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Como um modo racional –
consciente – de superar o capitalismo através da intervenção do Estado na
economia, a ideia e a prática do socialismo fracassou na URSS, na China,
relativamente e na Venezuela, de um modo absoluto. A ideologia comunista é uma
retórica chinesa cada vez mais oca de significados e o bolivarianismo não pode
ser considerado um fenômeno ideológico. Como o neonazismo e o populismo europeu
do século XXI, ele é de fato um fenômeno do inconsciente político. No mínimo, a
leitura da política é uma abordagem da política que se faz na interseção do
pensamento de Marx como o pensamento de Freud.
Leitura da política brasileira (1985-1992) é um livro sobre a
origem da República Democrática pós-ditadura militar. Ele trabalha com
fenômenos ideológicos, mas também com fenômenos do inconsciente político. As
classes sociais, as multidões, os partidos, os governos e outras instituições
aparecem movidos pela ideologia e pelo inconsciente político. Já não se trata
de pensar a política simplesmente pelo conceito de hegemonia gramsciniano – a
política como articulação da cultura pelo Estado –, mas de pensá-la como algo determinado
pela lógica do inconsciente político.
Usando este modelo analítico, o
livro desconstrói “mitos” da ideologia política dominante como os signos, as
imagens e as representações que cristalizaram o PMDB como o partido à frente da
democratização, o governo Sarney como um governo democrático, Ulisses Guimarães
como o campeão da democratização. Se o governo Sarney foi a continuação da
ditadura militar sob a forma de um regime civil autoritário, não é mais
necessário seguir veiculando para as novas gerações que os governos dos
generais-presidentes Geisel e Figueiredo patrocinaram a “abertura democrática”.
As velhas e novas gerações de jornalistas, cientistas políticos e historiadores
precisam parar de funcionar pela ideologia dominante e começar a abrir a porta
para a discussão pública da República Democrática, aproveitando o entusiasmo
das jornadas de junho de 2013. A propósito, já passou a hora de designar
Fernando Collor pelo que ele realmente foi: o primeiro ensaio do tirano
pós-moderno na República Democrática.
Leitura da política(...) também discorre sobre as relações entre
economia e política, tentando mostrar que o Brasil perdeu o bonde da história
nas décadas de 1980 e 1990 em relação à
evolução do capitalismo mundial. Neste sentido, ele procura ver os laços
da política brasileira com a política mundial. Usando a categoria capitalismo corporativo mundial (CCM), o
livro projeta a discussão sobre a real situação do Brasil na cena econômica
mundial na segunda década do século XXI. O método “leitura da política” permite
pensar o futuro a partir da conjuntura política estudada. Enquanto o mundo
caminha para a reordenação do capitalismo mundial com o fim da hegemonia do
capital financeiro no CCM, o Brasil caminha para a substituição da hegemonia do
capitalismo moderno pela hegemonia do capitalismo de commodities, capitaneada pela nova oligarquia rural capitalista.
Este quadro conjuntural parece diabolicamente fazer laços entre a economia, a
sociedade e a política. No campo político, a personagem que poderia remar
contra o corrente da hegemonia da oligarquia rural capitalista, apresenta
sinais de debilidade política e ideológica sendo incapaz de assumir uma posição
que a ligasse às jornadas de junho de 2013. Marina Silva parece não ter energia
para continuar junho no espaço político como parte da primeira revolução
política brasileira autêntica. Assim, a eleição presidencial de 2014 parece
querer confirmar na política a hegemonia no bloco no poder do capitalismo de commodities.
As multidões das jornadas de
junho, que continuam em um outro patamar histórico as multidões que derrubaram
Collor em 1992, apontaram o caminho para a transformação da política e do
Estado em um sentido contrário ao Estado oligárquico capitalista do capitalismo
de commodities. No entanto, não há
forças políticas, econômicas e culturais capazes de transformar o movimento das
multidões de junho em uma revolução política.
Leitura da política é um projeto teórico-empírico que pretende
retomar a investigação sobre o Brasil pensando-o como parte da política da
América Latina e do mundo. Mas como todo projeto, ela precisa, para se
inscrever na estrutura simbólica, da resposta do leitor.