segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Da crise brasileira

 Capítulo 6 - da crise brasileira 

José Paulo

O poder moderador de d. Pedro I é o poder realista fantástico do policial-monárquico-imperial da Constituição republicana de 1946. Assim, o acesso ao aparelho de Estado e o exercício do poder militar estavam sujeitos às interpretações do <poder moderador>, isto é, do poder d’ars realista fantástico militar na tela da mente estética da prática política da democracia de 1946. Como consequência, toda transição de governo trazia em seu bojo o germe da crise política, pois essa situação virtual era um enorme estímulo para que os artistas republicanos e os policiais imperiais da prática política para que eles em luta política pelo poder republicano transbordaram os limites constitucionais, limites válidos e fizessem a passagem ao ato na política fática do golpe de Estado. Portanto, é patente que qualquer ameaça de modificação do equilíbrio de forças políticas e ideológicas se tornassem crise das relações no bloco no poder, com concomitante repercussão no aparelho de Estado. Esse ciclo se evidencia com a destruição do governo Vargas, com a eleição e posse de Juscelino Kubitschek em 1955 e com a sucessão de JQ para Jango. Isso era o elo mais fraco da democracia republicana representativa de 1946. 

As relações entre poder republicano, poder d’ars rerealista e o poder d’ars realista fantástico e o bloco no poder (Poulantzas: 235) iluminam ou tornam escuro a tela da mente estética republicana no Brasil. A prática política do bloco no poder não é lógica política fora da língua fenilato das afecções; estas introduzem a contradição entre causa e efeito estético no reino da liberdade da prática política pura. Hegel faz a distinção entre os dois poderes d’ars:

“A estas comparações na maior parte líricas, provocadas por um sentimento que está mergulhado no seu conteúdo, poderão opor-se as comparações <épicas>, tais as que se nos deparam muitas vezes nas obras de Homero. O poeta épico, quando se demora em certas comparações, pretende, com isso desviar a curiosidade, a expectativa, a esperança e a ansiedade, por assim dizer práticas, que nos provocam o decorrer de acontecimentos ou certos actos e situações do herói, desviar a nossa atenção das causas, dos efeitos,                                           e das consequências para a concentrar nas                                                                 produções serenas e plásticas que oferece à nova intuição como obras esculturais.   Tal ansiedade, tal alheamento de todo o interesse puramente prático que caracterizava tudo o que o poeta faz passar diante dos olhos, produzirá uma impressão que será mais profunda quanto mais afastado, mais estranho ao domínio onde ele procura as comparações de que envolve o seu principal <objecto>. No entanto, o emprego de comparações mais ou menos numerosas e variadas                                                                tem também como fim dar ao objecto representado, devido precisamente à multiplicação das suas representações, maior relevo e estabilidade em vez de deixar arrastar na corrente do canto e no fluir dos acontecimentos”. (Hegel. 1993: 234-235). 

E a relação do poder d’ars com a prática política da vontade pura? 

Kant:

“O motivo disso se encontra, com efeito, uma vez mais no que temos de tratar agora com a vontade, devendo considerar a razão, não em sua relação com os objetos, mas com essa vontade e com sua causalidade, pois as proposições fundamentais dessa causalidade empiricamente incondicionadas constituem o ponto de partida, a partir do qual só se pode ensaiar a fixação de nossos conceitos relativos ao fundamento da determinação de semelhante vontade, de sua aplicação aos objetos e por fim ao sujeito e à sua sensibilidade. A lei da causalidade por liberdade, isto é, uma proposição fundamental prática pura, constitui aqui inevitavelmente o ponto de partida e determina os objetos aos quais pode exclusivamente se referir”. (Kant. 2006: 28)  

Como liberdade da causalidade, a vontade política é o grau zero lógico das afecções? O poder d’ars escolhe os objetos da prática política como artista republicano e policial-imperial, a forma de governo de um modo puramente lógico? Ou a prática política é a realidade da língua-fenilato da tela da mente estética conjuntural? 

Aristóteles:

“On appelle <affection>, en un premier sens, la qualité suivant laquelle un être peut être altéré; par exemple, le blanc et le noir, le doux et l’amer, la pensateur et la légèreté, et autres déterminations de ce genre. - En un autre sens, c’est l’acte de ces qualités et dès les alterations elle-mêmes - On entendent aussi par là, particulièrement, les altérations et les mouvement nuisibles, et surtout les dommages fâcheux - Enfin, on appelle affections de grandes et cruelles infortunes”. (Aristote. 1991, v. 1: 305-306). 

A prática política tem superfície: de luz, de escuridão e e sombras, superfície das aparências de semblância e do reprofundo. As afecções dominam o reprofundo como no caso do governo Bolsonaro do regime de 1988. A filosofia idealista defende a utopia de uma prática política pura sem afecções, sem o inferno abissal da mudança cíclica da forma de governo.         

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A Constituição de 1946 fez do aparelho militar o proprietário virtual da gramática e das ideologias dos outros aparelhos de Estado, burocracia e prática política do bloco no poder. Ela fez das Forças Armadas um poder virtual contrarrevolucionário extrerrepublicano. Na Constituição de !988, esse poder extrarrepublicano existe no artigo 142 e em inúmeros artigos há o poder republicano social-territorial. Assim, temos uma Constituição paraconsistente. A mundialização da “era dos direitos” se acelerou depois da Segunda Guerra Mundial:

“O problema, bem entendido, não nasceu hoje. Pelo menos desde o início da era moderna, através da difusão das doutrinas jusnaturalistas, primeiro, e das Declarações dos Direitos do Homem, incluídas na Constituição dos Estados liberais, o desenvolvimento, a afirmação, numa parte cada vez mais ampla do mundo, do Estado de direito. Mas é também verdade que somente depois da Segunda Guerra Mundial é que esse problema passou da esfera nacional para a internacional, envolvendo - pela primeira vez na história - todos os povos”. (Bobbio. 1992: 49).       

A forma de governo republicana revolucionária 1988 é aquela de um cesarismo democrático em analogia com o regime bonapartista de Napoleão III? André Jardin deu um passo adiante na gramática do bonapartismo. Ele parte de Tocqueville e faz ela aparecer como um <império republicano>, como uma forma de governo barroco (Tocqueville. 1979: 73-89)

“L’affirmation de l’article 1 de la Constitution qu’elle <reconnaît, confirme et garantit les grands principes de 1789>, dans la mesure où elle n’est pas simple trompe-l’oeil,, n’est pas cependant adhésion à l’esprit de la Déclaration des droits, mais souci de se démarquer des <blancs> suspects de tendresse pour l’Ancien Régime. L’unité de la nation s’exprime par le suffrage universel, plus particulièrement sous la forme des plébiscites. Mais ceux-ci ne peuvent être provo qués que par le pouvoir et Napoléon s’est montré très sobre de cette initiative, voulant bien être baptisé, mais ne voulant pas <vivre les pieds l’eau: entre les deux plébiscites de 1851 et 1852 et celui de 1870, il se contentera d’une consentement de la nation”. (Jardin: 367-368). 

A constituição de 1988 é barroca por ser uma conciliação com o Antiigo regime militar. Desse emerge a contrarrevolução extrarrepublicana como um dos aspectos da dialética virtual constitucional que tem como outro aspecto os poderes republicanos que gera direitos republicanos virtuais. O direito ao território geográfico e ao território existencial dos quimilatos está como um subtexto da Constituição de 1988. 

O  regime de 1946 pôs as Forças Armadas como uma força política no bloco no poder. Assim, o regime representativo compartilhou uma crise brasileira como um fenômeno consubstancial ao bloco no poder e ao Estado republicano territorial nacional virtual. Temos, então, a <militarização> preventiva das relações internas ao bloco no poder.   

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Uma dimensão da crise brasileira de 1946 tem como referente a forma de governo fática da lingua fenilato. (Bandeira da Silveira; março/2025). Em geral, se analisa a forma de governo do homem gramatical (Aristóteles. 1973: 14), retórico, ideológico. A forma de governo quimilato é a forma de governo da vida em sociedade, em comunidade nacional territorial.  Dessa forma revolucin´ria republicana emerge os direitos ao quimilato como liberdade de expressão científica e artistica. O Estado republicano territorial/virtual revolucionário tem como ideal a garantia dos direitos republicanos. O idealismo é a gramática e ideologias do ideal na tela da mente estética de 1946. No regime de 1988, a contrarrevolução extrarrepublicana cancelou ou foracluiu o ideal constitucional republicana. Assim, surge um congresso sem a gramática idealista virtual, um congresso fora da República Federativa do Brasil. Esse congresso não é um poder republicano e com seu governo fenilato de emendas [propriedade de governo executivo] faz com que o governo nacional deixe de ser faticamente e validamente um poder republicano. Minha analise parte da interpretação de Oliveira Vianna (Oliveira Vianna. 1939; Bastos (org). 1993) que fala das Constituições brasileiras como idealismo da Constituição, pois, copiadas das Constituições europeia e americana. A constituição de 1946 se alinha com o idealismo viannista. A Constituição de 1988 já se alinha com a língua fenilato, e assim o idealismo republicano como forma de governo da vida republicana; esta aparece como um ideal-virtual a ser atualizado permanentemente através da aplicação dos direitos individuais republicanos.        

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