José Paulo
A ciência política
materialista de Deleuze e Guattari tem três conceitos básicos: aparelho de
captura, Estado imperial arcaico ou Urstaat, época do<capital
capitalista>; o aparelho de captura é uma tela semiológica que explica o
poder político por operações de espírito, ou seja, dependendo de associação de
ideias, das ideias como redes infinitas de aparelho de captura, seja da
sociedade, seja do Estado, seja da máquina de guerra. Acrescento o Estado como
aparelho repressivo e aparelho de hegemonia.
A tela semiológica é um efeito da linguística e da semiologia
no pensamento dos autores supracitados. Eles, esses autores, falam formalmente
de campo social como realidade manifesta e falam do campo político como
realidade latente; não existe o conceito científico de campo político em D. e
G. Existe campo político como realidade virtual no trabalho de conhecimento
deles.
O aparelho de captura é o trabalho da tela semiológica –
somente? Trata-se da tela semiológica, aí sim, criando o campo político da
forma de governo da polis ou da forma de regime político do Estado: formas de
regime como fascismo, ditadura e bonapartismo ou cesarismo, democracia feudal
modernista. O aparelho de captura pode ser outras telas além da semiológica?
Sim. Ele pode ser, com efeito o próprio conceito de tela em geral, como por
exemplo: tela gramatical e tela de gosto, que eu já estudei na história do
Ocidente.
D. e G. morreram antes da globalização feudal que pôs um fim
na existência da modernidade soberana do capital capitalista; este foi
substituído pelo <capital corporativo feudal>. Hoje trata-se de partir da
gramática de D. e G. revolucionada pela ciência política literária materialista
- para se pensar o além da época do capital capitalista.
2
D. G. tem um modelo
para se tratar o campo político pela axiomática (Deleuze e Guattari:569,572,576).
O axioma aristotélico é um mecanismo do logos. Então, a análise concreta de uma
situação concreta parte do logos. No campo político grego, a antiguidade é a
relação entre logos e multidão na politeia ou democracia normal:
“o homem é o único vivente <que possui logos>, esse
meio de comunicação racional que lhe permite estabelecer acordos sobre o justo
e o injusto, o adequado ou não, o melhor e o pior”. (Samaranch:192).
Um outro modo de lidar como o axioma do princípio da não
contradição é pensar o campo político como uma prática política sem uma região
da contradição, só de semelhante e dissemelhante, pois, o dissemelhante pode se
transformar em semelhante, fazer acordo, produzir consenso. Por outro lado, o
axioma consiste que o aparecer não pode ser e não ser, simultaneamente. Uma
região de fenômeno que é e não é ao mesmo tempo é a região do heteróclito.
O campo político tem direita e esquerda, extrema-direita e
extrema-esquerda. No campo política ocidental de hoje, a região da
extrema-direita encontra-se habitada por um aparecer como fascista e não
fascista ao mesmo tempo. Portanto, o logos axiomático está-aí nesse campo
político.
Como as regiões do campo político são verbais ideológicas,
elas podem ser definidas pela razão linguística. Pode-se trabalhar com a região
ideológica dos verbos dicendi. O hiper-gramático Othon Gracia ajuda a
entender esse fenômeno:
“Esses são os mais comuns, de sentido geral; mas muitos
autores, especialmente na literatura do século XX, costumam servir-se de
outros, mais específicos, mais caracterizadores da fala. Chegam mesmo, os mais
imaginativos, a empregar verbos que nenhuma relação tem com a ideia de
elocução, o que, do ponto de vista da sintaxe, poderia ser considerado como
inadmissível, pois os discendi deveriam ser, virtualmente ao menos, transitivos
ou admitir transitividade. Mas a língua não é rigorosamente lógica, principalmente
a falada, cuja sintaxe é ainda menos rígida. Nem precisa sê-lo para tornar-se
expressiva: ao contrário, quanto mais expressiva, quanto mais viva, quanto mais
espontânea, tanto menos logicamente ordenada. A carga de expressividade, os
matizes afetivos tão característicos na língua oral não teriam veículo
adequado, se os ficcionistas se limitassem, por uma questão de rigidez
lógico-sintática, aos legítimos verbos discendi”. (Garcia:
131-132).
O adequado da gramática verbal não é o adequado do axioma
aristotélico e a lógica-sintática não é a lógica do logos. É a lógica da razão
linguística. Assim, Lacan diz:
“a verdade, digamos, por si só, tem uma estrutura de
ficção”. (Lacan. S. 16: 186).
No campo político, a verdade tem estrutura de ficção para os
agentes do campo, incluído aí a multidão da rua.
3
A era da técnica heideggeriana aparece em D. e G como tela
axiomática da técnica maquínica:
‘É no quadro do Estado-nação, ou das subjetividades
nacionais, que se manifestam os processos de subjetivação e as sujeições
correspondentes. Quanto à axiomática mesma, de que os Estados são modelos de
realização, ela restaura ou reinventa, sob novas formas tornadas técnicas, todo
um sistema de servidão maquínica [...] é bem a reinvenção de uma máquina da
qual os homens são as partes constituintes, em vez de serem seus trabalhadores
e usuários assujeitados. Se as máquinas motrizes constituíram a segunda idade
da máquina técnica, as máquinas cibernéticas e da informática formam uma
terceira idade que recompõe um regime de servidão generalizado”. (Deleuze e
Guattari: 572).
É um regime geral de servidão não generalizável, pois existe
no campo político o molecular da singularidade que emerge no campo política do
funcionamento cibernético. Porém, o regime de servidão geral para os agentes
políticos é o da lógica do simulacro de simulação:
“ _ simulacros de simulação, baseados na informação, no
modelo, no jogo cibernético – operacionalidade total, hiper-realidade, objetivo
de controle total”. (Baudrillard. 1981: 177).
No regime de 1988, O PT e o lulismo apareceram como o agir da
lógica do simulacro de simulação das massas multiculturalistas - como simulacro
de simulação de identidades tradicional ou moderna: negro, mulher, LGBT.
Para refletir sobre a lógica S. S. no campo político da cultura,
recorra-se a ´época da técnica heideggeriana.
3
D. e G. falam da época da técnica heideggeriana [era
ecumênica do mercantilismo da multinacional em aliança como capital fictício]:
“São os caracteres reais da axiomática que levam a dizer que
o capitalismo e a política atual são literalmente uma axiomática”. (Deleuze e
Guattari: 576-577).
Nessa época, o fim do Estado aparece na cena futurista do
livro “Mille Plateaux”:
“É por isso que o capitalismo marca uma mutação das
organizações ecumênicas ou mundiais, que tomam uma consistência em sim mesmas:
em vez de resultar de formações sociais heterogêneas e de suas relações, é a
axiomática mundial em grande parte que distribui essas formações, fixa suas
relações, organizando uma divisão internacional do trabalho. Sob todos esses
aspectos, dir-se-ia que o capitalismo desenvolve uma ordem econômica que
poderia passar sem o Estado. E, com efeito, ao capitalismo não falta o grito de
guerra contra o Estado, não somente em nome do mercado, mas em virtude de sua
desterritorialização superior”. (Deleuze e Guattari: 567).
Heidegger fala da época do mercantilismo da multinacional
como era da técnica como fim da tela metafísica, como abandono do ser como
esteio do campo político cultural:
“Que a maquinação como abandono do ser característico do ente
precisa propagar o esquecimento do ser e assim no mais extremo ainda passar ao
largo do que ela mesma é”. (Heidegger. 2000: 155).
O mercantilismo da multinacional é uma invenção do
americanismo técnico maquínico com o fim da história universal do Ocidente:
“A maquinação é o acabamento incondicionado do ser como
vontade de poder. Mas mesmo a maquinação como essência do ser tem ainda uma
inessência.”
“A inessência da maquinação exige uma humanidade que não
desertifique toda tradição, mas propague para além da desertificação, isto é,
para o interior de sua inessência, justamente uma tradição desertificada da
metafísica (e, isto é, da história ocidental), essencialmente sem raízes. Esta
instauração da inessência da maquinação está reservada ao americanismo”. (Heidegger.2000:
156-157).
O americanismo define o fim da tela gramatical metafísica do
ser no campo político cultural ocidental que já não é o Ocidente:
“Mais soturno do que toda e qualquer selvageria asiática é
esta <moralidade> desenraizada e alastrada até o engodo incondicionado”.
“Somente aqui o abandono do ser alcança a condição extrema de
uma constância”.
“Será que reconhecemos suficientemente que tudo o que há de
soturno reside no americanismo e de modo algum no mundo russo? (Heidegger.
2000:157)
4
O Mille Plateaux trabalha com contexto dialético-racional da
axiomática paraconsistente. A partir disso se pensa se ele é uma filosofia ou
uma ciência política materialista:
“Nas ciências particulares, os conceitos são determinados
através da ordenação num contexto [Sachsuzammenhang] e tanto mais
determinados quanto mais notável for o contexto. Os conceitos filosóficos, ao
contrário, são oscilantes, vagos, multiformes, flutuantes como costuma ser
demonstrado na mudança dos pontos de vista filosóficos. Porém, tal incerteza
dos conceitos filosóficos não está exclusivamente fundamentada na mudança dos
pontos de vista. Ela pertence muito mais ao sentido mesmo dos conceitos
filosóficos, os quais permanecem sempre incertos. A possibilidade de acesso aos
conceitos filosóficos é inteiramente diferente de acesso aos conceitos
científicos. A filosofia não possui nenhum contexto objetivamente configurado à
disposição, no qual os conceitos pudessem ser ordenados para dele obter sua
determinação. Existe uma diferença de princípio entre ciência e filosofia”.
(Heidegger. 2010: 9).
No início da década de 1920, o professor Heidegger produz um
efeito no campo político da cultura europeia irrevogável. Ele cria um novo
conceito de fenômeno, um conceito pós-hegeliano:
“O que é o fenômeno? [...] Toda experiência – como o
experimento enquanto o que experimenta – pode <ser assumido no fenômeno>,
isto é, pode se tornar questionável:
1 pelo ‘que’ originário, que é experimentado nele (conteúdo);
2 Pelo ‘como’ originário, que é experimentado referência);
3 Pelo ‘como originário, no qual o sentido referencial é
realizado (realização)”.
“Essas três direções de sentido [sentido de conteúdo, de
referência e de realização] não estão colocadas simplesmente umas ao lado das
outras. ,<Fenômeno> é uma totalidade de sentido segundo essas três
direções. ,A fenomenologia, que é a explicação desta totalidade de sentido,
fornece o logos dos fenômenos, logos em sentido de <verbum internum>
[não no sentido de logicização}”. (Heidegger. :2010:58).
Heidegger põe e repõe a tela gramatical (verbum internum)
no campo político da cultura ocidental. Antes, só o logos logicizante era
admitido no campo político da cultura. Ora, o fenômeno é conteúdo, referência,
e sentido referencial realizado, ou seja, realização da prática política em um
campo político cultural, prática que constrói um novo Estado.
Vou tomar um exemplo da contemporaneidade. Pierre Lévy se
notabilizou por estudar e elaborar a cibercultura. No entanto, ele estava
possuído por uma imagem textual do monopólio do Estado moderno nacional sobre o
campo político cultural ocidental. Porém, em seus textos é possível ver o
surgimento do Estado tecno feudal-modernista, com o aparelho de hegemonia de
Estado PGP:
“A criptografia na rede é outro tema diretamente relacionado
à soberania dos Estados. Em 1991, um americano como convicções políticas
anarquistas, Phil Zimmermann, desenvolveu o ´programa PGP (Pretty Good Privacy,
ou ‘privacidade bastante razoável’. O PGP permite que dois correspondentes da
rede se identifiquem de forma infalível e codifiquem suas mensagens de forma
inviolável – mesmo pelos mais avançados programas rodando em supercomputadores
[...]. O PGP coloca nas mãos de qualquer pessoa um poder [o segredo absoluto da
comunicação] que antes era um direito natural exclusivo das forças armadas das
grandes potências. Além disso, impede o controle das comunicações [abertura de
cartas, escutas telefônicas, interceptação de mensagens digitais] dos cidadãos
que todas as polícias, mesmo as dos Estados mais democráticos, praticaram e
praticam ainda, seja por razões políticas [terror totalitaristas, vigilância
dos opositores, luta antiterroristas] ou a fim de lutar contra as máquinas de
guerra do bando ordinário ou do crime organizado”. (Lévy: 211).
O Estado PGP funda o
campo da democracia tecnofeudal com os direitos materiais naturais do dominado
à liberdade real de comunicação fora dos controles do Estado burguês: aparelho
repressivo e aparelhos ideológicos.
Da cibercultura emergiria um novo fenômeno político:
“Se é verdade que a rede tem tendência a reforçar ainda mais
os centros atuais de potência científica, militar e financeira, se é certo que
o ‘cyberbusiness’ deve conhecer uma expansão vertiginosa nos próximos anos,
ainda assim não podemos, como muitas vezes faz a crítica, reduzir o advento do
novo espaço de comunicação à aceleração da globalização econômica, à acentuação
das dominações tradicionais, nem mesmo ao surgimento de formas inéditas de
poder e de exploração”. (Lévy: 227)
Na cibercultura, emergiria um campo político cultural
brutalista com um Estado feudal-burguês pós-modernista.
5
O Brasil saiu da ditadura militar de 1964 com a Constituição
de 1988. Ela continha como realidade
virtual um Estado feudal modernista de direitos materiais do dominado. O regime
político de 1988 procurou destruir essa possibilidade de atualização do Estado
supracitado, transformando a Constituição em um Estado feudal pós-modernista do
dominante. O golpe político contra o governo petista de Dilma Rousseff, o vice Michel
Temer de Dilma na conspiração com o GSI clandestino, um grupo político do mundo
jurídico e do parelho de segurança pública, todos contribuiriam para a
fabricação do Estado feudal pós-modernista.
Com o governo de Jair Bolsonaro, o campo político se torna
sublunar. A Constituição apareceu como uma tela verbal-narrativa
paraconsistente, parasintática em um campo político cultural que acolhia
fenômenos: semelhantes, dissemelhantes e a contradição material que abria as
comportas para fenômenos heterogêneos como o multiculturalismo lulista. Temer e
Bolsonaro criaram recriaram as condições de possibilidade de fenômenos de uma
região verbal ideológica heteróclita do Brasil Profundo. (Bandeira da Silveira;
2021).
A Constituição de 1988 é um campo virtual
jurídico-político-ideológico-econômico paraconsistente:
“Elaborado S, o passo seguinte, para a investigação de suas
propriedades relevantes, consiste na sua formalização: escolhem-se símbolos
convenientes, e as regras de formação, que explicitam as combinações simbólicas
de S dotadas de sentido, bem como as regras de inferência, que nos permitem
obter novos arranjos simbólicos a partir de outros dados, são enunciados de
modo preciso. Então, S converte-se numa espécie de jogo grafomecânico,
realizado com símbolos fixos e mediante regras bem-definidas. (Newton da Costa:
36).
Os símbolos maiores da Constituição-88 são as classes sociais
e o maoir de todos é o Estado feudal modernista do dominado. Os jogos
grafomecânicos dos capítulos e artigos etc. configuram um campo virtual pleno
de contradições materiais, que seria administrado pelo Estado lacaniano
detentor da mais-valia pública, ou seja, riqueza da economia pública. A Reforma
do Trabalho e a Reforma da Previdência teve como meta pôr e repor o dominado excluído,
substancialmente, da repartição da mais-valia pública. E fazer do capital
feudal subdesenvolvido o proprietário quase monopolista da economia da riqueza
pública.
Indo, de abrupto, para
o domínio conceitual paraconsistente do Estado feudal pós-modernista, sem o
qual o Estado brasileiro é ininteligível:
“Um Estado pode ser
definido como uma organização política cujo domínio é territorialmente
organizado e capaz de acionar os meios de violência para sustentar esse
domínio. Tal definição é próxima daquela de Weber, mas não sublinha uma
reivindicação ao monopólio da violência ou o fator legitimidade”. (Giddens:
45).
A Constituição-88 procurou banir a máquina de guerra da
política:
Artigo 17. 4°. É vedada a utilização pelos partidos políticos
de organização paramilitar. (Constituição Federal:28).
As máquinas de guerra invadiriam o campo político feudal
pós-modernista mafioso com o governo de Bolsonaro. Este queria transformar o
aparelho constitucional-88 repressivo de Estado em uma máquina de guerra sua,
pessoal.
6
O campo político feudal da globalização é constituído por uma
série de fenômenos traduzíveis para uma tela axiomática:
“O rigor, em lógica e matemática usuais, é decorrência da
formalização [ou da possibilidade, em princípio, da formalização]: uma
determinada dedução ou demonstração em A é rigorosa se sabemos, pelo menos
teoricamente, como formalizá-lo, isto é, reproduzi-la numa conveniente
formalização do sistema axiomático S, que se constitui em espécie de imagem A
[evidentemente, uma teoria pode ser axiomatizada de diversas maneiras
distintas, o que implica haver várias formalizações dela]”. (Newton da Costa:
37).
A tela gramatical axiomática cria imagens textuais dos
fenômenos como: razão paraconsistente de Newton da Costa, máquina de guerra de
D. e G. Estado antiweberiano de Giddens, classe dirigente virtual (Lévy:
228-232).
A razão paraconsistente aparece como relações técnicas de
produção cibernética; a máquina de guerra existe como bando político e bando
criminoso comum; o Estado antiweberiano existe como Estado feudal
pós-modernista mafioso; a classe dirigente virtual é um efeito do general
intellec gramatical cibernético. (Bandeira da Silveira; 2022).
Os fenômenos supracitados deslizam da tela gramatical
axiomática do Estado feudal-burguês pós-modernista. Um região verbal-visual de
ideologias paraconsistentes e parasintáticas emerge no campo político da
cibercultura. Em geral, os atores não sabem como lidar com a <quase
verdade>, a verdade paraconsistente, pois costumam pensar com a razão
aristotélica do princípio de não contradição, como me referi antes. As massas
pós-modernas entendem a razão paraconsistente pela lógica do simulacro de
simulação.
7
O Mille Plateaux é ciência política materialista
paraconsistente envergonhada. Newton da Costa descobriu e inventou uma razão
linguística em conciliação barroca com o logos paraconsistente:
“Os princípios lógicos refletem, sob certos aspectos, as leis
que regem o exercício da razão. Praticamente, não há atividade logico-racional
sem o veículo linguístico. Raciocínios muito simples, como, por exemplo,
algumas inferências imediatas, aparentemente podem ser feitos sem se recorrer,
de modo sistemático, ao aparelho de linguagem. Porém, os resultados acabados e
finais da razão materializam-se, como já vimos, em contextos linguísticos.
Assim sendo, as leis lógicas terminam por ser caracterizadas por meio da
linguagem. Se quisermos estudar os princípios da razão, espelhados pelos
princípios lógicos, torna-se imprescindível, pois, tratarmos de alguns dos
aspectos básicos da teoria da linguagem. Aliás, convém insistir, a ciência
feita, o contexto científico que se comunica, é um corpo linguístico dotado de
vida própria, donde se depreende a relevância das considerações de ordem
linguística para a compreensão da atividade racional”. (Newton da Costa: 38).
A axiomática da razão barroca define a gramática ou discurso
de Lacan. Primeiro Lacan fala da identidade entre gramática e discurso
lacaniano:
“Troca de discurso [...]. Canso de dizer que essa noção de
discurso deve ser tomada como liame social, fundado sobre a linguagem e parece
então não deixar de ter relação com que na linguística se traduz,
especificamente, como gramática, sem nada mudar com tal fato. (Lacan1975: 21).
Em Newton da Costa, há a razão barroca paraconsistente:
“O barroco é a regulação da alma pela escopia corporal”.
(Lacan. 1975: 105).
Trata-se de uma imagem textual lacaniana fisicalista? Ou o
corpo é corpo como aparelho da plurivocidade de linguagem? O aparelho de
hegemonia da língua define-se como Evangelho barroco dos santos:
“Neste gênero, os Evangelhos, não se pode dizer melhor. Não
se pode dizer melhor da verdade. É daí que resulta que eles sejam evangelhos.
Não se pode mesmo fazer funcionar melhor a dimensão da verdade, isto é, melhor
enfiar a realidade na fantasia”. (Lacan. 1975: 97-98).
O evangelho barroco paraconsistente já se encontrava na
ciência política materialista-dialética de Marx e Engels. (Lacan. 1975: 32-33).
A fantasia real da tela barroca paraconsistente é o Estado barroco (Faoro:84) e
não o capital. O Estado é a verdade {como estrutura de ficção} como fantasia em
um campo político da cultura barroca do Ocidente e Oriente. A China como grande
potência da atualidade tem um Estado barroco segundo a dialética-materialista paraconsistente
de Mao Zedung:
“Até agora, a análise e a síntese não foram claramente
definidas. A análise é mais clara, mas pouco foi dito sobre a síntese. Tive uma
conversa com Ai Ssu-ch’i. Ele disse que hoje só falam sobre síntese e análise
conceituais, e não falam sobre síntese e análise práticas objetivas. Como
analisarmos e sintetizarmos o Partido Comunista e o Kuomintang, o proletariado
e a burguesia, os proprietários de terras e os camponeses, os chineses e os
imperialistas?”. (Zizek: 219).
O Estado barroco asiático contém a conciliação do capitalismo
e socialismo, China e EUA [duas épocas ou contextos da história condensados em
um Estado barroco modernista da atualidade}, como Estado feudal-burguês
modernista.
8
A minha ciência política materialista-dialética é um efeito
da conciliação barroca entre a razão paraconsistente e a razão parasintática
plástica. A ideia da tela gramatical plástica [conciliação barroca entre
gramática e estética] é de Wittgenstein:
“E quem pinta não deveria pintar algo – e quem pinta algo -
não pinta nada real”.
“’Mesmo quando se concebe a frase como imagem de um estado de
coisas possível e se diz que ela mostra a possibilidade do estado de coisas,
então, no melhor dos casos, a frase pode fazer o que faz uma imagem pintada ou
plástica, ou um filme; e, ela, em todo caso, não pode colocar o que não
acontece. Portanto, depende inteiramente de nossa gramática o que é
(logicamente) dito possível e o que não é, - a saber, o que ela autoriza?’”.
(Wittgenstein: 148).
Newton da Costa faz pendant com Wittgenstein? Símbolo é
imagem textual:
“Uma linguagem, não obstante, refere-se a objetos e
situações: alguns de seus símbolos denotam determinadas entidades e suas
sentenças relacionam-se com fatos. Restringindo-nos ao aspecto sintático de L,
não se pode tratar noções como as seguintes: os conceitos de verdade, de
denotação, de sentido e outros similares. Em resumo [...] devemos levar também
em conta a dimensão semântica da linguagem. Na semântica, pesquisamos as
inter-relações existentes entre as linguagens e os objetos e as situações às
quais elas se referem”, (Newton da Costa: 39).
Significado, sentido, experiência e verdade são objetos da
razão paraconsistente das ciências reais:
“na semiótica aplicada consideramos linguagens ordinárias,
para cuja elaboração e desenvolvimento a experiência é absolutamente
imprescindível: elas só podem ser estudadas não se olvidando do nível empírico.
Linguagens dessa categoria são as línguas comuns, como o português e o francês,
a as teorias e as disciplinas reais. Neste caso, é patente, a experiência
constitui fator fundamental, que não pode ser posto de lado, como ocorre com as
linguagens ideais da semiótica pura”. (Newton da Costa: 40).
A razão da semiótica paraconsistente aboliu a razão clássica
grega:
“A razão, portanto, em sua atividade serve-se de uma coleção
enumerável de categorias lógicas, que se encontram pela análise sintática de
linguagens como T. Quanto às categorias menos gerais do que as lógicas, como as
de causa, de espaço e tempo, a elas se chega pelo estudo do sistema simbólico e
conceitual das ciências particulares. De qualquer modo, as categorias destas
ciências constituem particularizações lógicas”. (Newton da Costa: 55).
No campo político da cultura parasintática plástica, o
significado é doado ao agir molecular do agente pelo laço social entre o
próprio agente e a sua experiencia na prática política.
O sentido sintático (Newton da Costa: 52) encontra-se no
horizonte do campo político gramatical plástico através dos evangelhos que
asseguram a quase verdade como fantasia verbal-visual, isto é, como estrutura
de ficção na constituição das regiões ecumênicas do campo político da cultura
plástica parasintático.
9
No campo da criança, há objeto virtual e objeto real.
(Deleuze: 169-170). O virtual tem como oposição o atual:
“A realidade do virtual consiste nos elementos e relações
diferenciais e nos pontos singulares que lhes correspondem. A estrutura é a
realidade do virtual. Aos elementos e às relações que formam uma estrutura
devemos evitar, ao mesmo tempo, atribuir uma atualidade, que eles não têm e
retirar a realidade que eles têm”. (Deleuze: 336).
Na ciência política materialista literária, o fenômeno
histórico <classe dirigente virtual> define virtual em relação à
territorial no século XXI. No campo político da cultura mundial, há a burguesia
política virtual. E há a burguesia política territorial no campo político dos
países. A burguesia territorial encontra-se sob a direção do aparelho de
hegemonikon da classe
dirigente/dominante virtual.
A razão paraconsistente é as relações técnicas de produção
cibernética da burguesia mundial virtual. Um Estado burguês pós-modernista
existe no mercantilismo do capital corporativo da multinacional, sendo a
vanguarda desse Estado as corporações -feudais multinacional da comunicação de
massa. O campo político da cibercultura funciona por soluções de aporias e
paradoxos:
“Solucionar [resolver, superar,...] dado paradoxo consiste em
se provar que ele se reduz a falácia ou em se evidenciar que sua conclusão não
é, de fato, inaceitável. Quando se consegue mostrar que o paradoxo P não passa
de paralogismo, diz-se que a solução de P é negativa; quando se patenteia ser a
conclusão de P realmente aceitável dizemos que a solução é positiva”. (Newton
da Costa: 222).
Há mudança no campo político da cibercultura:
“Não se pode eliminar o paradoxo do sistema do Grundgestze
der Arithmetik a não ser modificando-o, isto é, transformando-o em outro
sistema: o original era e sempre será trivial”. (Newton a Costa: 222).
A estrutura de dominação do capital capitalista da
globalização destruiu o Estado nacional. No lugar do Estado-nação, ergueu-se um
Estado burguês feudal, virtual, cibernético, fascista que conduz o destino do
Estado burguês territorial e sua burguesia territorial:
“O Traço marcante das aporias, pragmaticamente falando,
consiste na perplexidade que nos provocam em relação aos princípios aceitos :
não se sabe, com exatidão, quais devem ser derrogados e quais os merecedores de
conservação. Com o advento da lógica paraconsistente, os paradoxos aparecem sob
uma luz nova e corroboram nossa tese segundo a qual a evolução da lógica se
processa dialeticamente. Com efeito, aporias tidas e havidas como superadas
ressurgem com toda sua força: de um lado, há o problema de não se dispor de
critérios indiscutíveis para se preferir a solução clássica à paraconsistente;
de outro, nas próprias lógicas paraconsistentes renascem algumas aporias”.
(Newton da Costa: 228-229).
Da razão paraconsistente à razão parasintática, um campo
político dialético-materialista da cultura mundial abrange Ocidente, Oriente e
Américas com aporias, por exemplo, que terão com motor da história massas de
classes sociais e um Estado feudal modernista do dominado em um processo de
abolição do Estado burguês: aparelho repressivo e Estado e aparelhos
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