise da filosofia metafísica e da
instituição universitária que dela dependia”. (Lyotard. 1986: XVI).
O aparelho de hegemonia Lyotard invade o campo político da
cultura com a gramática dos <jogos de linguagem>:
‘Três observações precisam ser feitas a respeito do jogos de
linguagem. A primeira é que suas regras não possuem sua legitimação nelas
mesmas, mas constituem objeto de um contrato explícito ou não entre os
jogadores [o que não significa, todavia, que estes as inventem]. A segunda é
que na ausência de regras não existe jogo, que uma modificação, por mínima que
seja, de uma regra, modifica a natureza do jogo; e que um ‘lance’ ou um
enunciado que não satisfaça as regras, não pertence ao jogo definido por elas.
A terceira observação acaba de ser inferida: todo enunciado deve ser
considerado como um ‘lance’ feito num jogo”. (Lyotard. 1986: 17).
A gramática do Estado pós-modernista transforma a fala em um
ato de guerra molecular na prática política:
‘Esta última observação leva a admitir um primeiro princípio
que alicerça todo o nosso método: é que falar é combater, no sentido de jogar,
e que os atos de linguagem provêm de uma agonística geral. Isto não significa
necessariamente que se joga para ganhar. Pode-se realizar um lance pelo prazer
de inventá-lo”. (Lyotard. 1986: 17).
Na ciência política dialética-materialista, a gramática dos
jogos de linguagem na prática política brasileira faz pendant com o surgimento
da burguesia política com Lula e o PT. Só que o uso dessa gramática se atualiza
como uma estratégia de transformação do monopólio do governo federal nas mãos
do lulismo. Assim, como ato de guerra política, os jogos de linguagem do
lulismo usam a lógica do simulacro de simulação para conquistar a soberania
popular; tal fenômeno desintegra a forma de governo baseada na alternância de
dois partidos políticos: PT e PSDB. A crise da forma de governo desembocaria em
golpe de Estado e dois governos que fundam o Estado territorial, burguês,
pós-modernista e fascista.
O Estado
pós-modernista provoca um curto-circuito nas gramáticas da prática política do
aparelho de hegemonia
“ - Em primeiro lugar, a arte não é livre. Existe liberdade
dentro de coerções de qualquer nível, consciente e inconsciente. Mas, em
segundo lugar a estética é uma arte, a arte de produzir prazer puro
[desinteressado] ou de senti-lo. A retórica é uma arte de persuasão. A história
é uma arte de narrar o verdadeiro. E interpretar é a arte hermenêutica, talvez,
a mais difícil de todas. Suas regras são quase desconhecidas. Conhecem-se,
sobretudo, as negativas: nada acrescentar à coisa interpretada, não fazê-la dizer
o contrário do que diz, não ignorar as interpretações anteriores, não impor uma
interpretação como definitiva. A tradição de leitura da Torá esboçou algo como
regras positivas, distinguindo, no texto da Escritura, seus sentidos literais,
secreto, moral e alegórico”. (Lyotard. 1996:39).
Como o rei de Zizek, a prática política pós-modernista emerge
do real do campo político da cultura (Zizek: 42-43). O Estado pós-modernista
virtual é o ersatz do rei, ele é real. Ele é um aparelho de hegemonia que não
conquista a soberania popular por telas verbais narrativas e sim pela tela da
sedução digital. Baudrillard fez a ciência do Estado sedutor?
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A prática ´política é: a relação ficcional
representante/representado ou soberania popular; a relação de hegemonia virtual
elite/massa; a relação de dominação territorial burguesia política multidão
pós-modernista. Na última, a sedução se tornou a gramática do Estado écran , na
definição feliz de Régis Debray.
A ciência pós-modernista de Baudrillard fala do paradigma da
<sedução> como um ato de guerra de jogos de caligrafia contra o paradigma
da produção na prática política do Estado pós-modernista:
“Produzir é materializar à força o que é de uma outra ordem;
da ordem do segredo e da sedução. A sedução é sempre em todo lugar o que se
opõe à produção. A sedução retira alguma coisa da ordem do visível”.
(Baudrillard. 1991: 43).
Há uma relação de superioridade lógica na articulação da
prática política pós-modernista burguesa em relação à antiga prática moderna do
capital capitalista:
“A questão da superioridade profunda das lógicas de desafio e
de sedução sobre as lógicas econômicas do sexo e da produção permanece
inteira”. (Baudrillard. 1991: 51).
No lugar da gramática do poder na articulação
dominante/dominado, a gramática da sedução faz da prática política uma relação
populista entre o Estado sedutor e as massas pós-modernistas:
“A sedução é mais forte do que o poder, pois, um processo
reversível e mortal, ao passo que o poder se quer irreversível como o valor,
cumulativo e imortal como ele. Compartilha todas as ilusões do real e da
produção; quer-se da ordem do real e oscila assim no imaginário e na
superstição de si mesmo [com ajuda das teorias que o analisam, embora para
contestá-lo]. A sedução não é da ordem do real. Nunca é da ordem da força nem
da relação de força. Mas precisamente por isso é quem envolve todo o processo real
do poder assim como toda a ordem real da produção, dessa reversibilidade e
desacumulação ininterruptas sem as quais não haveria poder ou produção”.
(Baudrillard. 1991: 56).
A reversibilidade da gramática da sedução é capaz de
transformar a classe média fascista em um lumpesinato policial e a burguesia política
em uma lúmpen-burguesia nos países subdesenvolvidos da América do Sul. A
gramática da sedução é o fim de efeito de sentido no discurso político:
“Todo discurso de sentido quer dar fim às aparências, eis aí
seu engano e sua impostura. Mas também um projeto impossível: inexoravelmente o
discurso está entregue a sua própria aparência, portanto, às apostas da sedução
e a seu próprio fracasso como discurso. [...]. O que ocorre em primeiro lugar
quando um discurso seduz a si mesmo, forma original pela qual ele se absorve e
se esvazia de seu sentido para melhor fascinar os outros, sedução arcaica da
linguagem”. (Baudrillard. 1991: 62).
O aparelho de sedução da gramática baudrillardiano fala do
fim da prática política em geral, do fim da política e do Estado territorial
nacional na Europa da União Europeia. Um discurso de um contexto
especificamente europeu?
Com efeito, a globalização pós-modernista burguesa
desintegrou o Estado nacional no Ocidente/Oriente, excetuando a China e a Índia,
entre as grandes potências asiáticas. A ciência do Estado baudrillariana é
aquela do fim do Estado nacional, repito. Aí temos, afinal, o fim da prática
política autêntica substituída por uma prática do simulacro de simulação da
política moderna?
A prática política pós-modernista do além da época
pós-moderna (Bandeira da Silveira; 2024a), de fato, é um agir estratégico:
simulação, dissimulação, simulacro de
simulação, enganar, mentir, produção de ilusão etc. (McCarthy: 333). O poder
estratégico articula a relação da representação entre lúmpen-burguesia e
classes médias neogrotescas; tal fenômeno já remete para a região escura da
superfície reprofunda da prática política, onde todos os gatos são pardos, mas
devoram os ratos.
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No livro “O Estado sedutor”, Regis Debray diz que o Estado é
invisível e inaudível:
“C’est précisément parce que l’État est en lui-même invisibli
et inaudible qu’il doit à tout prix se faire voit et entendre par métaphores.
Se signaler à l’attention de tous par des signes convenus, observables et
tangibles. Sans cette signalisation, la croyance n’aurait ni objet ni
relais”> (Dabray: 66).
Com efeito, o Estado territorial é uma tela verbal narrativa
de aparelhos [repressivos, ideológicos, de hegemonia} que por efeitos de sua
prática política muito real imprime sua imagem textual no cérebro do homem,
mulher, criança. O aparelho legislativo penal age sobre o corpo humano
molecular e não apenas como aparelho de signos metafóricos ou metonímicos. A
relação da gramática penal com o corpo/alma produz a subjetividade do
prisioneiro. Sem me alongar, a figura do presidente da república existe como um
efeito sobre a constituição da subjetividade política da população, na medida
em que ele é conhecido/reconhecido na gramática da vaidade das pequenas
diferenças nacionais. O Estado cria e recria as regiões estáticas do campo
político que se atualiza na soberania popular e na multidão política na rua. A
tela estética é um fenômeno que interpela o gosto político real do indivíduo e
da multidão.
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O Estado virtual burguês está presente na realidade do
indivíduo através das telas digitais, no cotidiano. Ele faz a vida verdejar
assim como azular da paisagem do olho
pelo sol. Ele pode ser usado para se periodizar a época da <lógica cultural
do capitalismo tardio>?:
“Um dos problemas frequentemente associados a hipótese de
periodização é que estas tendem a obliterar a diferença e a projetar a ideia de
um período histórico como uma massa homogênea [demarcada em cada lado por uma
inexplicável metamorfose cronológica e por sinais de pontuação]. No entanto,
essa é precisamente a razão pela qual me parece essencial entender o
pós-modernismo não como um estilo, mas como uma dominante cultural: uma
concepção que dá margem à presença e à coexistência de uma serie de características
que, apesar de subordinadas uma às outras, são bem diferentes”. (Jameson: 29).
O contexto do pós-modernismo se caracteriza pela
plurivocidade de tela de juízo de gosto [que remetem o individuo e a multidão
par as regiões políticas do barroco, grotesco etc.] fazendo pendant como a prática
política do Estado virtual burguês. Um outro contexto se abriu na terceira
década do século XXI?
“O Estado feudal da atualidade requer uma discussão da
relação entre a imagem textualizada da atualidade e o campo do pressuposto
saber moderno. Por exemplo. A crítica da modernidade de Marx ainda é o
paradigma do pressuposto saber para se conhecer a atualidade? Marx parte de
algo além da autonomia relativa das esferas: economia, política, cultura. A
cultura e a política são englobadas na ideia de Forma ideológica. (Marx.
Pensadores: 136). Hegel fala da cultura reflexiva (Hegel. 1955: v. 2: 29) que
não oculta a realidade e não é produção de ilusão. Com o Estado hegeliano no
campo político/estético, a política não precisa ser agente histórico de
produção de ilusão. O Estado pode ser um fenômeno da manifestação da verdade de
uma época”. (Bandeira da Silveira. 2024: 76).
MERCANTILISMO-LIBERAL
FEUDAL MUNDIAL
Ao estudar a Revolução Francesa, Tocqueville descobriu o
segredo da transição de uma época para outra. Trata-se da conciliação barroca
entre o novo e o antigo regime, no que eles têm de conciliável. Hoje, vivemos a
transição do liberalismo ocidental para o mercantilismo asiático. A
globalização feudal-burguesa liberal tinha como meta a desintegração do Estado
territorial nacional. A União Europeia se tornou o símbolo maior dessa meta
inalcançável.
A Ásia desenvolveu a gramática do mercantilismo-liberal
feudal. A China, a gramática do mercantilismo-liberal para o dominado nas
relações internacionais. Assim, o planeta se vê diante de um processo
dialético-materialista com um duplo aspecto: o aspecto dominante é a gramática
do mercantilismo do século XXI. O aspecto dominado é a gramática do liberalismo
asiático do dominado, atual. Portanto, uma outra imagem textual do mundo emerge
da história planetária asiática.
A globalização asiática mercantilista-liberal feudal
significa direitos materiais para os países dominados ao lado dos direitos
materiais para as grandes potências. Assim, a estratégia consiste em revogar a
estrutura de dominação ideológica na economia conhecida pelo par
desenvolvido/subdesenvolvido [centro/periferia]. Uma outra imagem textual do
mundo vai sendo tecida na globalização exitosa que faz pendant com o Estado
territorial nacional.
Na globalização mercantilista-liberal feudal, a história
encontrará uma relação que não seja de dominação brutalista entre o Estado
virtual feudal modernista e o Estado territorial nacional. Um período de
transformação reprofunda na superestrutura das ideologias aparece como o
acontecimento que levará o planeta da hegemonia das ideologias liberais do
século XX para a hegemonia das ideologias mercantilistas-liberal do século XXI.
Bem, cada país terá que empreender esse caminho épico. Vejam que a transição nos
EUA já rendeu a tentativa de assassinato de Donald Trump. Donald acusa Joe
Biden e vice-presidente de terem conspirado com o serviço secreto para matá-lo.
Vivemos uma época na qual os partidos políticos são formas
ideológicas liberal do século XX. A transformação dos partidos políticos em
forma ideológica do século XXI já é parte do desenvolvimento da democracia
feudal mercantilista-liberal.
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Além da época posmoderna.
EUA: amazon, 2024a
BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. ciência política
materialista. EUA: amazon, 2024b
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