quarta-feira, 17 de julho de 2024

CRÍTICA da gramática virtual fascista

 

 

 

José  Paulo 

 

 

 A ciência política materialista de Deleuze e Guattari tem três conceitos básicos: aparelho de captura, Estado imperial arcaico ou Urstaat, época do<capital capitalista>; o aparelho de captura é uma tela semiológica que explica o poder político por operações de espírito, ou seja, dependendo de associação de ideias, das ideias como redes infinitas de aparelho de captura, seja da sociedade, seja do Estado, seja da máquina de guerra. Acrescento o Estado como aparelho repressivo e aparelho de hegemonia.

 

A tela semiológica é um efeito da linguística e da semiologia no pensamento dos autores supracitados. Eles, esses autores, falam formalmente de campo social como realidade manifesta e falam do campo político como realidade latente; não existe o conceito científico de campo político em D. e G. Existe campo político como realidade virtual no trabalho de conhecimento deles.

 

O aparelho de captura é o trabalho da tela semiológica – somente? Trata-se da tela semiológica, aí sim, criando o campo político da forma de governo da polis ou da forma de regime político do Estado: formas de regime como fascismo, ditadura e bonapartismo ou cesarismo, democracia feudal modernista. O aparelho de captura pode ser outras telas além da semiológica? Sim. Ele pode ser, com efeito o próprio conceito de tela em geral, como por exemplo: tela gramatical e tela de gosto, que eu já estudei na história do Ocidente.

 

D. e G. morreram antes da globalização feudal que pôs um fim na existência da modernidade soberana do capital capitalista; este foi substituído pelo <capital corporativo feudal>. Hoje trata-se de partir da gramática de D. e G. revolucionada pela ciência política literária materialista - para se pensar o além da época do capital capitalista.

 

                                                                                  2

 

D.  G. tem um modelo para se tratar o campo político pela axiomática (Deleuze e Guattari:569,572,576). O axioma aristotélico é um mecanismo do logos. Então, a análise concreta de uma situação concreta parte do logos. No campo político grego, a antiguidade é a relação entre logos e multidão na politeia ou democracia normal:

 

“o homem é o único vivente <que possui logos>, esse meio de comunicação racional que lhe permite estabelecer acordos sobre o justo e o injusto, o adequado ou não, o melhor e o pior”. (Samaranch:192).

 

Um outro modo de lidar como o axioma do princípio da não contradição é pensar o campo político como uma prática política sem uma região da contradição, só de semelhante e dissemelhante, pois, o dissemelhante pode se transformar em semelhante, fazer acordo, produzir consenso. Por outro lado, o axioma consiste que o aparecer não pode ser e não ser, simultaneamente. Uma região de fenômeno que é e não é ao mesmo tempo é a região do heteróclito.

 

O campo político tem direita e esquerda, extrema-direita e extrema-esquerda. No campo política ocidental de hoje, a região da extrema-direita encontra-se habitada por um aparecer como fascista e não fascista ao mesmo tempo. Portanto, o logos axiomático está-aí nesse campo político.

 

Como as regiões do campo político são verbais ideológicas, elas podem ser definidas pela razão linguística. Pode-se trabalhar com a região ideológica dos verbos dicendi. O hiper-gramático Othon Gracia ajuda a entender esse fenômeno:

 

“Esses são os mais comuns, de sentido geral; mas muitos autores, especialmente na literatura do século XX, costumam servir-se de outros, mais específicos, mais caracterizadores da fala. Chegam mesmo, os mais imaginativos, a empregar verbos que nenhuma relação tem com a ideia de elocução, o que, do ponto de vista da sintaxe, poderia ser considerado como inadmissível, pois os discendi deveriam ser, virtualmente ao menos, transitivos ou admitir transitividade. Mas a língua não é rigorosamente lógica, principalmente a falada, cuja sintaxe é ainda menos rígida. Nem precisa sê-lo para tornar-se expressiva: ao contrário, quanto mais expressiva, quanto mais viva, quanto mais espontânea, tanto menos logicamente ordenada. A carga de expressividade, os matizes afetivos tão característicos na língua oral não teriam veículo adequado, se os ficcionistas se limitassem, por uma questão de rigidez lógico-sintática, aos legítimos verbos discendi”. (Garcia: 131-132).   

 

O adequado da gramática verbal não é o adequado do axioma aristotélico e a lógica-sintática não é a lógica do logos. É a lógica da razão linguística. Assim, Lacan diz:

 

“a verdade, digamos, por si só, tem uma estrutura de ficção”.  (Lacan. S. 16: 186).

 

No campo político, a verdade tem estrutura de ficção para os agentes do campo, incluído aí a multidão da rua.

 

                                                                           3

 

A era da técnica heideggeriana aparece em D. e G como tela axiomática da técnica maquínica:

 

‘É no quadro do Estado-nação, ou das subjetividades nacionais, que se manifestam os processos de subjetivação e as sujeições correspondentes. Quanto à axiomática mesma, de que os Estados são modelos de realização, ela restaura ou reinventa, sob novas formas tornadas técnicas, todo um sistema de servidão maquínica [...] é bem a reinvenção de uma máquina da qual os homens são as partes constituintes, em vez de serem seus trabalhadores e usuários assujeitados. Se as máquinas motrizes constituíram a segunda idade da máquina técnica, as máquinas cibernéticas e da informática formam uma terceira idade que recompõe um regime de servidão generalizado”. (Deleuze e Guattari: 572).

 

É um regime geral de servidão não generalizável, pois existe no campo político o molecular da singularidade que emerge no campo política do funcionamento cibernético. Porém, o regime de servidão geral para os agentes políticos é o da lógica do simulacro de simulação:

 

“ _ simulacros de simulação, baseados na informação, no modelo, no jogo cibernético – operacionalidade total, hiper-realidade, objetivo de controle total”. (Baudrillard. 1981: 177).

 

No regime de 1988, O PT e o lulismo apareceram como o agir da lógica do simulacro de simulação das massas multiculturalistas - como simulacro de simulação de identidades tradicional ou moderna: negro, mulher, LGBT.

 

Para refletir sobre a lógica S. S. no campo político da cultura, recorra-se a ´época da técnica heideggeriana.  

 

                                                                   3

 

D. e G. falam da época da técnica heideggeriana [era ecumênica do mercantilismo da multinacional em aliança como capital fictício]:

 

“São os caracteres reais da axiomática que levam a dizer que o capitalismo e a política atual são literalmente uma axiomática”. (Deleuze e Guattari: 576-577).

 

Nessa época, o fim do Estado aparece na cena futurista do livro “Mille Plateaux”:

 

“É por isso que o capitalismo marca uma mutação das organizações ecumênicas ou mundiais, que tomam uma consistência em sim mesmas: em vez de resultar de formações sociais heterogêneas e de suas relações, é a axiomática mundial em grande parte que distribui essas formações, fixa suas relações, organizando uma divisão internacional do trabalho. Sob todos esses aspectos, dir-se-ia que o capitalismo desenvolve uma ordem econômica que poderia passar sem o Estado. E, com efeito, ao capitalismo não falta o grito de guerra contra o Estado, não somente em nome do mercado, mas em virtude de sua desterritorialização superior”. (Deleuze e Guattari: 567).

 

Heidegger fala da época do mercantilismo da multinacional como era da técnica como fim da tela metafísica, como abandono do ser como esteio do campo político cultural:

 

“Que a maquinação como abandono do ser característico do ente precisa propagar o esquecimento do ser e assim no mais extremo ainda passar ao largo do que ela mesma é”. (Heidegger. 2000: 155).

 

O mercantilismo da multinacional é uma invenção do americanismo técnico maquínico com o fim da história universal do Ocidente:

 

“A maquinação é o acabamento incondicionado do ser como vontade de poder. Mas mesmo a maquinação como essência do ser tem ainda uma inessência.”

 

“A inessência da maquinação exige uma humanidade que não desertifique toda tradição, mas propague para além da desertificação, isto é, para o interior de sua inessência, justamente uma tradição desertificada da metafísica (e, isto é, da história ocidental), essencialmente sem raízes. Esta instauração da inessência da maquinação está reservada ao americanismo”. (Heidegger.2000: 156-157).

 

O americanismo define o fim da tela gramatical metafísica do ser no campo político cultural ocidental que já não é o Ocidente:

 

“Mais soturno do que toda e qualquer selvageria asiática é esta <moralidade> desenraizada e alastrada até o engodo incondicionado”.

 

“Somente aqui o abandono do ser alcança a condição extrema de uma constância”.

 

“Será que reconhecemos suficientemente que tudo o que há de soturno reside no americanismo e de modo algum no mundo russo? (Heidegger. 2000:157) 

                                                                   4

O Mille Plateaux trabalha com contexto dialético-racional da axiomática paraconsistente. A partir disso se pensa se ele é uma filosofia ou uma ciência política materialista:

“Nas ciências particulares, os conceitos são determinados através da ordenação num contexto [Sachsuzammenhang] e tanto mais determinados quanto mais notável for o contexto. Os conceitos filosóficos, ao contrário, são oscilantes, vagos, multiformes, flutuantes como costuma ser demonstrado na mudança dos pontos de vista filosóficos. Porém, tal incerteza dos conceitos filosóficos não está exclusivamente fundamentada na mudança dos pontos de vista. Ela pertence muito mais ao sentido mesmo dos conceitos filosóficos, os quais permanecem sempre incertos. A possibilidade de acesso aos conceitos filosóficos é inteiramente diferente de acesso aos conceitos científicos. A filosofia não possui nenhum contexto objetivamente configurado à disposição, no qual os conceitos pudessem ser ordenados para dele obter sua determinação. Existe uma diferença de princípio entre ciência e filosofia”. (Heidegger. 2010: 9).

No início da década de 1920, o professor Heidegger produz um efeito no campo político da cultura europeia irrevogável. Ele cria um novo conceito de fenômeno, um conceito pós-hegeliano:

“O que é o fenômeno? [...] Toda experiência – como o experimento enquanto o que experimenta – pode <ser assumido no fenômeno>, isto é, pode se tornar questionável:

1 pelo ‘que’ originário, que é experimentado nele (conteúdo);

2 Pelo ‘como’ originário, que é experimentado referência);

3 Pelo ‘como originário, no qual o sentido referencial é realizado (realização)”.

“Essas três direções de sentido [sentido de conteúdo, de referência e de realização] não estão colocadas simplesmente umas ao lado das outras. ,<Fenômeno> é uma totalidade de sentido segundo essas três direções. ,A fenomenologia, que é a explicação desta totalidade de sentido, fornece o logos dos fenômenos, logos em sentido de <verbum internum> [não no sentido de logicização}”. (Heidegger. :2010:58).

Heidegger põe e repõe a tela gramatical (verbum internum) no campo político da cultura ocidental. Antes, só o logos logicizante era admitido no campo político da cultura. Ora, o fenômeno é conteúdo, referência, e sentido referencial realizado, ou seja, realização da prática política em um campo político cultural, prática que constrói um novo Estado.

Vou tomar um exemplo da contemporaneidade. Pierre Lévy se notabilizou por estudar e elaborar a cibercultura. No entanto, ele estava possuído por uma imagem textual do monopólio do Estado moderno nacional sobre o campo político cultural ocidental. Porém, em seus textos é possível ver o surgimento do Estado tecno feudal-modernista, com o aparelho de hegemonia de Estado PGP:

“A criptografia na rede é outro tema diretamente relacionado à soberania dos Estados. Em 1991, um americano como convicções políticas anarquistas, Phil Zimmermann, desenvolveu o ´programa PGP (Pretty Good Privacy, ou ‘privacidade bastante razoável’. O PGP permite que dois correspondentes da rede se identifiquem de forma infalível e codifiquem suas mensagens de forma inviolável – mesmo pelos mais avançados programas rodando em supercomputadores [...]. O PGP coloca nas mãos de qualquer pessoa um poder [o segredo absoluto da comunicação] que antes era um direito natural exclusivo das forças armadas das grandes potências. Além disso, impede o controle das comunicações [abertura de cartas, escutas telefônicas, interceptação de mensagens digitais] dos cidadãos que todas as polícias, mesmo as dos Estados mais democráticos, praticaram e praticam ainda, seja por razões políticas [terror totalitaristas, vigilância dos opositores, luta antiterroristas] ou a fim de lutar contra as máquinas de guerra do bando ordinário ou do crime organizado”. (Lévy: 211).

 O Estado PGP funda o campo da democracia tecnofeudal com os direitos materiais naturais do dominado à liberdade real de comunicação fora dos controles do Estado burguês: aparelho repressivo e aparelhos ideológicos.    

Da cibercultura emergiria um novo fenômeno político:

“Se é verdade que a rede tem tendência a reforçar ainda mais os centros atuais de potência científica, militar e financeira, se é certo que o ‘cyberbusiness’ deve conhecer uma expansão vertiginosa nos próximos anos, ainda assim não podemos, como muitas vezes faz a crítica, reduzir o advento do novo espaço de comunicação à aceleração da globalização econômica, à acentuação das dominações tradicionais, nem mesmo ao surgimento de formas inéditas de poder e de exploração”. (Lévy: 227)

Na cibercultura, emergiria um campo político cultural brutalista com um Estado feudal-burguês pós-modernista.             

                                                                      5

O Brasil saiu da ditadura militar de 1964 com a Constituição de 1988.  Ela continha como realidade virtual um Estado feudal modernista de direitos materiais do dominado. O regime político de 1988 procurou destruir essa possibilidade de atualização do Estado supracitado, transformando a Constituição em um Estado feudal pós-modernista do dominante. O golpe político contra o governo petista de Dilma Rousseff, o vice Michel Temer de Dilma na conspiração com o GSI clandestino, um grupo político do mundo jurídico e do parelho de segurança pública, todos contribuiriam para a fabricação do Estado feudal pós-modernista.

Com o governo de Jair Bolsonaro, o campo político se torna sublunar. A Constituição apareceu como uma tela verbal-narrativa paraconsistente, parasintática em um campo político cultural que acolhia fenômenos: semelhantes, dissemelhantes e a contradição material que abria as comportas para fenômenos heterogêneos como o multiculturalismo lulista. Temer e Bolsonaro criaram recriaram as condições de possibilidade de fenômenos de uma região verbal ideológica heteróclita do Brasil Profundo. (Bandeira da Silveira; 2021).

A Constituição de 1988 é um campo virtual jurídico-político-ideológico-econômico paraconsistente:

“Elaborado S, o passo seguinte, para a investigação de suas propriedades relevantes, consiste na sua formalização: escolhem-se símbolos convenientes, e as regras de formação, que explicitam as combinações simbólicas de S dotadas de sentido, bem como as regras de inferência, que nos permitem obter novos arranjos simbólicos a partir de outros dados, são enunciados de modo preciso. Então, S converte-se numa espécie de jogo grafomecânico, realizado com símbolos fixos e mediante regras bem-definidas. (Newton da Costa: 36).

Os símbolos maiores da Constituição-88 são as classes sociais e o maoir de todos é o Estado feudal modernista do dominado. Os jogos grafomecânicos dos capítulos e artigos etc. configuram um campo virtual pleno de contradições materiais, que seria administrado pelo Estado lacaniano detentor da mais-valia pública, ou seja, riqueza da economia pública. A Reforma do Trabalho e a Reforma da Previdência teve como meta pôr e repor o dominado excluído, substancialmente, da repartição da mais-valia pública. E fazer do capital feudal subdesenvolvido o proprietário quase monopolista da economia da riqueza pública.

Indo, de abrupto,  para o domínio conceitual paraconsistente do Estado feudal pós-modernista, sem o qual o Estado brasileiro é ininteligível:

“Um Estado  pode ser definido como uma organização política cujo domínio é territorialmente organizado e capaz de acionar os meios de violência para sustentar esse domínio. Tal definição é próxima daquela de Weber, mas não sublinha uma reivindicação ao monopólio da violência ou o fator legitimidade”. (Giddens: 45).

A Constituição-88 procurou banir a máquina de guerra da política:

Artigo 17. 4°. É vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar. (Constituição Federal:28).            

As máquinas de guerra invadiriam o campo político feudal pós-modernista mafioso com o governo de Bolsonaro. Este queria transformar o aparelho constitucional-88 repressivo de Estado em uma máquina de guerra sua, pessoal.

                                                                     6

O campo político feudal da globalização é constituído por uma série de fenômenos traduzíveis para uma tela axiomática:

“O rigor, em lógica e matemática usuais, é decorrência da formalização [ou da possibilidade, em princípio, da formalização]: uma determinada dedução ou demonstração em A é rigorosa se sabemos, pelo menos teoricamente, como formalizá-lo, isto é, reproduzi-la numa conveniente formalização do sistema axiomático S, que se constitui em espécie de imagem A [evidentemente, uma teoria pode ser axiomatizada de diversas maneiras distintas, o que implica haver várias formalizações dela]”. (Newton da Costa: 37).

A tela gramatical axiomática cria imagens textuais dos fenômenos como: razão paraconsistente de Newton da Costa, máquina de guerra de D. e G. Estado antiweberiano de Giddens, classe dirigente virtual (Lévy: 228-232).

A razão paraconsistente aparece como relações técnicas de produção cibernética; a máquina de guerra existe como bando político e bando criminoso comum; o Estado antiweberiano existe como Estado feudal pós-modernista mafioso; a classe dirigente virtual é um efeito do general intellec gramatical cibernético. (Bandeira da Silveira; 2022).

Os fenômenos supracitados deslizam da tela gramatical axiomática do Estado feudal-burguês pós-modernista. Um região verbal-visual de ideologias paraconsistentes e parasintáticas emerge no campo político da cibercultura. Em geral, os atores não sabem como lidar com a <quase verdade>, a verdade paraconsistente, pois costumam pensar com a razão aristotélica do princípio de não contradição, como me referi antes. As massas pós-modernas entendem a razão paraconsistente pela lógica do simulacro de simulação.      

                                                                    7                                                                       

O Mille Plateaux é ciência política materialista paraconsistente envergonhada. Newton da Costa descobriu e inventou uma razão linguística em conciliação barroca com o logos paraconsistente:

“Os princípios lógicos refletem, sob certos aspectos, as leis que regem o exercício da razão. Praticamente, não há atividade logico-racional sem o veículo linguístico. Raciocínios muito simples, como, por exemplo, algumas inferências imediatas, aparentemente podem ser feitos sem se recorrer, de modo sistemático, ao aparelho de linguagem. Porém, os resultados acabados e finais da razão materializam-se, como já vimos, em contextos linguísticos. Assim sendo, as leis lógicas terminam por ser caracterizadas por meio da linguagem. Se quisermos estudar os princípios da razão, espelhados pelos princípios lógicos, torna-se imprescindível, pois, tratarmos de alguns dos aspectos básicos da teoria da linguagem. Aliás, convém insistir, a ciência feita, o contexto científico que se comunica, é um corpo linguístico dotado de vida própria, donde se depreende a relevância das considerações de ordem linguística para a compreensão da atividade racional”. (Newton da Costa: 38).

A axiomática da razão barroca define a gramática ou discurso de Lacan. Primeiro Lacan fala da identidade entre gramática e discurso lacaniano:

“Troca de discurso [...]. Canso de dizer que essa noção de discurso deve ser tomada como liame social, fundado sobre a linguagem e parece então não deixar de ter relação com que na linguística se traduz, especificamente, como gramática, sem nada mudar com tal fato. (Lacan1975: 21).

Em Newton da Costa, há a razão barroca paraconsistente:

“O barroco é a regulação da alma pela escopia corporal”. (Lacan. 1975: 105).

Trata-se de uma imagem textual lacaniana fisicalista? Ou o corpo é corpo como aparelho da plurivocidade de linguagem? O aparelho de hegemonia da língua define-se como Evangelho barroco dos santos:

“Neste gênero, os Evangelhos, não se pode dizer melhor. Não se pode dizer melhor da verdade. É daí que resulta que eles sejam evangelhos. Não se pode mesmo fazer funcionar melhor a dimensão da verdade, isto é, melhor enfiar a realidade na fantasia”. (Lacan. 1975: 97-98).

O evangelho barroco paraconsistente já se encontrava na ciência política materialista-dialética de Marx e Engels. (Lacan. 1975: 32-33). A fantasia real da tela barroca paraconsistente é o Estado barroco (Faoro:84) e não o capital. O Estado é a verdade {como estrutura de ficção} como fantasia em um campo político da cultura barroca do Ocidente e Oriente. A China como grande potência da atualidade tem um Estado barroco segundo a dialética-materialista paraconsistente de Mao Zedung:

“Até agora, a análise e a síntese não foram claramente definidas. A análise é mais clara, mas pouco foi dito sobre a síntese. Tive uma conversa com Ai Ssu-ch’i. Ele disse que hoje só falam sobre síntese e análise conceituais, e não falam sobre síntese e análise práticas objetivas. Como analisarmos e sintetizarmos o Partido Comunista e o Kuomintang, o proletariado e a burguesia, os proprietários de terras e os camponeses, os chineses e os imperialistas?”. (Zizek: 219).    

O Estado barroco asiático contém a conciliação do capitalismo e socialismo, China e EUA [duas épocas ou contextos da história condensados em um Estado barroco modernista da atualidade}, como Estado feudal-burguês modernista.         

                                                               8

A minha ciência política materialista-dialética é um efeito da conciliação barroca entre a razão paraconsistente e a razão parasintática plástica. A ideia da tela gramatical plástica [conciliação barroca entre gramática e estética] é de Wittgenstein:

“E quem pinta não deveria pintar algo – e quem pinta algo - não pinta nada real”.

“’Mesmo quando se concebe a frase como imagem de um estado de coisas possível e se diz que ela mostra a possibilidade do estado de coisas, então, no melhor dos casos, a frase pode fazer o que faz uma imagem pintada ou plástica, ou um filme; e, ela, em todo caso, não pode colocar o que não acontece. Portanto, depende inteiramente de nossa gramática o que é (logicamente) dito possível e o que não é, - a saber, o que ela autoriza?’”. (Wittgenstein: 148).

Newton da Costa faz pendant com Wittgenstein? Símbolo é imagem textual:

“Uma linguagem, não obstante, refere-se a objetos e situações: alguns de seus símbolos denotam determinadas entidades e suas sentenças relacionam-se com fatos. Restringindo-nos ao aspecto sintático de L, não se pode tratar noções como as seguintes: os conceitos de verdade, de denotação, de sentido e outros similares. Em resumo [...] devemos levar também em conta a dimensão semântica da linguagem. Na semântica, pesquisamos as inter-relações existentes entre as linguagens e os objetos e as situações às quais elas se referem”, (Newton da Costa: 39).

Significado, sentido, experiência e verdade são objetos da razão paraconsistente das ciências reais:

“na semiótica aplicada consideramos linguagens ordinárias, para cuja elaboração e desenvolvimento a experiência é absolutamente imprescindível: elas só podem ser estudadas não se olvidando do nível empírico. Linguagens dessa categoria são as línguas comuns, como o português e o francês, a as teorias e as disciplinas reais. Neste caso, é patente, a experiência constitui fator fundamental, que não pode ser posto de lado, como ocorre com as linguagens ideais da semiótica pura”. (Newton da Costa: 40).

A razão da semiótica paraconsistente aboliu a razão clássica grega:

“A razão, portanto, em sua atividade serve-se de uma coleção enumerável de categorias lógicas, que se encontram pela análise sintática de linguagens como T. Quanto às categorias menos gerais do que as lógicas, como as de causa, de espaço e tempo, a elas se chega pelo estudo do sistema simbólico e conceitual das ciências particulares. De qualquer modo, as categorias destas ciências constituem particularizações lógicas”. (Newton da Costa: 55).

No campo político da cultura parasintática plástica, o significado é doado ao agir molecular do agente pelo laço social entre o próprio agente e a sua experiencia na prática política.

O sentido sintático (Newton da Costa: 52) encontra-se no horizonte do campo político gramatical plástico através dos evangelhos que asseguram a quase verdade como fantasia verbal-visual, isto é, como estrutura de ficção na constituição das regiões ecumênicas do campo político da cultura plástica parasintático.

                                                                      9

No campo da criança, há objeto virtual e objeto real. (Deleuze: 169-170). O virtual tem como oposição o atual:

“A realidade do virtual consiste nos elementos e relações diferenciais e nos pontos singulares que lhes correspondem. A estrutura é a realidade do virtual. Aos elementos e às relações que formam uma estrutura devemos evitar, ao mesmo tempo, atribuir uma atualidade, que eles não têm e retirar a realidade que eles têm”. (Deleuze: 336).

Na ciência política materialista literária, o fenômeno histórico <classe dirigente virtual> define virtual em relação à territorial no século XXI. No campo político da cultura mundial, há a burguesia política virtual. E há a burguesia política territorial no campo político dos países. A burguesia territorial encontra-se sob a direção do aparelho de hegemonikon  da classe dirigente/dominante virtual.

A razão paraconsistente é as relações técnicas de produção cibernética da burguesia mundial virtual. Um Estado burguês pós-modernista existe no mercantilismo do capital corporativo da multinacional, sendo a vanguarda desse Estado as corporações -feudais multinacional da comunicação de massa. O campo político da cibercultura funciona por soluções de aporias e paradoxos:

“Solucionar [resolver, superar,...] dado paradoxo consiste em se provar que ele se reduz a falácia ou em se evidenciar que sua conclusão não é, de fato, inaceitável. Quando se consegue mostrar que o paradoxo P não passa de paralogismo, diz-se que a solução de P é negativa; quando se patenteia ser a conclusão de P realmente aceitável dizemos que a solução é positiva”. (Newton da Costa: 222).

Há mudança no campo político da cibercultura:

“Não se pode eliminar o paradoxo do sistema do Grundgestze der Arithmetik a não ser modificando-o, isto é, transformando-o em outro sistema: o original era e sempre será trivial”.  (Newton a Costa: 222).

A estrutura de dominação do capital capitalista da globalização destruiu o Estado nacional. No lugar do Estado-nação, ergueu-se um Estado burguês feudal, virtual, cibernético, fascista que conduz o destino do Estado burguês territorial e sua burguesia territorial:

“O Traço marcante das aporias, pragmaticamente falando, consiste na perplexidade que nos provocam em relação aos princípios aceitos : não se sabe, com exatidão, quais devem ser derrogados e quais os merecedores de conservação. Com o advento da lógica paraconsistente, os paradoxos aparecem sob uma luz nova e corroboram nossa tese segundo a qual a evolução da lógica se processa dialeticamente. Com efeito, aporias tidas e havidas como superadas ressurgem com toda sua força: de um lado, há o problema de não se dispor de critérios indiscutíveis para se preferir a solução clássica à paraconsistente; de outro, nas próprias lógicas paraconsistentes renascem algumas aporias”. (Newton da Costa: 228-229).

Da razão paraconsistente à razão parasintática, um campo político dialético-materialista da cultura mundial abrange Ocidente, Oriente e Américas com aporias, por exemplo, que terão com motor da história massas de classes sociais e um Estado feudal modernista do dominado em um processo de abolição do Estado burguês: aparelho repressivo e Estado e aparelhos ideológicos de Estado.          

 

 

BANDEIRA DA SILVEIRA, José Paulo. Brasil Profundo. EUA: amazon, 2021

BAUDRILLARD, Jean. Simulacres et simulation. Paris: Galilée, 1981

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SP: Edipro, 2022

DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. RJ; Graal, 1988

DELEUZE E GUATTARI, Gilles e Félix. Mille Plateaux. Paris: Minuit, 1980

GARCIA, M. Othon. Comunicação em prosa moderna. RJ: FGV, 1988

GIDDENS, Anthony. O Estado-Nação e a violência. SP: EDUSP., 2001

FAORO, Raymundo. Os donos do poder. Volume 1. SP: USP, 1975\

HEIDEGGER, Martin. Nietzsche. Metafísica e niilismo. RJU: Relume Dumará, 2000

HEIDEGGER, Martin. Fenomenologia da vida religiosa. Petrópolis: Vozes, 2010

LACAN, Jacques. Le Seminaire. Livre 20, Encore. Paris: Seuil, 1975                         

LACAN, Jacques. O Seminário. livro 16. De um Outro ao outro. RJ: Zahar, 2008

LÉVY, Pierre. Cibercultura. SWP: Editora 34, 1999

NEWTON DA COSTA. Ensaios sobre os fundamentos da lógica. SP: Hucitec, 2008

SAMARANCH, Francisco. Cuatro ensayos sobre Aristóteles. Política e ética, metafísica. México: Fondo de Cultura Económica, 1991   

ZIZEK, Slavoj. Mao. Sobre a contradição e a prática. RJ: Zahar, 2008  

WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações filosóficas. Pensadores. SP: Abril Cultural, 1975   

  

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário